Um jogo depois da tempestade

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A recepção do St.Mungus estava sempre agitada. Em parte Hermione preferia o Banco de Sangue, que estava sempre silencioso. Sentia-se mal por isso, afinal de contas, receber transfusão de sangue no mundo bruxo era um péssimo sinal, quase a assinatura de um atestado de óbito. Então, tecnicamente, sua tranquilidade era garantida à custa do sofrimento dos outros.

Duas crianças puxavam a saia de uma mulher que, Hermione deduziu, devia ser mãe delas. A menina estava chorando, e o garoto pedia à mãe para que fizesse a irmã parar de chorar.

Crianças. Hermione não tinha planos de ter filhos, não mais. Sua justificativa​ repousava no fato de que jamais encontraria um pai tão exemplar quanto Rony seria se um dia tivesse a oportunidade de ter um filho.

Travis, o garoto perturbado que estava preso em Azkaban, não tinha idade para ser seu filho, salvo se ela engravidasse com dez anos, o que era um absurdo. Contudo, ela sentiu algo que chegava muito próximo da preocupação materna quando vira o rosto infeliz e machucado do garoto que perdera sua vida dentro de uma prisão.

Distraída com a cena na recepção e a lembrança de Travis, Hermione não notou quando uma criança sentou do seu lado. Não era grande o suficiente para apoiar as costas no encosto da cadeira acolchoada da recepção, então ficava, ajeitando a postura várias vezes, o que Hermione pôde notar com sua visão periférica. O garoto, que não tinha mais do que seis anos, olhava curioso para ela e para as demais crianças no hall. Ela sentiu-se insegura, não sabia como reagir aos olhares do pequeno e curioso menino que havia desistido da correria pelo hospital para fitá-la com curiosidade. Ele era ruivo, poderia ser seu filho se ela tivesse engravidado logo no final da guerra.

Uma mulher, deficiente visual, cabelos negros e pele branca, puxou o garoto pelo braço e com um gesto desculpou-se pelo “filho inconveniente”. Hermione não sabia como, mas a mulher não parecia vê-la e ainda assim sabia exatamente o que o filho estava fazendo.

— Querido! Pare de importunar a moça.— ela repreendeu, vendo que o gesto de afastá-lo não havia adiantado e puxou, novamente, o menino pelo braço com carinho. Havia um sorriso triste nos lábios dela.

—Mas, mama, ela é medibruxa.— o garotinho insistiu, olhando para  varinha  e osso  entrelaçados, símbolo do St.Mungus.

— Desculpe, senhorita.— A mulher falou, sem graça, seus olhos eram vagos e fitavam um ponto aleatório— Ele adora medibruxos e curandeiros, acho que está passando tempo demais no hospital.

— Hermione! — Neville surgiu na recepção, carregando uma pasta grande e roxa. Chamou Hermione um pouco alto demais, e ficou envergonhado quando todos os olhares se voltaram para ele. — Os papéis estão prontos. Preciso de sua assinatura e da assinatura de Malfoy.

— Obrigada, Neville.— Hermione agradeceu, quase beijando os pés do colega por tê-la tirado de uma situação constrangedora. Acenou para a mulher, recriminando a si mesma pela gafe, e saiu apressada em direção à escadaria que levava ao escritório do diretor do Hospital.

***

Os papéis ainda estavam sendo redigidos por uma pena encantada. Quando a última palavra foi escrita, um sinete com as iniciais do homem que nunca estava naquela sala, seu antigo chefe, carimbou o pergaminho, e Neville os pegou, entregando para Hermione.

ConstelaçãoWhere stories live. Discover now