|CAPÍTULO 09|

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Ela considera exigir que ele pare
de agir como um covarde,

e que ele enfrente como ela
tem que enfrentar.

Porque se ele se for, ela será
a única forasteira que resta.

Breath Mints e Battle Scars

PRESENTE | ANNA LIS

DURANTE NOSSO SÉTIMO ANO, em uma noite fria de inverno, Lucas Graham saltou minha janela pela primeira vez. Sua aparição foi tão súbita que deixei o livro cair aos meus pés e um gritinho escapar por meus lábios. Mas com um reflexo fora do comum, o garoto se jogou sobre mim e abafou o som com a palma de sua mão ― terrivelmente gelada ― antes que sua localização fosse entregue para os meus pais dormindo no andar de cima.

― Só preciso de um lugar para ficar por algumas horas. ― murmurou baixinho, o desespero puro e amargo consumindo suas palavras enquanto isso. ― Apenas me deixe ficar. E, por favor, por favor, me ajude a esquecer.

Senti as lágrimas começando a pinicarem meus olhos ao notar seus dedos tremendo ligeiramente contra a minha bochecha. Lucas nunca havia parecido tão assustado e exausto como naquele momento. Sua pele translúcida brilhando contra a luz da lua era uma visão fantasmagórica ao mesmo tempo que dolorida.

― Como? ― Me ouvi perguntar.

O rapaz se afastou para apanhar do chão o objeto que, minutos antes, eu havia deixado cair. E erguendo o livro na altura do peito, o título virado propositalmente em minha direção, seus olhos voltaram a se chocar contra os meus. Ele sorriu fracamente ao pedir:

― Leia para mim, Lis.

Como se meu corpo estivesse no automático, apenas comecei a jogar algumas almofadas sobre o meu tapete felpudo, esperando ansiosamente meu melhor amigo se acomodar ao meu lado. Quando assim aconteceu, voltei a abrir o livro no lugar exato onde havia sido interrompida, e passei a ler, entre sussurros, a chegada de Harry Potter em Hogwarts para seu primeiro ano. Lucas ouviu tudo atentamente, abrindo a boca só para reclamar sobre como o personagem principal era um idiota facilmente manipulado pelo "pobretão ruivo", e que a sonserina, sem dúvidas, era mil vezes melhor que a grifinória. Enquanto isso, me limitei a sorrir divertida, sabendo estar confraternizando com o inimigo. Afinal, meu apreço pela casa dos leões era irrevogável.

E esse foi o início de tudo.

Quando as coisas estavam muito ruins em casa, meu melhor amigo se escondia na minha para passar pelo que chamávamos de "noites sombrias", honrando nosso ritual sagrado de reler HP todas as vezes. Embora a preocupação de sermos pegos, congelasse meus ossos, e o medo de que algo lhe ocorresse durante uma de suas fugas secretas, destruísse meu sistema nervoso, a presença dele não era um incômodo. A amante de livros que habitava em mim, amava que o garoto fosse tão fã de Harry Potter quanto eu (mesmo que do outro lado da força). E a garota solitária amava saber que era alguém em quem ele confiava para dividir seus momentos difíceis.

O grande problema era que ao invés das coisas melhorarem com o tempo, elas estavam ficando piores. Sempre que Graham surgia tarde da noite em minha janela precisando de mais uma sessão de distração, sua pele aparentava um novo tom de pálido e seus olhos um tom mais frio de verde. Era desesperador vê-lo se afogando em si mesmo, e não poder fazer nada para consertar isso. Somente aliviar.

Aliviar... como eu odiava essa palavra.

De qualquer modo, seria difícil fazer algo sem nenhuma informação relevante do problema, visto que nunca falávamos profundamente sobre ele. Lucas nunca conseguiu. No início, quando ainda insistíamos, seus lábios tremiam, os olhos brilhavam com lágrimas grossas ameaçando manchar suas bochechas, e seu pomo de adão se contorcia furiosamente na intenção de dizer algo, qualquer mísera palavra, mas nada nunca veio. Logo, tudo o que me restou fazer foi investir minhas energias em garantias de que meus pais nunca soubessem sobre suas visitas noturnas. Todas as noites antes de dormir, sem exceções, eu passava a chave na porta do quarto, verificava se a janela estava realmente destrancada e deixava o kit de emergência preparado sobre a escrivaninha. Primeiro, um par de fones de ouvidos para ouvirmos audiobooks, já que ligar o mínimo freixo de luz era arriscado e tentar ler no escuro bastante irritante. Segundo, um quadro negro para que pudéssemos ao máximo evitar fazer algum barulho desnecessário ao se comunicar. E por último, mas não menos importante, uma tigela do seu doce preferido, jujubas.

When We FallOnde as histórias ganham vida. Descobre agora