Desespero

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Ver meu amigo naquela maldita cama de hospital era sempre uma merda. Eu pensava que com o tempo, iria me habituar a essa cena. Porém, nunca consegui me acostumar com isso. Seu tom de pele ainda mais pálido, os fios conectados em sua veia, o bipe irritante e agonizante da máquina que media seus batimentos cardíacos... tudo me deixava numa ansiedade terrível. 

Me lembro das primeiras vezes em que ele veio ser internado as pressas, no quanto eu chorei no colo de Marta e orei para que Nicolas não morresse. Me recordo da agonia de passar dias ali, as noites mal dormidas, os turnos malucos que Marta tentava equilibrar, a quantidade de cafeína ingerida e de como era difícil ir para escola e suportar todos os olhares de "coitadinha dela e do seu amigo". 

Era horrível tentar seguir com a minha rotina, pois nada me afastava da minha angústia. Então me lembro de implorar a Marta para ficar com ele nos horários que ela não podia, o auxiliando com tudo que conseguia e o deixando a par dos assuntos escolares. Agora, mesmo Nicolas sendo maior de idade, fazemos de tudo para não deixá-lo sozinho.

Aproximei-me hesitante, erguendo um copo de café que comprei em uma lanchonete próxima ao hospital, onde o café não era tão terrível assim, na direção de Marta e avisei:

- A senhora precisa se manter alimentada ou vai precisar de um médico também! Trouxe uma barrinha de cereal do seu sabor favorito: banana e canela.

- Eu já tomei café - ela afirmou - Mas obrigada pelo carinho querida.

- Já estivemos nessa sala por tempo suficiente para saber que você nunca come nada em momentos assim – mantive o copo erguido - E sabemos o que vai acontecer também: não vou parar de insistir. 

- Não importa querida – Marta fechou os olhos – Nada mais importa.

Eu entendia parte do desespero dela, eu mesma só tinha comido algo por que não fazia ideia do que tinha acontecido. Foi tudo tão rápido, chegamos tão bem em casa e agora estávamos aqui, observando seu corpo frágil naquela cama. Mesmo assim, a mulher segurou o copo e deu um pequeno gole. Sentei ao seu lado e observei Nicolas em seu sono profundo.

Eu me sentia quebrada, completamente sem forças. Nossa dança, nossos beijos, nosso momento parecia ter sido a tanto tempo... Me encolhi, abraçando meus joelhos enquanto tentava me apegar a qualquer centelha de esperança. Marta tocou meu ombro e observou:

- Você anda passando tempo demais com o meu filho.

- Ele é meu melhor amigo – abri um pequeno sorriso – Eu o amo demais.

- Acho que esse amor esta um pouco além da amizade – ela rebateu - Ontem quando chegou da festa chique de vocês ele estava radiante, até dançou comigo na sala! Se eu não o conhecesse tão bem até acreditaria em você.

Passei alguns minutos absorvendo as suas palavras, me sentindo um pouquinho melhor por saber que ontem ele tinha ficado feliz. Sim, tínhamos nos beijado ontem e foi incrível, só que eu ainda não tinha pensado em algo a mais que uma amizade. Na realidade, não tive tempo. O universo gostou de me sacanear, entregando um momento perfeito para depois roubá-lo. Por fim, me inclinei na cadeira e fui sincera:

- Tem razão.

- Ah querida – Marta não estava exatamente feliz.

- Sei que não sou a pessoa ideal para o seu filho – acrescentei – Mas não escolhi me apaixonar por ele. Por muito tempo eu pensei que só seríamos bons amigos. Mas Nicolas é incrível! Ele domina minha mente e meu coração de uma forma que... Bem, eu me apaixonei. Foram tantos anos ao lado dele, dividindo os melhores momentos que eu simplesmente percebi que não quero outra pessoa desempenhando esse papel em minha vida.

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