23:09 PM

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23:09 PM


Eu sei que não preciso impressioná-lo, mas sei, em meu íntimo, que quero.

Posso visualizar-me em pé perto demais do meu objeto de estudo naquela festa, incapaz de me mover ou falar qualquer coisa. Seu sorriso é lindo, e é final de ano, e ele está saindo do colégio. Por que você não se aproxima? Não. Eu não consigo.

E então, a oportunidade vai embora rápido.

— Angelina? — William me chama.

Eu volto ao mundo real.

— A verdade é que não sou muito boa em falar sobre mim. — digo, um pouco envergonhada da minha constatação.

Mas, na verdade, é que eu não sei se quero me abrir tanto assim com alguém, por que as vezes - e muitas vezes que fiz isso - acabei me dando muito mal.

William está ainda me olhando, e não sei se isso é algo que gosto ou não. Em parte é, mas seu olhar ainda me deixa acoada.

— Não é boa em falar de si mesma? — ele questiona, com a sobrancelha franzida.

— Não, não mesmo. — dou de ombros.

— Agora estou muito surpreso e confuso. — William dispara.

Estou encarando-o novamente.

— Por que? — em dúvida, pergunto.

Não entendi a sua fala. Surpreso em relação a quê?

— Eu não sei. — responde ele, pensativo.

É claro que isso me mantém curiosa e tensa, por que detesto pessoas que me deixam com algum tipo de dúvida e incerteza, e é exatamente isto o que ele está fazendo. Então, voltamos a ficar em silêncio e, desta vez, me sinto ainda mais incomodada.

Vejo a Angelina mais madura finalmente se libertar das mãos da Angelina mais nova, que agora está irritada enquanto a outra, vitoriosa, arruma a postura.

"Viu só? Ir pela cabeça dessa aqui não é uma boa ideia."

Sua fala me desanima.

"Não escuta ela, tenha calma, tudo vai ocorrer da melhor forma possível."

A Angelina mais nova rebate, fitando a sua outra versão com antipatia. Eu respiro fundo, sentindo a confusão que acontece dentro de mim começando a ficar intensa.

— Tive uma ideia. — ele volta a falar e seu sorriso se alarga um pouco mais.

Não sei se sinto alívio ou se sequer consigo senti-lo, por que no momento as duas vozes na minha mente estão em um debate intenso e o meu corpo sente o efeito disto. Meu coração está acelerando novamente. Droga!

— O que? — questiono, receosa.

— Já que é meio difícil para ti falar sobre si, que tal fazermos uma espécie de jogo?

— Jogo? — desta vez, somos eu e as duas versões minhas que respondem-no ao mesmo tempo.

Ambas pararam de se confrontar, e agora observam tudo com cautela.

— É, um jogo. — põe o cabelo que cai em seu olho para trás e é claro que acompanho seu movimento — Deixa eu explicar — sorri mais uma vez — Eu falo algo sobre mim e daí você fala algo sobre você logo depois. Tipo, ah, a minha música favorita é tal... Entendeu?

Confesso que gosto da sua sugestão, e, além disso, ela me surpreende. Eu nunca imaginei que William fosse dessa forma, tão aberto, embora eu saiba que ele sempre foi muito romântico. Pelo menos eu sabia que, na época da escola, ele era muito romântico com a sua namorada. Marine, que namorava com Timóteo, convivia com William também, por que, afinal, seu namorado era um grande amigo dele e, consequentemente, ela convivia com a namorada de William também, a Lídia.

Cheguei a falar com ela. Várias vezes, na verdade. Com a convivência com a Marine foi impossível que isso não acontecesse. E nunca, jamais, olhei-a com desdém ou a tratei mal. Eu tinha uma queda do tamanho do mundo pelo seu namorado, mas eu sou uma boa pessoa e nunca agiria como um ser afetado. E, na verdade, Lídia parecia ser uma incrível pessoa. Eu sabia que eles se davam bem. Marine me confirmou isso sem que eu sequer lhe perguntasse.

Ela não estudava na mesma escola que a gente, mas, nas vezes em que saí com Marine para algum lugar, vez ou outra acabávamos esbarrando com ela, e Marine sempre a cumprimentava. Lídia é uma pessoa espirituosa e sorridente, além é claro, de muito bonita. Não nego que, quando Marine resolveu nos apresentar foi estranho. No entanto, apesar de nunca termos sido próximas, admirava sua simpatia e empatia. Nunca conversamos de verdade, eram apenas encontros pelo acaso, enquanto Marine, Tyna e eu passeavamos em algum lugar e, coincidentemente, ela estava por perto.

Marine me contava o que acontecia entre William e Lídia. Eu sei que William a amava, que eram um casal que, além de namorados, eram amigos e que viviam altas aventuras juntos, por que tinham o mesmo ritmo e por que gostavam das mesmas coisas e partilhavam ideias que eram semelhantes. Eu também sei que eles se separaram por algum tempo e que agora estão juntos de novo. Na verdade, já faz algum tempo. Eles não se amavam, eles se amam.

Lembro de tê-los visto juntos em um encontro casual. E então eu olho em direção a Angelina mais velha, que concorda veementemente com o argumento que estou formulando agora mesmo em minha mente. Você só não pode sentir o coração errar uma batida a cada vez que põe os olhos sobre ele e nem querer tanto saber o que está desenhado em seu ombro. É a Lídia que tem que sentir isso, e não você.

— Angelina? — William me chama e eu volto ao mundo real.

— É... — eu falo quando me situo, esboçando um sorriso de lado, por que não quero que ele cogite a possibilidade de eu estar pensando algo que não devia - Acho uma boa ideia. - e realmente acho, por que, de qualquer forma, ainda quero conhecê-lo. Não é errado, é? - Mas você pode começar?

Ele sorri.

— Posso. — diz.

O cheiro de terra está mais forte. Olho novamente pela janela, a garoa se transformou em um chuvisco que parece aumentar e, mesmo assim, o som do outro lado desta porta ainda é forte.


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bjxs,

Triz

Meu BluesWhere stories live. Discover now