Cap. 10 - Segredos ao pôr do sol

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Em uma das maiores favelas horizontais da América Latina, estava Wallace.

Jovem, pobre, queer, negro.

Discriminado e prostituído.

Uma vida marcada pelo preconceito e pelo ódio. Perambulando pelas ruas da cidade tentando achar alguma salvação mediante aos abusos que sofria, sua esperança se desfazia a cada passo. Não queria voltar para casa e fingir ser o que não era. Não queria ir para a escola e ter que suportar o bullying dos colegas por ser afeminado. Também não queria estar na rua e ter seu corpo violado.

Naquela noite, entrou no primeiro ônibus que viu e enquanto caminhava a esmo pelo setor comercial, onde apenas os errantes estavam despertos, teve um encontro absurdo com um louco enquanto vagava pelas ruas. Isso deve ter sido há oito anos atrás, quando ainda era um adolescente perdido.

- Ei, você! - disse um homem, surgindo das sombras atrás de uma pilastra. - Por quê não usa a tecnologia a seu favor? - O olhar dele era envolto em mistério e um sorriso de canto que causou um bom susto em Wallace.

Ah meu santo!? Por quê não uso a tecnologia? Nem casa eu tenho! Esse tio tá me tirando, depois eu que uso drogas? Faça-me o favor.

- Vou abrir seu caminho. - Disse o homem se aproximando de súbito.

Ah tá! Playboyzinho de merda. Senta lá Cláudia. - Ignorou.

Aos olhos de Wallace, o cara de pijamas a sua frente era apenas mais um dos viciados que circulavam pelo local e ele só queria ficar em paz. A noite já estava caótica o suficiente para ter que aturar os nóias.

- DÁ O FORA, MERMÃO! - disse ele irritado empurrando o homem.

O cara sorriu.

- Você vai me agradecer depois.

Antes que Wallace pudesse reagir, o homem estava bem à sua frente. Em um estalar de dedos e por um breve momento, notou a íris dourada daquele ser. Seu corpo se arrepiava por completo e também não conseguia desviar o olhar. Sabe-se lá quanto tempo seus olhos ficaram fixos no do outro.

O transe foi interrompido por alguém que chamava o homem.

- PORRA, Benício! - disse o outro cara que chegava assustado. - Como é que tu desce do carro e corre assim? Tô te caçando há horas!

- Henriiiiiiiii - respondeu o homem desfalecendo e sendo amparado pelo recém chegado. - liga pra Olívia, diz pra ela que eu não vou mais pro carnaval em Salvador! Diz pra ela voltar! - E do nada o cara chorava copiosamente aparentando estar muito bêbado.

- Desculpa aí mano. - disse o outro playboy, entregando a Wallace uma soma de dinheiro equivalente a três meses em diárias da faxina que sua mãe fazia. - volta pra casa tu também, você é muito novo pra estar na rua a essas horas.

Wallace nunca tinha pego em tanto dinheiro na vida e isso o assombrava.

Relutante, entrou no táxi que o cara pediu e voltou para casa. No dia seguinte, para sua surpresa, haviam recebido um presente de um dos empregadores de sua mãe, um computador. Não era novo, mas ligava e tinha programas instalados.

Que dahora!

Outro dia, quando foi ajudar a mãe em uma faxina, descobriu o que queria fazer da vida ao ver o dono da casa trabalhando. Não conseguia desgrudar os olhos dos códigos na tela do computador que o cara digitava. Parecia tão fácil. Achou um destino para o dinheiro que guardava para uma eventual emergência, ia aprender programação.

Agora, no alto de seus vinte e dois anos, sob o codinome Hórus, Wallace fazia a vida como hacker e não havia segredo que não fosse capaz de descobrir. Mas fora da rede, continuava enfrentando o preconceito entre os familiares e conhecidos. Tudo o que mais queria era deixar as quebradas, tinha dinheiro o bastante pra isso, mas não queria deixar sua mãe para trás e ela não queria sair de lá. Ela não aceitava seu dinheiro. Na cabeça dela era inconcebível a forma como o filho fazia dinheiro, acreditava piamente que o dinheiro vinha de prostituição ou drogas.

Terra Proibida - EssênciaTempat cerita menjadi hidup. Temukan sekarang