Capítulo 18 - A inexplicável virtude da imprevisibilidade, por Marjorie Summers

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 Nós corremos em direção ao que parecia ser a área que ficava atrás do palco, tentando não machucar ninguém enquanto nos agachávamos e tentávamos sair do meio do monte de pessoas – que estavam um pouco alegres demais.

 A cada nova frase que os artistas no palco gritavam eu tinha a certeza de que ia morrer ali mesmo - esmagado no meio de fãs fervorosos de uma banda indie que eu não conhecia. Parecia algo na lista de Marjorie de "Coisas para se fazer antes de morrer" e, droga, se ela estava tentando me ensinar uma lição sobre como devemos viver a vida ao máximo e aproveitar todos os momentos, lição aprendida, Marjorie!

 Minha mente parecia estar no piloto automático e eu conseguia ouvir a respiração ofegante de Andy ao meu lado, mas tudo que passava pela minha cabeça era: "MARJORIE ESTÁ NO PALCO! MARJORIE ESTÁ NO PALCO! MARJORIE É DOIDA! É DOIDA E ESTÁ NO PALCO E AH, MEU DEUS, A GENTE VAI SER PRESO!", e quanto mais perto chegávamos da cena, mais reconhecível seu rosto se tornava lá de baixo.

 Seu sorriso que eu conhecia tão bem já aparecia nas feições um pouco borradas, e se na maior parte do tempo eu pensava em como Marjorie conseguia parecer tão estranhamente bonita de cabelos bagunçados e roupas amassadas, no momento ela parecia perfeita - como uma artista, seus cabelos voando em camera lenta e a pele brilhando, como se fosse uma entidade divina olhando para nós, meros mortais, do alto do olimpo - e eu só conseguia pensar: "EU ODEIO MARJORIE SUMMERS E VOU MATÁ-LA".

 Depois de todo o sacrifício para sair do meio de toda aquela gente, eu e Andy parecíamos soldados depois de uma guerra. Meu cabelo grudava no rosto por conta do suor, não importava o quanto eu o puxasse para trás, e ele tinha certeza que em algum momento entre sair correndo e rastejar entre as pernas daquele monte de gente doida ele tinha perdido a camisa xadrez que amarrara na cintura um pouco antes.

– Não faz nem uma hora que nós entramos aqui e ela já conseguiu entrar no palco – Andy comentou, provavelmente tentando começar uma conversa, mas nem meus pulmões nem meu nervosismo pareciam interessados em bater um papo no meio daquela confusão. – Devia ter levado ela quando entrei num show da Aurora Winter.

Semicerrei os olhos, sentindo uma gota de suor escorrendo pela minha testa.

– Quem é Aurora Winter? – Perguntei, ofegante.

– Não importa – Andy revirou os olhos. – Sabe, pra uma garota que vai morrer, ela parece bem disposta.

– Você não viu nada. 

Embora derrotados e com a sensação muito conhecida de desejar a morte a qualquer custo, corremos mais ainda em direção a uma grade que separava, provavelmente, a área onde nós estávamos, das pessoas comuns, do lugar onde os deuses da musica alternativa ficavam. Um segurança mal encarado olhava para a gente com desdém, esperando que nos aproximássemos.

 Andy me deu uma cotovelada na lateral da barriga que teria doído se eu ainda conseguisse sentir alguma coisa.

  – Deixa que eu falo –  Ele sussurrou.  

Como se EU conseguisse falar. Não conseguia nem respirar direito, ou piscar, ou pensar. Quem dirá formar uma frase para me comunicar com outro ser humano. Não mesmo. Era em momentos como esse que eu invejava e odiava Arwin e Noelle, que provavelmente estavam sentados confortavelmente nos degraus caros da casa dela, tomando sorvete e observando donos passeando com seus cães, reclamando da noiva do pai de Noelle ou alguma coisa tão típica quanto aquilo. 

 Mas não era isso que eu estava fazendo - eu estava atrás de uma garota louca que subiu no palco de um festival de música que, vamos combinar, tinha uma ótima reputação e uma péssima segurança. Essa era a minha vida - eu tinha me metido naquilo e era hora de começar a aceitar a realidade.

Marjorie e os 12 PorquêsWhere stories live. Discover now