Capítulo 11 - Fora do Baralho

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      Subiu a treliça como um gato assombrado, deixando marcas de terra e sangue onde pisava. O hálito quente tocava seus pés e não esperou pelo encontro dos dentes, enquanto o cão dava saltos de dois metros e meio para pegá-la. Malditos fossem, eles e ela.

      O cheiro de sangue e grama esmagada lhe dava náuseas. Embora, talvez, a culpa tivesse sua parcela.

      No corredor, a tengu só conseguia pensar em sua missão, repetindo teimosamente que devia encontrar Kervan, enquanto o suor frio se contrapunha ao sangue quente. Sõjo nunca me deu essa tarefa. Se Elawan a encontrasse iria matá-la, e a Kervan. Dane-se, foi o que conseguiu dizer, mas tudo o que lhe veio à mente foi a ameaça do feérico, cortar suas asas... Seu corpo inteiro se arrepiou. Ignorando a razão seguiu a meia luz das arandelas pelo corredor de portas duplas e quadros idílicos nas paredes. Se cair dessa vez, posso não conseguir levantar. Mas também não iria recuar.

     Sentiu o chão protestar, um tremor distante, acompanhado da lamúria das serpentes, ouvindo com atenção, era sim, mais de uma. Estavam se despedindo. Tudo parecia um poço de silêncio naquela área, como se o silvar do wyvern tivesse devorado os demais sons e na breve experiência de Nidaly com répteis alados, nada de bom vinha depois disso.

      Recordou do toque dele, a pele áspera, tíbio inquietante e os pelos de sua nuca se eriçaram. Se parar, estou perdida. Atentou a própria respiração.

    Fase 2, em andamento.

     Agora sabia onde Kervan estava.

    Matutara piamente o que fazer. Esboçara em seus sonhos todas as possibilidades enquanto dormia a caminho da cidade. Em seu sono vigilante, não sabia o que esperar de Liffey, era fato, mas observando o lorde com prudência durante sua conversa, como fora treinada a fazer, tinha um novo plano armado; com todas suas potencialidades e falhas.

      Pelo menos era o que pensava.

      Fase 1... deu meio errado.

     Encontrar os cães foi fácil, conhecia o cheiro deles. Depois libertaria Kervan durante a balbúrdia e desapareceriam na noite, respectivamente fases dois e três. Não muito depois a cativa descobriu que a única parte simples seria escapar da sala onde Elawan a deixara, com o graveto e ramo que colhera na estrada para abrir a tranca.

      Você é só meia inútil, sua irmã dizia. Mais do que nunca, Nidaly concordava com Delilah.

      Eu atirei pedras nas águas de Nínive, é a única explicação. Se um dia encontrasse a deusa feérica teria pedras na mão, mas tacaria em sua cabeça milenar como protesto. Sou uma tengu, a okumi de Sõjo. Kervan me chama de Rompe-tormentas e se não conseguir sair dessa, não serei digna desse nome.

      Praguejou em pensamento só de lembrar que teria de voltar para o lado de fora, onde quase foi devorada viva por uma matilha de cães raivosos e um wyvern.

     Soltara os animais pé ante pé.

     Os humanos diziam que tengus podiam mesclar-se à escuridão, descer das montanhas para fazer o que bem quisessem sem jamais serem vistos. Nidaly já se provara exceção à regra. Uma criatura verdadeiramente sorrateira mergulhou em seu encalço antes que tivesse a oportunidade de adentrar mais a fundo naquele canil, tão próximo como uma sombra ele a perseguiu. E não estava sozinho. Na caçada silenciosa dos jardins, a tengu saltou sobre o que julgava ser uma escultura gigante, mas se mostrou um lagarto adormecido que furioso atacou os caçadores peludos, na tentativa de prender a guerreira alada.

Entre Damas e EspadasWhere stories live. Discover now