Capítulo 21

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Laysla estava sentada na poltrona ao canto do quarto, olhando pela janela sem nenhuma expressão. Eu estava de pé diante da porta, olhando para ela e esperando alguma resposta ou alguma reação.

Desde que os pais de Laysla contaram aquela história horrível, o clima pesou. Laysla apenas levantou e seguiu para longe deles. Ambos não foram atrás dela, muito menos tentaram fazer ela ficar. Eles a deixaram ir, e pronto. Eu fui atrás de Laysla, óbvio. Mas ela não falava comigo, e nem me olhou nenhuma vez.

Sentia pena dela. Não queria que ela tivesse que passar por isso, e nem imaginava que havia um motivo tão ruim para os pais ficarem longe dela. Claro que isso não muda o fato de que Laysla é filha dos dois, e que ambos deveriam cuidar dela.

Andei até Laysla e parei ao seu lado. Seus olhos vieram para mim, e eu vi as lágrimas escorrendo.

— Não chore — pedi, e peguei sua mão delicadamente — Isso vai passar.

— Não é culpa minha. — ela soluçou — eu não tenho culpa do que aconteceu.

— Eu sei. — sussurrei e passei minha mão por seu rosto — eles não podem te culpar por algo que aconteceu antes de você nascer. É burrice deles.

— Mas eu pareço com meu avô. —ela disse com raiva.

— Ei... — fiz ela me olhar — Você não conheceu seu avô. Ele não te fez nada. E ter feições de alguém ruim não te torna ruim, do mesmo que ter feições de alguém bom não te faz bom. Deus nos fez a sua imagem e semelhança, não é o que dizem? E mesmo assim veja como o mundo é.

Ela refletiu por um tempo e então assentiu. Eu lhe dei um beijo suave e neste instante a porta do quarto se abriu.

— Minha santa mãe! — saltei para longe de Laysla quando ouvi a avó dela exclamar.

— Vó! — Laysla repreendeu.

— Não precisa se preocupar! — disse em minha defesa

— Claro que preciso. — ela me olhou irritada — Porque agora sim temos um problema.

— Não, vó — Laysla fungou — está tudo bem.

— Querida, o problema é você — a velha acusou e eu ia falar, mas ela continuou. — você não quer deixar Kenneth ir.

— Como é? — falei junto com Laysla.

A velha entrou no quarto parecendo perturbada. Laysla ficou em pé ao meu lado, e nós dois olhávamos para a velha com muita aflição.

— Você quer que Kenneth vá embora, Lays? — a velha olhou para sua neta.

— Eu... — Laysla hesitou — Eu...

— Laysla? — fiz ela me olhar — Você não quer me deixar ir?

Ela começou a chorar de novo.

— Não posso. Não percebe? Eu já fiz isso uma vez.

Fiquei sem chão, e sem saber o que dizer. Olhei para a velha que me parecia mais assustada que o normal. Eu sabia o quão arriscado era eu ficar em um mundo que não me pertencia mais, mas não sabia o que fazer para Laysla entender isso. Afinal, eu sempre achei que ela entendia.

— Laysla — a velha falou suavemente — Kenneth não pertence mais a esse mundo.

— Eu sinto ele. — Laysla disse desesperada e foi aí que vi meu erro.

Eu a beijei. Nós nos beijamos. Esse ato criou uma esperança nela, a esperança de uma vida ao meu lado.

— Laysla... — toquei seu rosto para que ela me entendesse melhor — Eu não sou mais vivo. Eu não tenho como passar uma vida ao seu lado, eu nem mesmo estou aqui mais. Você precisa me deixar ir, senão eu vou virar algo pior do que jamais fui.

— Eu preciso de você. — ela declarou — preciso de você aqui. Eu posso te lembrar quando você estiver esquecendo, posso te lembrar quem você é. Podemos ficar juntos, só eu e você, e ninguém vai nos separar. Preciso de você.

— Não posso ficar. — afirmei

— Não posso te deixar ir. — ela se afastou — Não posso.

— Laysla... — tentei

Ela se desvencilhou de mim e correu para fora. Eu quis ir atrás, mas a velha me impediu com um acenar de mão.

— Ela vai entender — a velha disse — temos que esperar.

— Certo — me sentei — eu queria muito que Laysla ficasse bem.

— Ela vai ficar. — a velha sorriu — seu ex cunhado veio aqui atrás dela. Acho que ele gostou de Laysla.

— Meu ex cunhado — franzi o cenho.

Eu sentia como se devesse lembrar disso. Como se isso fosse importante demais para obrigar a fazer algum esforço mental, mas eu não lembrava. Não sabia de quem ela estava falando.

— Kenneth? — ela me chamou e eu a olhei — qual era o nome na sua esposa?

Senti tudo girar em torno de mim. Eu não lembrava, não vinha nenhum nome na minha cabeça, e o fato de ser casado em vida também me deixou surpreso.

— Kenneth? — ela me chamou de novo — e sua filha? Como se chama?

Filha... sim... eu tinha uma filha...

O nome não vinha. Eu não lembrava. Eu não fazia ideia.

— Eu não sei — sussurrei — não lembro.

— Por Deus — ela se levantou — temos que ir atrás de Laysla. Você está virando um espírito vagante. Vai se perder no seu próprio ser pela eternidade. Você precisa ir embora. Agora.

Incógnita: Deixe-o irOnde histórias criam vida. Descubra agora