Capítulo XX

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Meus dias de casado são empolgantes para dizer o mínimo, se soubesse o quão prazerosos e diferentes seriam em absoluto teria demorado tanto a casar-me. Minha bela esposa tem se mostrado muito mais impertinente, inteligente e astuta, tenho a observado entesourando suas expressões, suas falas... cada pequeno detalhe.

Os dias em que passo longe dela, são um tormento, é como se ela tivesse se tornado um poderoso ímã que me atrai constantemente. Não deve ser diferente para os outros cônjuges, não é mesmo?! O amor apesar de vetado para nós, não me impossibilita de apreciar sua companhia e sua conversa inteligente, seria um tolo se desperdiçasse esses momentos. E, os acontecimentos da última noite, me fizeram ter ainda mais certeza de que ela é forte, determinada e aguerrida...

Em meio a chuva densa e volumosa da noite, vieram os raios e mesmo que tentasse proteger seus ouvidos, Kate de algum modo os sentiu e reagiu a eles. Enquanto os clarões iluminavam nosso quarto tentei me levantar para fechar as cortinas, mas fui impedido. De forma inconsciente, segurou-me com força, sabia que precisava fechar as cortinas, então com o coração em prantos a soltei e executei a tarefa com a maior agilidade possível. De volta a cama, abracei-a mais forte na tentativa de prover o consolo que necessitava.

Na biblioteca de Aubrey Hall havíamos passado um momento de terror juntos. Quando a encontrei abraçada aos joelhos, imóvel e completamente dominada pelo medo, pensei que não poderia haver momentos mais assustadores que aquele, mas ali em nossa cama, em nosso quarto, tive a certeza de que poderia ser pior.

Não havia dúvidas de que minha adorada esposa, estava de volta a sua infância, pois fazia sons característicos de uma criança. Sua postura não era nem de longe de uma mulher adulta, não digo isso de modo depreciativo, mas pelo fato de que o grito que emitiu, quando o trovão seguiu o clarão do raio, foi de puro tormento infantil, ela chamava pela mãe, e não acreditei se tratar de Mary. Ela pedia desesperadamente que não a deixasse e a cada lágrima que derramava, meu peito se encolhia um pouco mais. Meu desejo era retirar todo aquele peso dela, que a minha presença diminuísse seu sofrimento, que fosse capaz de tirá-la da tormenta.

Fiz, como vi mamãe fazer inúmeras vezes, acalentei-a com meu toque e frases de consolo, desejando ardentemente que aquela tempestade diminuísse e que ela pudesse enfim voltar a dormir tranquilamente. Não sei quantos minutos, horas passei agarrado a ela, confortando-a, mas não consegui pregar os olhos até que o último trovão e o último relâmpago cortaram o quarto, e seu corpo relaxou totalmente e sua respiração se tornou regular.

Tivemos uma conversa assim que ela despertou, eu não considero que eu despertei, pois a última coisa que desejei fazer durante a noite toda era dormir, velei seu sono, e tentei arrumar meus pensamentos, pois para ajudá-la teria que manter as rédeas meu próprio medo,  ainda que a visão dela sentada na cama, ereta e com o som de seu grito propagando no quarto me assombrasse.

Decidi que deveríamos procurar Mary, uma vez que ela certamente saberia de algo que esclarecesse os acontecimentos da noite. Ao ouvir toda a história que Mary nos contou fiquei estarrecido, tentei obviamente passar para Kate todo o apoio que me caberia como marido, mas ouvir a descrição do dia da morte de sua mãe e saber que ela, uma garotinha tão pequena na época, teve que passar por tudo isso sozinha, me gerou o desejo de estar lá, naquele exato momento para confortá-la. Diabos, sei que pode soar estranho, mas é o que sinto!

A perda de papai foi traumática e extremamente dolorida, sinto-a até hoje, porém eu já contava com 17 anos, enquanto Kate, minha adorável Kate, a perdeu aos 3 anos de idade em imagens trágicas e vívidas.

Por mais que pense o quão aterrorizante foram aquelas horas, Kate, ainda que impactada por todas as revelações de Mary, enfrentou tudo, e parece ter saído vitoriosa de seu embate com o medo. Deus, como a admiro!!

Diário do Visconde Bridgerton - COMPLETA Where stories live. Discover now