IV

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  Chovia.
O céu estava cinza. Não havia relâmpagos, nem trovões, nem ventos. Era uma chuva monótona. Assim como o dia de Caroline.
Ela tentou ler, dormir, até mesmo pegou um bordado, que logo largou, estava desesperada para se ocupar em alguma coisa, mas não tão desesperada.
Mais cedo fora brincar com os irmãos, mas estava tão distraída que eles a expulsaram do quarto e preferiram ficar com a preceptora.
Se o céu não tivesse decidido derramar toda a água que havia nas nuvens ela poderia visitar Elizabeth ou Constance. Visitar o museu, passear no Hyde Parque. Não. O parque não. Era por causa do Hyde Parque que ela estava tão inquieta. Melhor dizendo, por causa do que acontecera ali. O que era ridículo porque foi apenas uma conversa, nada demais.
Apenas uma conversa que fez Caroline pensar em Matthew Birminghan mais do que queria admitir. Não tinha gostado nem um pouco de como ele a acusou de ser uma coquete, ela não era isso! Ele não a tinha chamado assim, exatamente com essas palavras, e logo se explicou, não obstante ficara incomodada. Ela era uma pessoa naturalmente simpática e gostava de conversar com as pessoas. Não flertava com cavalheiros indiscriminadamente. E, principalmente, sempre dizia-lhes com toda gentileza quando não havia sentimentos amorosos da parte dela, o que, coincidentemente, acontecia sempre!
E isso obviamente não era culpa dela!
Se fosse bem sincera consigo mesma, não poderia mais dizer "sempre" e sim "até agora". Porque quando Birminghan a encarou com seus lindos olhos azuis e sorriu ela sentiu algo diferente.
Ele não era o primeiro cavalheiro a fazer declarações e a demonstrar que estava interessado nela, mas foi o primeiro que foi tão direto na corte. Também foi o primeiro que a fez sentir realmente algo.
- Está lembrando do jantar na casa do seu tio?
Georgiana perguntou, ao entrar na sala. Seu vestido tinha algumas manchas de chuva, ela provavelmente vinha do clube. Caroline suspirou.
Não tinha mais permissão de ir ao Anjo Caído. Desde a temporada passada sua mãe colocara na cabeça que ela poderia ser reconhecida. Ela desobedeceu algumas vezes, indo ao clube escondida, sempre se certificando de usar uma máscara e pedindo a Bruno, que era um empregado de confiança de anos, que a acompanhasse numa carruagem de aluguel. Mas nenhuma dessas precauções serviu para aliviar a preocupação dos pais, que foram irredutíveis quanto à proibição.
- Você deveria usar aquele vestido azul claro com renda na gola.
Sua mãe sugeriu, sorrindo afetuosamente.
- O último que madame Eugénie enviou?
Caroline franziu o cenho em confusão.
O vestido era bastante arrumado para um jantar na casa do tio, mesmo que esse tio também fosse um duque.
- Simon receberá convidados.
Georgiana explicou.
Caroline notou que a mãe não fez questão de dizer-lhe quem eram os convidados, contudo, não deu importância a esse detalhe.
– Sei que os cachos estão na moda, mas prefiro seu cabelo sem eles. Peça para Antónia fazer tranças.
- Pedirei sim.
...
Pela primeira vez em vários dias Duncan West conseguira sair cedo do trabalho, assim eles puderam ir cedo para a casa Leighton. A chuva se reduzira a um leve chuvisco, fazia frio. Caroline enrolou o xale sobre si e observou as ruas pela janela da carruagem. Seus pais conversavam sobre o jornal e de como um antigo editor estava causando problemas. Caroline não prestou atenção.
Quando chegaram à casa do duque de Leighton ela descobriu que as visitas eram os irmãos da duquesa e suas respectivas famílias. O que a deixou aliviada, não estava com ânimo para socializar.
- Que bom que você chegou, queria conversar com você.
Elizabeth puxou Caroline para a biblioteca tão logo ela cumprimentou os presentes.
- O que aconteceu? Algum problema?
- Não.
Elizabeth respondeu, fechando a porta.
– Queria convidá-la para ser minha dama de honra.
- Eu?
A amiga apertou as mãos de Caroline e sorriu. Ela tinha um olhar bobo, não, bobo não, feliz. E a felicidade a deixava mais bonita.
- Você é uma das minhas melhores amigas e, para sermos francas, eu não teria tido coragem sequer de falar com o Frederick... Se você não tivesse agido de cupido...
- Ele teria se apaixonado por você do mesmo jeito, em algum momento.
Caroline interrompeu. Não porque queria bajular a amiga, mas porque sabia que aquilo era verdade.
– Mas sim, claro que aceito! Vocês esperarão pelo fim da temporada?
- Decidimos não esperar tanto tempo.
Elizabeth respondeu, ficando com o rosto da cor de um tomate maduro.
- Oh...
Caroline parecia um peixe com a boca aberta, será que ela estava entendendo direito as palavras e o rubor intenso da amiga. Jesus! Será que Elizabeth estava grávida?!
- Os proclamas correrão por um mês e logo nos casaremos. Quero uma cerimônia particular, só com a família e alguns amigos íntimos. Já fizemos o baile de noivado e foi uma festa enorme. Quero esse momento só para mim.
Elizabeth explicou, sorrindo.
Um mês. Não. Ela não estava grávida. Se estivesse, Althorn teria providenciado uma licença especial.
Caroline deu um pequeno suspiro de alívio e sentiu os ombros relaxarem. Não queria que a amiga fosse alvo das fofocas maliciosas.
Elizabeth estava radiante. O encontro furtivo que a amiga teve com o noivo no Hyde Parque era algo que Caroline jamais imaginaria que ela fizesse, e não tinha medo de afirmar que a própria Elizabeth não se acreditaria capaz daquilo há alguns meses atrás. Elas seguiam as regras. Elizabeth por ser tímida e Caroline por ter medo de que suas ações fossem julgadas pelas circunstâncias de seu nascimento. Estar apaixonada fez com que a amiga deixasse de lado as muitas amarras que a sociedade impunha às moças da idade delas e Caroline não pode deixar de ter um pouquinho de ciúmes desse sentimento.
As duas moças voltaram juntas para a sala de visitas, bem no momento em que lady Juliana anunciava que o jantar seria servido. Como era um jantar em família, todos se dirigiram para a sala sem formarem a costumeira fila por precedência de títulos. Sempre que possível, a duquesa preferia dispensar as rígidas regras de etiqueta britânicas. Nenhum dos convidados estranhou a informalidade.
Por isso, Caroline não conseguiu esconder a surpresa quando lady Juliana chamou seu nome e apontou para um lugar na mesa, ao lado do conde de Reddich.
Caroline sorriu.
Andou até o lugar apontado.
Esperou que o conde puxasse sua cadeira.
Sentou e em seguida procurou a mãe para fulminá-la com o olhar.
Provavelmente a recomendação do vestido e do penteado foi feita unicamente porque sua mãe desejava que ela impressionasse o conde.
Ou pior: aquele jantar teria sido planejado por ela, junto com lady Juliana e lady Isabel para fazê-los passarem um tempo juntos!
Não. Sua mãe não faria isso.
Oh... pelo amor de Deus, a quem Caroline estava querendo enganar, era óbvio que sua mãe faria algo desse tipo!
- Vi você e Elizabeth no Hyde Parque. Pensei em cumprimentá-las, contudo, percebi que você estavam acompanhadas por um cavalheiro e não quis atrapalhar.
O conde falou, tão logo acomodou-se.
Será que ele conhecia o sr. Birminghan? Teria perguntado aos pais dela pelo homem que a acompanhava?
- Também o vi. Estava passeando com lady Morgan. Você a está cortejando?
Ela inquiriu, não se importando de parecer indiscreta.
- Fui visitá-la e a acompanhei num passeio no parque.
- E levou rosas...
Caroline acrescentou com um sorriso travesso, inclinando a cabeça para o lado.
- Orquídeas.
- Deveria cortejá-la. Vocês formam um belo casal e lady Morgan é adorável.
Sabia que estava passando dos limites, contudo, não queria que o conde pensasse que ela estava de acordo com os planos casamenteiros da mãe dela e da irmã dele.
Reddich a encarou, com seus olhos castanhos, por pelo menos um minuto inteiro antes de responder.
- Talvez sim.
Ele ponderou ainda olhando para ela, em seguida desviou sua atenção para o prato, murmurando
– Ainda é muito cedo.
Encabulada, Caroline fez o mesmo, fitando o seu próprio prato.
A conversa na mesa tornou-se agitada, como todos querendo opinar sobre a eleição da Câmara dos comuns, que aconteceria em breve.
- Não reconheci o cavalheiro com quem você estava conversando. Ele a está cortejando?
Reddich indagou, dessa vez, sem olhar para ela.
- Fomos apresentados no baile de noivado de Elizabeth.
Esclareceu asperamente, sem erguer a cabeça. Ela não poderia reclamar dele fazer uma pergunta tão pessoal, não quando ela fez a mesma coisa, ainda sim, sentiu-se desconfortável.
– Encontramo-nos por acaso.
Reddich voltou a conversar com os outros. Enquanto Caroline permaneceu alheia. Fora indelicada, reconhecia e arrependia-se por ter respondido de maneira tão ríspida. Aquele comportamento não era da natureza dela. O conde não era culpado pelas atitudes da mãe dela e de lady Isabel. Provavelmente ele estava aborrecido com aquilo, mas era muito educado e gentil para ser descortês com ela.

...

A jovem esperou apenas que seus pais se acomodassem na carruagem para confrontar a mãe.
- Não acredito que fez isso!
Georgiana simplesmente a encarou.
- Não acredito que combinou esse jantar com lady Juliana e lady Isabel para colocar o conde de Reddich e eu juntos!
Caroline não segurou o tom de voz. Estava muito aborrecida.
A mãe ergueu uma sobrancelha perfeita, ainda sem dizer nada.
- Não sei do que está falando, Caroline.
- Ora mãe, por favor. A escolha do vestido mais cedo. Lady Juliana sentando nós dois juntos quando nenhuma outra pessoa naquela sala teve os lugares marcados...
- Foi por isso que se comportou de forma tão estranha durante o jantar?
Georgiana perguntou, sem se alterar com as acusações da filha. Parecia mesmo que não lhe incomodava que Caroline tivesse descoberto seu "plano".
- É claro que sim! Não pode me manipular como fez com seus amigos. Não vou me apaixonar pelo conde só porque a senhora acha que ele é ideal para mim.
Caroline quase gritou.
A tranquilidade da mãe só estava servindo para deixá-la mais zangada.
- Caroline, sua mãe não está te manipulando.
Duncan interveio, erguendo as mãos num gesto apaziguador.
Caroline cruzou os braços e fechou a cara. Sabia que assim parecia uma criança birrenta, mas não importava. Sua mãe tinha que perceber que não estava disposta a ser jogada nos braços de ninguém.
- Concorda com isso?
Caroline perguntou, incrédula, ao pai. Realmente pensou que ele ficaria ao seu lado.
- Não vejo qual problema em proporcionar ocasiões em que você e James possam se conhecer melhor.
Georgiana afirmou, encarando a filha severamente.
Era isso então, a mãe estava assumindo. O jantar fora preparado para os dois.
Caroline bufou de maneira deselegante.
Pareceu que Georgiana insistiria na conversa, entretanto, Duncan segurou-lhe uma das mãos levando-a aos lábios, dando-lhe um olhar significativo.
Por sorte Caroline não contara para a mãe sobre o sr. Birminghan. Ela provavelmente encontraria mil defeitos nele ou uma ficha na Scotland Yard.  

Georgiana ajudou todos os amigos a encontrar um par, será que ela conseguirá encontrar um par ideial para a filha?

O lado bom de um escândalo [COMPLETO]Where stories live. Discover now