Capítulo 23.

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Benjamin

     Traguei o cigarro em uma tentativa desesperada de aplacar aquela angústia filha da puta, enquanto observava pessoas comuns entrando e saindo do prédio. Será que elas pareciam normais na aparência, mas eram tão fodidas por dentro como eu?

     Outro tragada.

     Aquela sensação de não pertencimento misturada à sensação horrorosa de não me sentir como eu mesmo era terrível. A Dra. Ted havia dito alguma merda sobre como o processo de mudança estava atrelado, inevitavelmente, à dor. Ao menos, em relação àquele assunto, ela parecia ter alguma razão, porque eu me sentia uma merda o tempo inteiro.

     Outro tragada. 

     Ainda que de forma vaga e breve, pela primeira vez, passou pela minha mente a possibilidade de sumir e deixar todos em paz de uma vez. Aliviaria grande parte das preocupações de Danny e Jessa, tiraria das costas de Nate o fardo pesado que é ser meu melhor amigo, faria com que Emma parasse de sofrer tanto, e eu poderia continuar sendo um filho da puta qualquer sem precisar me submeter a qualquer tentativa patética de redenção.

     E então Emma atravessou a porta de vidro. 

    E aquela ideia se desintegrou na mesma velocidade com que havia surgido.

    Eu era um bastardo egoísta incapaz de deixá-la ir.

     Segurou educadamente a porta para que um senhor entrasse, sorrindo com toda aquela doçura para um desconhecido qualquer. O homem agradeceu, surpreso pela gentileza inesperada em uma cidade que cultivava e promovia a hostilidade. 

    Soltei um meio sorriso sofrido, sentindo a porra do meu peito doer por amá-la tanto.

    Outra tragada e ela me notou.

    Não soube definir se era o corte de cabelo novo que lhe atribuía um ar mais firme e seguro ou se o corte de cabelo havia sido motivado porque ela se sentia daquela maneira. O ponto central é que, visivelmente, havia algo de diferente. 

    Estudei-a por completo, detestando o fato de que o moletom largo e comprido me privavava de ter uma boa visão de suas coxas no jeans justo. Levantou o queixo delicado e caminhou em minha direção. Mantive a pose despretensiosa, quase relaxada, segurando o cigarro nos lábios, aproveitando o fato de que, ao menos, eu ainda conseguia fingir.

    Ela parou na minha frente, com os traços delicados e perfeitos retorcidos em uma careta de desagrado.

    Tão, mas tão linda, baby... Porra. 

    O vento soprou, espalhando fios de cabelo pelo seu rosto, e meu dedos coçaram de vontade de afastá-los. Eu pagaria qualquer coisa para poder ajustá-los atrás da orelha e acariciar com meu polegar suas bochechas vermelhas de frio. Qualquer maldita coisa.

    Ela mesma o fez, é claro. Ajeitou-os, deixando seu rosto totalmente à mostra, fazendo meu coração acelerar de felicidade. Olhá-la de perto era sempre um grande evento para o infeliz. Como era possível que eu me sentisse ainda daquele mesmo jeito? Mesmo depois de tanto tempo. Mesmo depois de tudo. Aquela sensação pulsante de que eu poderia explodir porque estava olhando para o amor da minha vida continuava bem ali. Ela lambeu nervosamente os lábios cheios e perfeitamente bem desenhados, também lidando - à sua maneira - com aquele fio potente que nos entrelaçava. Ela poderia negar verbalmente quantas vezes quisesse, mas eu sabia que aquela porra era recíproca. Eu podia ver. Eu podia sentir. Sua pupila dilatada e seus lábios secos não mentiam. 

    — Joga essa porcaria fora.

    Tomou o cigarro da minha boca, arremessando-o no chão.

Divorce [REESCRITA]Kde žijí příběhy. Začni objevovat