LVII - Outras Visões - Semepolhian

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— Não imaginava que a situação poderia piorar... — Comentou um dos membros da reunião, Macep.

Eles sumiram por vinte contagens, pensou Semepolhian, como não ia piorar?

— Só para ver se eu entendi, — disse Parvani, — eles estão muito fortes, envenenando animais com algo que tira o poder dos seres mágicos e eventualmente prendendo alguns de nós, mas boa parte do resto da população humana vocês acham que não se importam?

— Pelo que entendemos, sim. — Respondeu Emmethorion.

— Mas quando fechamos a ilha, só estávamos tentando evitar uma nova guerra tão cedo... — Parvani e os outros pareciam quase não quererem aceitar a realidade. — Como não vimos isso?

— Talvez ficando fechados em uma ilha... — Semepolhian nunca diria isso antes, mas depois de sua convivência com Anima aprendera mais do que alguns golpes de espada.

— Nós estávamos fracos e boa parte daqui foi destruída... — Reforçou Macep.

— Por vinte contagens?

A indignação da imimoya era mais forte do que seu objetivo de ser diplomata. Estavam há muito tempo já naquela reunião e a cada informação que davam, aqueles que eram do Continente dos Dragões ficavam em choque e perguntando diversas vezes para confirmar o que havia sido dito, como se não fosse possível o que acabaram de explicar. Além disso, alguns deles pareciam crer que o problema era o fato de estarem cansados de viverem numa ilha por tanto tempo e não a falta de suporte que deram aos guardiões mais novos e desamparados, os quais deveriam descobrir como utilizar seus poderes e fugir de nakoushiniders ao mesmo tempo.

Enquanto Semepolhian e Emmethorion tentavam expôr a situação do Grande Continente, Cor Bor, dos imimoyas yenkwen, Krana, dos nimases e Redani, dos egüeses permaneciam quase completamente em silêncio. A hipótese mais provável da guardiã era que as três estavam no meio do caminho entre os dois lados da reunião: tinham tido dificuldades no Grande Continente com os nakoushiniders, mas também haviam escolhido se esconder completamente ao invés de resistir ou acolher aqueles que precisavam.

A única coisa que aparentemente todos estavam de acordo era que a tensão no local aumentava a cada troca de falas. Com dificuldade, Parvani declarou:

— Fico feliz de todos estarem aqui. — E então mudou completamente o assunto. — Sugiro fazermos uma confraternização essa noite... Irá... Acalmar os ânimos dos que precisam... — Lançou um breve olhar de julgamento para Semepolhian. — E permitirá que nossos povos tenham uma maior interação...

— Mas precisamos de abrigos, comida, armamentos... — Interveio Emmethorion. — Não sei se é o melhor momento para uma festa.

— Não é uma festa, é uma confraternização... — Corrigiu Parvani sem que nenhum dos dois visse a diferença.

Quase preferia que a ilha estivesse vazia...

— Nós já temos uma estratégia de defesa se quer saber. — O olhar de Parvani dizia: "Ou vocês acham que ficamos aqui sem fazer nada?" — Há uma rotação de vigia ao redor da ilha de olho em qualquer coisa que se aproximar. Nós estamos esperando por eles, temos até uma isca... Vão ser derrotados antes de conseguirem sair dos navios...

— Os yamanzi estão conosco também. — Disse Redani. — Afirmaram que não deixarão embarcações nakoushiniders chegarem perto.

— Isso ajuda ainda mais... Mas mesmo que cheguem perto, temos uma dragão e uma guardiã de fogo... Está tudo sob controle... — A paz e confiança na voz da líder do local se tornava cada vez mais inquestionável.

Sem maiores discussões, a reunião se encerrou com levantamentos de como seria a confraternização. Semepolhian e Emmethorion deixaram o prédio localizado em um dos morros, o Monte-Ala da Academia se não estava enganada. Assim que tomaram distância, a imimoya questionou:

— Eu estou louca ou eles estão?

— Não sei... — Respondeu o guardião ainda fitando o local que haviam acabado de sair. — E também não sei como estão tão confiantes... Digo, temos agora muitas pessoas, diversos domínios e habilidades concentradas, além de dragões... Tendo a vantagem do mar, seria difícil perder... Mas se for uma batalha mais longa, guardiões e magos ficam exaustos, desmaiam e aí...

Ele não terminou a frase e não precisou. A guardiã virou seu olhar para outra direção, encarando a concentração de pessoas na base dos montes. Pensou em como falaram de Anima e teve a sensação de que todos ali pareciam simplesmente ferramentas. Instantaneamente seus pensamentos foram interrompidos para lembrar de como parou de procurar Sirius, na perspectiva de que o ovo da garota se quebraria... Não, nós só não o encontramos... Não foi uma escolha... Mentiu mais uma vez para si mesma.

— De qualquer forma, — Emmethorion a tirou de seus pensamentos, — não creio que eles sejam capazes de chegar hoje aqui. Os nimases saíram depois de nós e não viram nada... Sua família no mínimo nos avisaria que estão se aproximando... — Ele fez uma pausa, provavelmente pensando em algo antes de falar: — Eles disseram que têm uma isca? O que isso significa?

— Não tenho a mínima ideia...

— Enfim, só estou tentando dizer que uma confraternização — disse a última palavra em tom irônico — pode não ser uma total má ideia, considerando que boa parte dos povos não se veem há contagens...

A fala do da floresta a lembrou de outra questão:

— Gostaria de saber o que Kalin, Hiems e Kelinia fizeram para convencer os yenkwen... — Comentou.

— É uma boa pergunta, mas nem os vi quando abriram o portal...

— Também não...

Nos segundos de silêncio que se seguiram, a imimoya encarou outra vez o aglomerado de pessoas na base do monte. Um pensamento passou rapidamente pela sua mente, porém ele teve tempo o suficiente para que fosse considerado.

— Você acha... — Se interrompeu. Não queria que ele tivesse as mesmas incertezas que ela, mas também não conseguiria guardá-las para si. — Você acha que estávamos melhores na fortaleza?

Emmethorion levantou uma sobrancelha com expressão irônica.

— Por que lá era só nós que decidíamos as coisas junto com um conselho que geralmente tinha a mesma opinião que a gente?

Semepolhian franziu o cenho, ofendida.

— Está dizendo que eu só prefiro estar no controle?

O guardião riu e tomou fôlego com o olhar distante.

— Brincadeira... Entendi o que você quis dizer, mas não sei... — Voltou o olhar para Semepolhian que o encarava. — Por mais estranha que a tranquilidade deles pareça, eu acho que estamos mais protegidos aqui do que lá...

De cima da montanha, podiam ver muito de todos os outros montes. Em todos os lugares havia pessoas fazendo diferentes tarefas. Semepolhian focou em duas crianças a algumas dezenas de metros deles, estavam sentadas embaixo de uma árvore e liam um livro enquanto testavam movimentos mágicos seguidos de risadas.

— Bom, — disse por fim, — eu espero que sim...

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