Capítulo 24 - Doze

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 Eu não queria fazer um discurso no funeral de Marjorie. Em primeiro lugar, porque eu não tinha ideia do que dizer. Sempre que eu pensava nela eu conseguia pensar em um milhão de coisas, mas não conseguia colocar em palavras – pelo menos não palavras que pareciam certas de serem compartilhadas com tanta gente. Em segundo lugar, eu não queria falar em frente a toda a família dela.

Sua mãe não achou rude da minha parte não dizer nada, o que foi bom, porque pelo menos ela entendia o porquê. A maioria das pessoas ali eram seus primos e tios, e eles falaram sobre como ela era uma garota adorável e inteligente, e "muito especial", mas parecia que eles estavam se referindo a ela como uma criança. Então eu lembrei do que ela dizia sobre sua família: eles não a conheciam direito. Eles não sabiam o que ela queria ou o que ela pensava, e talvez parecesse errado que eles estivessem ali falando sobre a Marjorie que eles conheciam.

Era estranho ver como todo mundo parecia tão abalado com tudo aquilo. Os mais velhos choravam, segurando suas bíblias, vestidos de preto. Tinha algumas pessoas de nossa escola, mas ninguém veio falar comigo, só cumprimentavam de longe silenciosamente. Alguns de seus primos lamentavam a morte dela e diziam como eles gostariam de ter a conhecido melhor, e havia algumas crianças completamente confusas que não sabiam porque estavam ali. Mas era estranho ver como todas aquelas pessoas tiveram anos para se preparar para aquilo - eles sabiam que ela iria morrer e mesmo assim pareciam surpresos.

Acho que é isso que acontece quando alguém jovem morre. Mesmo que a pessoa já estivesse doente há muito tempo, isso deixa aquele sentimento de que a pessoa foi embora cedo demais, deixando algo incompleto. E as circunstâncias da morte não mudam o sentido das pessoas nesse sentido.

Noelle e Arwin ficaram comigo o tempo inteiro, o que também foi bom, porque pelos menos pudemos estar desconfortáveis juntos. Arwin não quis nem um momento chegar perto do caixão, mesmo que ele estivesse fechado, e parecia que ele iria desmaiar a qualquer momento, como no dia em que ela morreu. Noelle era a mais controlada dali, acho que depois de chorar tanto nos dias anteriores ela não tinha mais lágrimas. 

Quando tudo acabou, sua mãe andou até nós e nos abraçou, apertando o máximo que podia, e eu me perguntei se ela estava fazendo aquilo por ela ou por nós.

- Vocês não sabem como fico feliz que Marjorie tenha amigos como vocês - É por isso que eu gostava da mãe de Marjorie – ela falava de Marjorie no presente, como se ela ainda estivesse por ali, escutando.

Ela e Noelle conversaram por uns minutos enquanto eu e Arwin andamos para longe, longe das pessoas de preto que nós não conhecíamos e longe das que conhecíamos, também. O cemitério estava mais quieto do que eu imaginava - Arwin também. De vez em quando ele esbarrava seu ombro no meu, sorria para mim como se estivesse tentando fazer eu me sentir melhor, embora estivesse muito mais pálido que o normal e com marcas escuras em baixo dos olhos. Eu sorri de volta para ele.

Li em um livro que você nunca para de aprender coisas sobre as pessoas, mesmo depois que elas vão embora. Eu não podia esperar para aprender mais sobre Marjorie. Já que eu não podia mais conversar com ela - nem a ter por perto, pelo menos sabia que algo dela não iria embora nunca. Além do mais, eu não tinha cumprido todas as minhas promessas.

 Depois que a maioria das pessoas estava longe o suficiente do túmulo, completamente coberto por flores e cartas, eu corri até o carro da minha mãe e peguei minha mochila. Noelle me olhou curiosa e eu só sorri para ela, não precisava explicar aquilo e sabia que Noelle não perguntaria. Andei até o túmulo recém coberto, abri a minha mochila e peguei meu velho guarda-chuva quebrado. Respirei fundo e o coloquei no túmulo, escondido por baixo das flores muito mais bonitas e apropriadas que o meu presente. 

 Marjorie guardava a posição de último guarda-chuva da sua coleção para algo muito especial, mas eu não tinha um guarda-chuva especial. Tudo que eu tinha era aquilo, e acho que ela não se importaria. Ela não usaria, de qualquer maneira, e o que importava é que ela tinha conseguido completar sua coleção. Eu sorri, me sentindo um idiota, mas um idiota realizado. 

- Ei, Finn, você vem? – Noelle perguntou, de onde ela estava parada junto com Arwin, minha mãe e os outros familiares de Marjorie.

Fiz um sinal com a mão para que Noelle me esperasse.

– Pronto, é isso – Sussurrei, respirando fundo uma última vez. – Agora você tem 12.

 E saí em direção a eles. 

Marjorie e os 12 PorquêsWhere stories live. Discover now