Axiologia

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How did we get here?
Well, I used to know you so well

(Decode- Paramore¹)

Quando o despertador tocou, Gina não fez questão de desligá-lo com magia, como sempre fazia. Tão somente estapeou o objeto que rolou da cômoda para o chão, espatifando-se e fazendo voar ponteiros, parafusos, sinetes, engrenagens e cacos de vidro. Ela não estava nem um pouco inclinada a recolher a sujeira.

O som do despertador cessou, mas como se o mundo conspirasse para tirá-la de seu sono, a campainha começou a tocar. Com o esforço de uma vida, Gina levantou-se da cama de casal— vazia pela terceira noite seguida— e não se importou com o fato de que estava vestindo uma pequena camisola de cetim rosa quando desceu as escadas para atender a porta.

O quarto de casal ficava no andar de cima. Uma decoração antiquada dava ao ambiente a sensação de aconchego, segundo Molly Weasley. Ela dissera, na ocasião em que visitara a casa dos Potter, que móveis antigos remetiam ao conforto. E a cama poderia dar essa impressão assim que a porta do quarto fosse aberta. Entalhes de flores na madeira e formas multifacetadas nos contornos da cabeceira traziam os anos 70 e 80 de volta. O papel de parede florido sob o fundo amarelo, o guarda-roupa de ébano e o criado- mudo um pouco bambo eram a pincelada final no grande museu que a casa dos Potter parecia ser.

A escada seguia o padrão de qualquer casa antiga e rangia à medida que Gina encostava a ponta dos pés em cada degrau. Era a única parte que não remetia ao conforto das antiguidades, mas à insegurança e ao risco de uma queda fatal.

— Já estou indo! — Gina gritou, sonolenta, quando a campainha tocou mais uma vez.

No momento em que atendeu a porta, a mulher só não ficou mais espantada com a presença inesperada e inconveniente, porque se lembrou das roupas que vestia e escondeu-se atrás da porta.

— Weasley. — O homem de sorriso sedutor e olhos cor de café cumprimentou, numa voz rouca e debochada. — Ou melhor, Senhora Potter.

Gina permaneceu estática, encarando com uma expressão que ia do espanto à completa indignação, o belo rosto de Blaise Zabini.

***

Zabini segurava a xícara de chá com a delicadeza de um lorde. O conjunto de porcelana com margaridas pintadas em cada Pires, parecia chamar a atenção do homem de feição arrogante e olhar altivo que nada falara desde a hora que chegara.

Gina já estava com a ponta dos dedos gastas de tanto tamborilar na mesa. O silêncio incômodo martelava e irritava seus nervos, e o barulho na mesa quebrava a inquietação que ela estava sentindo.

— Uma bela xícara, Gina. Antiquada, mas muito elegante.  Porcelana polonesa? Meu avô materno trabalhou com essas peças antes de vir para a Inglaterra… Nostálgicas. — Blaise falou, enfim, não desgrudando os olhos dos desenhos na peça.

— O que o traz aqui, na minha casa, neste horário, Zabini? Com certeza não veio relembrar os tempos de Hogwarts. — Gina perguntou, irritada com a falta de objetividade de Blaise.

Ele riu, um pouco alto demais para a casa silenciosa. Não uma risada espalhafatosa, mas uma de quem havia realmente compreendido que não era bem vindo naquele lugar, mas continuaria ali porque tinha motivos legítimos para tanto.

ConstelaçãoWhere stories live. Discover now