Pecados e rupturas - Pt. I

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So crawl on my belly 'til the sun goes down

I'll never wear your broken crown

I took the road and I fucked it all the way

Now in this twilight, how dare you speak of grace.

(Broken Crown – Mumford & Sons)¹




Prudência não era a palavra em voga naquela semana. Ela queimara dois dedos na chaleira e deixara cair shampoo nos olhos, lamentando-se amargamente por ter resolvido verificar a temperatura do chuveiro enquanto os cabelos ainda estavam ensaboados e a água corria livremente sobre eles.

Finalmente de volta a Hawkshead, Hermione estudava a possibilidade de alterar os detalhes em madeira que decoravam o seu banheiro, frivolamente analisando a possibilidade de trocar pelo mármore, afinal, se continuasse morando ali teria a beleza da pedra fria e elegante, e caso desejasse sair dali a venderia por um preço superior ao que comprara.

Enquanto enrolava-se na toalha sentiu o calafrio típico do pós-banho e correu para o quarto. Embora estivesse de folga, caberia a ela o trabalho de ao menos tentar ir até a Ilha de Abraxas, mas a verdade é que estivera evitando pensar em qualquer coisa que fosse minimamente relacionada aos Malfoy.

A janela estava entreaberta, a despeito da recente queda de temperatura. Hermione tinha prazer em ligar o sistema de calefação trouxa e ao mesmo tempo permitir que o vento adentrasse pelas frestas da persiana, que em conjunto aos parapeitos ilustravam uma bela imagem da Era Vitoriana. "Manter o equilíbrio!". Era o que ela sempre respondia quando questionada a respeito de suas razões.

Longe do equilíbrio que a corrente de ar gelado representava, ela girou a varinha duas vezes contra o pergaminho onde lia-se o nome da pessoa misteriosa. "Janice", mas nada aconteceu; tão somente a lembrança quase tangível de Malfoy questionando se havia alguma notícia dela. Sem se dar conta das próprias ações, tocou os lábios de forma solene, deslizando o dedo médio e o indicador onde ele deixara um rastro de seu veneno.

Nada poderia ser mais incômodo do que a falsa sensação de que os acontecimentos da semana anterior haviam sido dissipados, afinal, a grande e assustadora verdade era que eles retornavam frequentemente, com a mesma força das ondas do mar do norte, rebentando-se contra as rochas que protegiam toda a região adjacente à Ilha onde a prisão de Azkaban estava localizada.

No conceito mais abrangente possível, a infidelidade sempre representava a quebra de um compromisso assumido livremente, não sendo, necessariamente, sinônimo de adultério. Já na concepção popular do termo, a infidelidade estaria intimamente relacionada à ruptura de um acordo silencioso consistente em manter relações sexuais com apenas uma pessoa. Diante da gama de definições, Hermione sentia-se infiel em todos os sentidos possíveis, fosse pela transgressão do compromisso firmado com sua particular concepção de bem e mal, ou pela violação do acordo tácito que fizera consigo mesma, de nunca confiar em alguém que ostentasse o brasão da Sonserina.

E havia, é claro, a memória de Rony. Por seis anos não se permitira ser tocada por outras mãos, sequer dera vazão às perguntas espremidas no canto de seu cérebro sobre como seria caso outro homem tivesse acesso ao seu corpo da mesma forma que seu falecido namorado um dia tivera.

Ele estava morto, portanto, não deveria pensar em quem ou como tocava o seu corpo. A voz fina e diabólica, que vinha das profundezas de seu ser sussurrou em sua cabeça demasiadamente atribulada. Pensamentos como aqueles eram recorrentes, e ela culpava-se por isso. Um ciclo sem fim, e por isso, muito mais doloroso.

ConstelaçãoWhere stories live. Discover now