Capítulo 9

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FELIPE

O dia amanheceu caótico.

Falava isso pelo aspecto de minha casa mesmo. Apesar de ter sido tudo preparado na área externa, a bagunça que havia ficado era proporcional a uma festa feita para trezentas pessoas.

Acordei pelas sete da manhã com um pouco de dor de cabeça, mas me forcei a levantar, começando a arrumar algumas coisas que tinham pela casa.

A cozinha dava dó de ver.

Apesar de morar sozinho há algum tempo, mesmo com a minha família toda por perto, nunca fui bagunceiro, sempre mantive as coisas em ordem e muito limpas, com ajuda de Mônica também, uma faxineira que vinha uma vez por semana. Mas eu não aguentaria ficar em uma zona por uma semana inteira.

Juntei algumas louças e comecei a lavar da cozinha interna. Mas quando fui para a edícula quase caí de costas.

Tínhamos mesmo sujado tantas louças? Era para estarmos em oito pessoas, mas eu podia jurar que havia uns vinte pratos espalhados por todo o local.

Juntei tudo o que podia e lavei, acabei passando um pano no chão também para tirar um pouco da sujeira.

Quando terminei, resolvi preparar um café da manhã, já que eu estava faminto e havia uma hóspede na minha casa. E ela certamente iria precisar de um café. Forte.

Peguei minha carteira e chaves e resolvi ir caminhando até a padaria mais próxima, já que não ficava muito longe.

Precisava de um tempo a mais para espairecer, pensar em tudo e mais um pouco.

Minha cabeça girava mesmo parada em cima do meu pescoço, não conseguia focar em um único pensamento.

Durante o trajeto, fui recordando coisas do meu passado. Não somente meu. Até mesmo porque sempre que falava em passado, Amanda estava nele. Em todas as lembranças que eu conseguia me recordar.

Desde mais novos, quando discutíamos por tudo e eu a irritava, até mesmo quando começamos a ficar amigos, a adolescência toda foi com ela. Separamo-nos quando minha família se mudou para a cidade e eu vim para cursar a faculdade. Mas ainda assim nunca perdemos contato. De uma forma ou de outra, Amanda sempre esteve presente em minha vida.

Segui o caminho todo me lembrando de nossa infância, das brincadeiras nos sítios de nossas famílias, e como eram as coisas antigamente.

Não me atentei quando estava prestes a entrar na padaria e acabei esbarrando em alguém.

Tentei segurar a pessoa pelos ombros, pedindo desculpas.

Mas antes que eu fizesse isso, ela também fez, provavelmente com os mesmos pensamentos que eu.

— Desculpe, não estava prestando atenção — pedi.

— Felipe? Felipe Martinez?

Olhei para cima, tentando reconhecer a pessoa. Era um homem de meia idade, eu diria da idade do meu pai, trajando um terno muito bem alinhado.

— Sim, eu mesmo — disse ainda meio desconfiado.

— Rapaz, como você cresceu. Robson Dantas. — Ele estendeu a mão para mim, que aceitei. — Você provavelmente não se lembra de mim, não é?

— Não, me desculpe — fui sincero.

— Eu já imaginava. Eu trabalhava com seu pai. Conheci você quando era um pivetinho pequeno que ainda chupava dedo.

Passei as mãos pelos cabelos, levando-os para trás e dando um sorriso meio forçado.

— Mas, como você está? Fazendo faculdade? E seu pai? — O homem me bombardeava de perguntas, todas de uma única vez.

— Bom, meu pai está bem, trabalhando no mesmo ramo da engenharia civil. Nós nos mudamos para cá quando os negócios dele começaram a ficar muito exigentes — falei sem muita pretensão — e eu acabei a faculdade, cursei arquitetura e urbanismo.

— Que maravilha, garoto. — Algumas pessoas que me conheceram mais novo insistiam em me chamar assim, mesmo eu tendo meus vinte e seis anos. Mas era algo que não me incomodava, então não falei nada. — E você já está trabalhando na área? Com o sobrenome que tem deve ter sido fácil.

As pessoas costumavam pensar isso. "sendo filho de quem é" "com a ajuda do papai". Mas a verdade é que eu recusava propostas que chegavam para mim por meio do meu sobrenome. Queria montar o meu próprio nome, e não crescer na sombra de outra pessoa.

— Não, tenho recusado propostas que me chegam apenas pelo sobrenome. Mas estou com um projeto de montar um negócio com uma amiga também formada em arquitetura.

Amanda e eu ainda não tínhamos falado muito sobre isso, mas era um sonho nosso desde que começamos a faculdade. E sua vinda para São Paulo era com esse intuito.

— Muito honrado da sua parte. — Enquanto ele falava liberei espaço para que entrasse na padaria primeiro e fui logo em seguida. — Então, quer montar um escritório?

Ele parecia mais interessado do que quando estávamos falando sobre meu pai. E se ele era da mesma área dele, talvez pudesse nos dar um empurrão inicial. Já não seria nada vindo do meu pai nem do meu nome pelo menos.

— Ainda não discutimos sobre isso, se seria bom um Home Office por enquanto, ou já iniciar com um escritório de cara.

— Com inícios de projetos é sempre bom pensar muito mesmo.

Seguimos para a fila, e ele continuou conversando.

— Sabe, talvez eu possa ter um projeto inicial para vocês. Podemos marcar alguma coisa. Uma análise de projeto talvez.

Uau, não estava esperando por aquilo. Mas eu realmente não estava querendo ganhar nada com o nome do meu pai envolvido. Estava pensando em uma ajuda e uma indicação dele, mas um projeto inicial assim... era uma coisa grande.

— Olha Sr. Robson, agradeço mesmo, mas como falei com o Senhor, não pretendo crescer pelo meu pai.

— E por acaso eu estou aqui falando com o seu pai? É por você que eu me interessei, rapaz.

Abri um sorriso meio sem graça e muito sincero. Se aquilo acontecesse mesmo, seria o pontapé inicial, que precisava para começar os negócios.

Antes que eu pudesse agradecer, Robson foi chamado para ser atendido, e fazer o pedido. Mas assim que ele acabou de pedir, chamei-o novamente.

— Agradeço muito a ajuda que está me dando.

— Não me agradeça ainda. Como você mesmo quer, o projeto será analisado como qualquer outro. Não conte vitória antes.

— Somente pelo senhor me dar esta oportunidade, já fico muito agradecido.

— Agora pare de me chamar de senhor, por favor, e me passe seu número de telefone para que possamos nos comunicar.

Assim fiz, passando meus contatos a ele, que anotou todos, até mesmo o de Amanda, explicando-lhe que era a minha amiga e sócia nos negócios.

Na volta para casa, já com uma sacola cheia de guloseimas, minha mente se inundava de expectativas.

Trabalhar com Amanda sempre foi o nosso projeto de infância. E aquilo estava prestes a se concretizar.

No meio desses pensamentos, comecei a me lembrar de acontecimentos da noite passada.

Amanda fazendo uma proposta para mim.

Ela realmente havia dito aquilo? Estava muito bêbada e falando com a língua toda enrolada, provavelmente eu havia entendido totalmente errado.

Ela não faria aquilo?

Tirar a sua virgindade? Amanda não podia me pedir isso. Eu não podia nem pensar nisso, era totalmente errado.

Uma Proposta Entre AmigosDonde viven las historias. Descúbrelo ahora