Capítulo 13

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Apenas um jovem com o pavio curto
Eu estava tenso, queria me soltar
Eu sonhava com coisas maiores
E queria deixar minha vida pra trás

Não alguém que fazia o que me mandavam, não era um seguidor
Entre na fila, se adeque
Sente-se no corredor, pegue sua senha
Eu era o relâmpago antes do trovão- Thunder, Imagine Dragons

Ter a ajuda dos meninos foi o fator decisivo para o meu sucesso, e depois que Jabari salvou minha pele encontrando a matéria prima que eu precisava para executar meus tingimentos, eu fiquei menos obcecada e pude aproveitar mais sua companhia. Pedi que ele e Kareem fossem meus modelos, e eles também encontraram alguém grande o bastante para representar Danso. Depois que tirei as medidas iniciais do amigo de Jabari, Zuber, o dispensei, pois queria privacidade com meus amigos.

Era incrível como a presença deles me deixava mais leve. Jabari com piadinhas, e Kareem com comentários ácidos sempre muito bem colocados. Nem sempre Kareem podia ficar comigo por todo o tempo das minhas sessões, mas Jabari estava sempre presente, cada vez mais, parecia que era meu tutor novamente. Talvez por estar sentindo a iminência da partida ele também quisesse aproveitar todo tempo que nos restava.

Percebi com o passar do tempo que Jabari voltou a ficar inseguro, quanto mais ficava ao meu redor, menos queria a presença de Kareem. Sempre que o outro aparecia, e eu o cumprimentava efusivamente, em seguida Jabari ficava com a cara fechada, e as vezes até saia de perto disfarçadamente, como se eu não fosse sentir sua falta no exato momento que passasse pela porta.

Percebi que ele começou a perder peso, a ter olheiras profundas, e lembrei que eram sinais presentes em Danso no fim do quinto ciclo também. Fiquei preocupada que ao ficar muito tempo comigo, ele tivesse se atrasado em suas sessões e agora precisava gastar muito mais energia para recuperar o tempo perdido. Não comentei nada com Kareem, achava que era algo que deveria tratar apenas com Jabari, mas quando podia falar com ele, ele desconversava, e quando pensava que iriamos conseguir falar, Kareem aparecia e Jabari ia embora.

Um dia assim que ele chegou perto, e se sentou na mesa onde eu estava me alimentando, aproveitei para tratar desse assunto.

- Jabari precisamos conversar, e dessa vez você não me enrola.

- Eu nunca te enrolo estrelinha. – Ele sorriu debochado.

- Tudo bem, mas por que você sai quando Kareem chega?

- Porque ele sabe que tenho pouco mais de seis meses com você antes de ir embora, e mesmo assim ele insiste em estar perto quando quero estar só com você. E além do mais assim que ele chega você não me dá atenção mesmo, então pra quê ficar?

- Jabari, isso não é verdade. Eu sempre noto quando você sai. E Kareem tem vindo bem menos aqui justamente para não ocupar meu tempo. Ele sabe que logo você vai embora e como eu vou ficar destruída.

Jabari está com a cabeça baixa, respirando em haustos. Sei que é difícil para ele, mas precisamos encontrar uma solução.

- Você não o chamou de irmão aquela noite no lago? O que mudou?

- Ayla, eu amo o Kareem. Amo que ele seja esse garoto de humor ácido, seja sempre tão gentil e bem-disposto a ajudar seja lá no que for. Ele é muito leal, e eu aprecio realmente cada uma de suas qualidades. E não gosto de me sentir assim perto dele. Não gosto de sentir que estou competindo com ele por sua atenção. Eu sinto muito de verdade. Mas a iminência da minha partida tem feito a voz na minha mente ficar insana. Eu acho que estou ficando louco.

- Jabari, vamos ser honestos está bem? – esperei que ele concordasse com um aceno de cabeça e então continuei. – Minha amizade com você e com Kareem não tem diferença. Assim como você gosta de atenção, ele também gosta. E vocês evoluíram tanto já na amizade de vocês, que sinceramente é desleal da sua parte cogitar competir com ele seja lá por qual assunto for.

- Eu sei estrelinha, mas não consigo controlar. Você tem direito a ter seus amigos, e eu aprendi a gostar de ver você com ele porque ele sempre põe um sorriso no seu rosto.

- O que você acha de termos algo só nosso? Algum símbolo da nossa amizade, que nós dois tenhamos e que quando a voz na sua cabeça começar a te perturbar, sirva de lembrete de que você tem um espaço na minha vida e no meu coração que é só seu. Acha que ajudaria?

- Acho sim. Vou pensar em algo. Obrigado por compreender estrelinha, e por não brigar comigo.

Nos abraçamos e assim senti que finalmente esse problema seria superado.

***

Jabari

Depois da conversa franca que Ayla e eu tivemos, fui falar com Kareem. Ele já sabia da história há tempos. Sempre foi ele que me ajudou a pôr as coisas em perspectiva sobre meus ciúmes de Ayla. Sim, porque agora eu já sabia nomear esse sentimento egoísta. E eu detestava como esse sentimento me deixava inseguro.

Fui até o complexo onde Kareem tinha sessões de tecnologia, que era a função que ele tinha escolhido para exercer assim que saísse da casa conselheira. Avistei ele em um módulo de estudo da biblioteca, que se parecia com um ninho de tecelão. Sentei-me no chão em sua frente, me estiquei para puxar o livro que ele lia, e disse:

- Oi irmão. – Eu estava me sentindo bem hipócrita, mas era isso. Ele só virou os olhos para mim e fazendo cara de tédio disse:

- Não precisa se desculpar, eu já te conheço. Nem me ofendo mais.

- Que bom então, podemos nos polpar dessa parte chata que eu me desculpo, você compreende, nós nos abraçamos e você chora no meu ombro sobre o quanto detesta brigar comigo porque sou seu melhor amigo.

- Eu choro né? Sei. Fala logo o que você veio fazer aqui, além de atrapalhar meus estudos. – Ele disse cruzando os braços. Ignorei sua atitude porque era muito sério o que eu precisava dele.

- Kareem, eu e Ayla combinamos de ter um símbolo nosso, algum objeto que sirva para me lembrar o quanto meus ciúmes são patético e fazem mal a você e a ela. Mas não sei o que poderia servir para esse fim. Tem alguma ideia?

- Uau é algo bem específico, deixe eu pensar um pouco... Bom pode ser algo que ela leve com ela aonde ela for, igual meu bracelete. Eu o uso desde que ganhei de Danso. Quase não tem mais tira de couro para o ajuste.

- Algo que ela use no punho? – Pensei em voz alta.

- Talvez nos dedos? – Sugeriu Kareem. E eu gostei da ideia. Um anel seria ótimo para o meu propósito.

- Ótimo, mas como vou fazer um anel?

- Precisa usar os materiais que tiverem disponíveis na oficina.

- E o que tem lá? Agora só consigo pensar nos tecidos e corantes que Ayla tem usado.

- Bom, tem o pessoal da marcenaria, na oficina deles tem madeira, couro, palha, resina, sei lá cara, procura lá, pede ajuda pros marmanjos.

- Vou fazer isso, talvez um anel de madeira...- comecei a planejar, e Kareem terminou meu pensamento.

- Madeira carbonizada é a sua cara Jabari. Ela vai pirar.

Já podia ver os olhos cor de âmbar brilhando emocionados. Ayla é do tipo de pessoa que se receber uma semente para plantar já fica toda feliz. Se você disser que passou por uma arvore que o fez lembrar dela, e que trouxe a semente da dita árvore para que ela plante, só por causa disso, ela já fica efusiva. Tem gostos muito simples minha garota. Até se for uma árvore que vai demorar anos para ela ver o resultado que te fez pensar nela, mesmo assim ela amaria o presente.

Dei um pulo e fiquei de pé, já sabia exatamente o que fazer para que esse anel nos representasse perfeitamente.

- Kareem, cuida dela por mim, vou precisar me ausentar uns dias para fazer a surpresa.

- Não precisa nem pedir seu bocó. Eu sempre cuido daquela chorona.

Batemos os punhos em despedida, e eu fui atras dos materiais que precisaria para fazer o anel da minha prometida.

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