Capítulo 21

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"Desde que você se foi, acabou meu riso, mas não minhas lágrimas
Quis me divertir, me distrair, para que minha alma não doesse
Mas era impossível e comecei a procurar alguém que me amasse
E encontrei carícias, beijos e coisas que eu não poderia imaginar

Mas amor, amor, aquilo que se chama amor não encontro
Não há ninguém como você que tenha seu calor, seu coração, seu corpo
Onde está você, amor? Porque não posso com essa solidão
Volte por favor, porque amor, amor, Só contigo eu sinto..."

****

Maria não teve reação diante da atitude de Estêvão. Esperava muitas coisas dele: desprezo, ódio, palavras baixas, as quais ele jamais usaria para descrevê-la, mas, um beijo? Não foi apenas um beijo, foi bem mais que isso. Aquele beijo dizia que ele estava sendo obrigado a se afastar, pois não era sua vontade, mas diante dos fatos, não havia muito o que fazer. Ele ainda tinha seu orgulho.

Ainda com as costas coladas na parede onde tudo aconteceu, Maria se recordava dos acontecimentos de minutos atrás com um sorriso triste. Estêvão a amava, ela tinha certeza disso, porém estava disposto a esquecê-la, e essa certeza a matava, destruía cada milímetro do seu ser. Pior do que ser olhada com ódio, certamente era ser olhada com indiferença.

Com suas pernas trêmulas, Maria tentou sair da inércia em que se encontrava e tirar Estêvão da cabeça. Se mover não foi uma tarefa difícil, mas tirar aquele homem da sua cabeça, aquela sim seria uma missão impossível.

Fitou o relógio em seu pulso; era quase meio dia. Se saísse de casa naquele minuto, chegaria à casa dos pais por volta das três. Um bom horário, já que não enfrentaria o horário de pico, e ainda teria tempo de ver o pôr do sol da cidade onde nascera, que era uma das coisas que adorava fazer quando criança.

...

Maria dirigiu sem parar durante as três horas. Não tinha urgência, mas, como em poucos momentos em sua vida como motorista, aquele dia ela era a própria calma. Foi admirando a paisagem e aproveitou para pensar na vida – como se não estivesse fazendo isso há tempos. Contrário do que imaginava, não se abateu, mas agradeceu em seu íntimo.

Muitas coisas ainda estavam fora do lugar, mas sem sombra de dúvidas, saber que em seu ventre se desenvolvia seu grande sonho, dissipava toda e qualquer tristeza.

E por fim, ali estava ela, parada frente à casa dos pais, olhando e trazendo à memória todos os momentos ali vividos. Por um instante, quis voltar aquela época, onde sua única preocupação era de escolher o sabor do sorvete que tomaria enquanto via o sol se pôr.

— Maria, minha filha!

— Mãe!

Seu desejo de voltar a ser criança se intensificou quando Lídia, sua mãe, a envolveu em seus braços. Um misto de emoções sobreveio sobre ela. Teve vontade de rir, chorar, gritar, falar e falar muito, mas no fim, preferiu ficar no aconchego do abraço da mãe. Não havia melhor lugar para se estar. Ali, todos os problemas sumiam, mesmo que fosse por um ínfimo de segundo.

— Quando vi seu carro, quase não contive um grito de felicidade. Não estava acreditando que viesse mesmo.

— Mas eu não disse que vinha?

As duas caminhavam em passos lentos em direção à sala de estar. Ao chegarem, Maria se acomodou primeiro e em seguida, sua mãe à sua frente.

— Disse, mas você foge desse lugar como o diabo foge da cruz. – Repreendeu-a, mas logo a falsa cara de mãe brava se foi dando lugar a um sorriso cheio de saudades. – Preparei aqueles biscoitinhos amanteigados que você tanto ama. Já, já estarão prontos.

Amor nas EntrelinhasWhere stories live. Discover now