[45 anos atrás] A Alma à venda

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A chegada dos Del Toro em Diamantina em meados da década de setenta foi um evento extraordinário. Os irmãos traziam consigo uma avalanche de modernidade e progresso para toda a região.

Foram motivo de manchetes nos principais jornais da cidade, não só pela empresa que se fundia aos negócios do prefeito, o coronel Moraes, mas também, pela boa aparência que o trio possuía e, claro, suas especulações amorosas.

A beleza de Santiago era irresistível a, pelo menos, metade das moças da cidade. Já a outra metade se encantava por Alejandro, com sua voz e charme inigualáveis.

Diego por sua vez preferia manter-se anônimo. Tudo o que as pessoas sabiam, é que ele era o homem por trás dos negócios, porém poucos eram os privilegiados em vê-lo. Geralmente essas pessoas eram membros da alta sociedade e o que se falava sobre ele, sem dúvidas criavam diversas histórias no imaginário coletivo. Algumas eram absurdamente tão verdadeiras que pareciam mentira e outras, tão fantásticas que de tanto serem repetidas pelas pessoas tornavam-se verdade.

— Dizem que se vender a sua arlma pros Del Toro, ocê fica podi de rico. - comentou um senhor dentro do Tiborna, famoso bar da cidade, enquanto era servido de uma cerveja em um tradicional copo americano.

— Uai? acha mesmo que os homi qué comprar alma penada que nem a nossa? - dizia um dos garçons rindo.

— Mais provável eles dá ocês pros cachorro cumê. - dizia outro homem enquanto virava uma cachaça de alambique.

Raul Speltri limpava uma das mesas do bar sem dar importância ao assunto dos homens que conversavam. No alto de seus dezenove anos, tudo o que ele queria era juntar dinheiro o suficiente para conseguir ir embora para a capital quando se formasse e se casar com a garota que amava, Elizabeth Detzel. Seus dias eram cansativos, mas antes que o galo cantasse estava de pé. Intercalava seu trabalho na feira carregando carga com os estudos da faculdade de engenharia, e também, com seus turnos no bar.

Era um dos poucos que não tinha se deslumbrado com os forasteiros. Qualquer um que tivesse ligação com o ignóbil Coronel Moraes, não era digno de seu respeito.

Corria na cidade o boato de que Raul era o filho bastardo do Coronel. 

Quando criança ele sonhava em conhecer o pai, sonho que foi completamente destruído quando foi humilhado em praça pública pelo homem mais poderoso da cidade, enquanto ele, era apenas um pobre engraxate tentando garantir o próprio sustento. Não tinha feito nada para merecer tal tratamento.

Os mais velhos diziam que quando o coronel era jovem e pobre, morria de amores por sua mãe, mas quando ela engravidou, ele a enxotou tal qual um cão sarnento, e que quando ele começou a ganhar dinheiro de verdade, se casou com uma moça de família, que era herdeira de um dos grandes fazendeiros da região e deixou mãe e filho na mais absoluta miséria e vergonha.

Uma das ambições que Raul tinha na vida era se tornar doutor. Queria provar a todos que seria tão ou mais poderoso que o mesquinho coronel. Mas por onde começar? E como?

Em uma noite chuvosa, enquanto ponderava debaixo de uma marquise, sobre como se molhar menos ao voltar para casa, que ficava no entorno da cidade em um dos bairros pobres, um luxuoso Cadillac Deville 75 preto parou ao seu lado. No volante, embora nunca o tivesse visto pessoalmente, sabia exatamente quem era, Diego Del Toro.

— Entre rapaz. Te darei uma carona.

— Agradecido, mas não precisa não senhor. - lembrou das conversas que ouvira mais cedo no bar e virar comida de cachorro estava fora de cogitação. - Muito obrigado miesmo, a chuva logo vai passar.

Terra Proibida - EssênciaWhere stories live. Discover now