XVII - Opções - Anima

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A cabeça de Anima doía. Toda vez que olhava para o pequeno dragão sentia um aperto na boca do estômago. Ver a imimoya fora impressionante, mas era mais fácil de entender que as histórias de Groleo eram verdade do que serem parte delas... Do que ele ser literalmente uma parte muito importante delas...

A imagem do ovo vermelho voltou em sua mente. Se o verde era companheiro de Sirius, então... Não, não pode ser... Ou pode?

O problema era que todas aquelas dúvidas explicavam muitas coisas, como as línguas, os treinamentos, as histórias... Mas por quê?! E para onde ele foi?! Estamos na floresta como você mandou. E agora?!

— Queremos vocês aqui para aumentar nossa resistência frente aos nakoushiniders. — A que Anima tinha quase certeza de se chamar Semepolhian voltou a falar. — Já ouviram sobre eles?

— Sim. — A voz do garoto de cabelo raspado a assustou, já que quase se esquecera que ele estava presente.

Anima confirmou a resposta com a cabeça e ressaltou:

— Mas só que eram um grupo de pessoas que prendiam outras sem motivos e que deveríamos fugir caso encontrássemos algum.

— Bom... É quase isso. Só que esse grupo conta com milhares de soldados e fazem frequentemente campanhas contra a existência de seres mágicos, ou seja, nós, guardiões...

Nós, guardiões ficou ressoando na cabeça de Anima por um certo tempo.

— ... Imimoyas, magos, nimases, egüeses...

— Mas por quê? — Ela a interrompeu.

— Por que você persegue e mata pessoas? Não há explicação. Só que nós temos que pará-los ou fugir para sempre.

Por que tudo isso está acontecendo?!

— Como assim fugir?

— Os não envolvidos na Guerra das Sete Noites, os imimoyas e zubuius, já não tinham muito contato com os humanos, agora eles nem são lembrados por eles... Foi depois da guerra que os nakoushiniders se fortaleceram, então os magos, egüeses e nimases fizeram esconderijos quase intransponíveis aqui na floresta, nas montanhas e no mar...

— E por que não podem fazer isso aqui?

— Primeiro porque os outros não precisam de alimentação como a nossa e segundo: querem mesmo viver presos em alguns metros quadrados para sempre?

Vivíamos assim, pensou Anima, e agora eu só queria estar lá sem essa história de guerra...

— Além disso, — prosseguiu ela — nós iríamos escapar só até eles nos encontrarem... Mas mesmo assim, para nos escondermos, os novos guardiões nunca nos encontrariam... Os outros seres mágicos nascem de pelo menos um dos pais não humano. Nós nascemos de humanos, imimoyas, — apontou para si mesma, — magos, egüeses... Qualquer um que possua algum antepassado guardião... Eles estariam sozinhos.

— E o que quer que nós façamos?! — Anima já não conseguia se manter em tom polido há um bom tempo. — Que a gente mate pessoas aleatórias para não deixar que outras pessoas aleatórias morram?! Obrigada, mas não.

Sem mudar a voz, a outra rebateu:

— E então o que estão fazendo aqui?

— Eu não sei! — Ela gritou chamando atenção das outras duas pessoas presentes no local além do pequeno grupo. — Essa é a conversa mais longa que já tive com alguém fora eles. — Apontou para Sirius e a ilustração de Groleo. — Eu não sei o que está acontecendo na minha vida sem nenhuma novidade até essa manhã. Não sei porque estamos aqui e a diferença que temos para que vocês nos queiram aqui!

Semepolhian não respondeu.

Olhou para Sirius com a expressão perdida na face. Olhou para o dragão em seu ombro.

Duvido muito, mas talvez fosse isso mesmo que Groleo queria...

Confiava naquele homem sem pensar duas vezes, porém ele sumira sem explicações de verdade naquela manhã. E se na realidade fora um mal entendido, uma grande coincidência? E se na verdade Groleo os esperava na Cabana preocupado que tinham sumido e pronto para lhes contar tudo e que tinha um irmão gêmeo e que roubara seu nome e...

Suspirou. Sua teoria para fazer com que tudo voltasse ao normal era quase mais esquisita que a realidade.

— Podemos conversar a sós? — Perguntou para Sirius que imediatamente concordou.

Os dois saíram da biblioteca e se afastaram da porta indo até a amurada do lado sul. Anima cruzou os braços e se apoiou na parede de pedra gelada. Observou o garoto soltar o cabelo para prender melhor o pequeno rabo com a parte de cima dos fios.

— O que acha de tudo isso? — Ela perguntou voltando a olhar para o horizonte.

— Que não sei se é mais estranho tudo isso ou ser você que está falando e eu quieto. — Respondeu sorrindo.

A garota soltou uma risada nasalada e esperou pela resposta séria.

— Quais opções temos? — Ele questionou a de olhos castanhos e a si mesmo. — Voltar? Sem um atalho nas sombras vai levar vários dias. Procurar por Groleo? Ele pode estar em literalmente qualquer lugar ao que parece...

— Está dizendo para que fiquemos então?

Os dois se encararam. Em seu olhar ela conseguia ver que o outro também não queria isso, mas se era o caso...

— E se tentarmos de novo? — Ela sugeriu como última esperança. — Groleo nos disse para entrarmos na floresta e dizer... Aquela frase. Nós não dissemos! E se era para ser outra coisa?

Sirius uniu as sobrancelhas e olhou o horizonte. Naquele momento, o dragão quase dormia deitado como um cachecol de um ombro ao outro pelas costas.

— Você tem certeza? — O garoto perguntou sem mirar seus olhos.

Anima demorou para responder, mas por fim declarou:

— Nós lutamos para caçar e nos defender... Não começar ou terminar guerras... Eu não quero ter que matar ninguém...

Os olhos verdes encontraram os dela. Estava passando do meio dia, ainda tinham bastante tempo, iriam chegar na margem em alguns dias e começar tudo de novo.

O barulho do dragão escorregando pelo casaco de Sirius ao perder a consciência efetivamente dormindo os tirou da conversa. O garoto o pegou segurando com cuidado. Era do tamanho próximo ao de uma criança pequena. Quando ela voltou a olhar para o rosto do seu velho amigo, um sorriso tímido e ladino se disfarçava em sua face.

Podiam voltar para Cabana; podiam voltar para a margem da floresta e dizer a frase certa; podiam ficar ali. Mas de qualquer jeito, iriam começar de novo. Nunca voltaria a ser o que era antes...

Os GuardiõesOnde as histórias ganham vida. Descobre agora