XIV: Conversa de senhoritas solteiras

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Severino e Cordélia desceram as escadas da casa enquanto ela fechava a bolsa de mão. 

— Te falta a boina. — o irmão informou ao trancar a porta. 

A garota suspirou e voltou a abrir a bolsa. 

— Eu já disse que odeio uniforme? — reclamou mais uma vez de uma outra regra da sociedade magreense.

— Se fosse para Greta também teria que usar uniforme. 

— Esqueci lá em cima. — destrancou a porta. — Mas em Greta usar magia é uma exigência e não um crime. Leis ridículas!

Severino, o irmão, fazia sinal para ela se apressar. 

Cordélia vinha correndo as escadas segurando a boina na cabeça. Via Martin conversando com Severino. 

— Ah, você sempre a leva? — apontou à menina. — Bom dia, senhorita Bastos. 

— Evite pegar lepra, senhor Mendes. — negava deixar-se tocar por ele. — Papai disse que as pessoas julgam quando uma mocinha solteira sai sozinha tão cedo. Ou demasiadamente tarde. 

— E convém ser da vossa família. 

— Exato. Talvez não percebam que mocinhas solteiras tenham pernas como qualquer senhora casada. 

— E que pernas. — molhou os lábios olhando para a menina. 

Severino o olhou feio e deu uma cotovelada. 

— Bom, queria eu me oferecer para vos acompanhar, mas creio que meus assuntos com vosso pai são de força maior. 

— Boa sorte com isso, já que nosso pai está mal amanhecido. — Severino riu. 

— Vamos logo ou eu vou chegar atrasada? — levantou a sobrancelha de forma exigente com seu tom irônico. 

— Nesse caso, eu vos acompanho e na volta falo com o senhor Bastos. — sorriu e foi andando com a dupla. 

— Se andarem mais depressa, talvez eu consiga chegar a tempo. — resmungou vendo a entrada da escola ficar vazia. 

Ela começava a correr, mas Severino a puxava de repente. O rapaz do leite na bicicleta tocou a buzina assustado e pediu desculpas uma vez antes de continuar sua distribuição. 

— Eu odeio esta cidade. — murmurou ao irmão. — Por que não há mercados e cada um vai comprar seu leite? 

— Há o mercado, na rua da praia. — Martin defendeu. 

— Aquilo mais é um pavilhão que usam para colocar peixe passado porque não há gelo suficiente e frutas aquecidas pelo sol. — atravessou a rua. — Não precisa vir me buscar. — olhou o irmão. — E nem vir atrás de mim quando vir Josefina. 

Ele a olhava convencido sempre com seu jeito engraçado e de carisma em exagero. Martin sorriu porque lhe gostava a forma que Cordélia falava, o fazia lembrar de como era em sua cidade e não nesta era de trevas em que Magris estava presa. 

Cordélia correu pelos corredores da escola e parou à frente de sua sala para retomar o fôlego e abriu a porta da classe. 

Não havia professor. As meninas estavam conversando entre si e outras distrações. 

A jovem andou até seu lugar no fim da sala e colocou sua bolsa atrás, nos cabides e retirou a boina. Quando voltou, Josefina estava sentada em cima de sua mesa e Gertrudes se sentava em sua cadeira. 

— Está atrasada. 

— Sim, meu irmão é um babaca. — suspirou. 

— Ele é agradável. — Josefina sorriu. 

Magris A história de uma cidadeWhere stories live. Discover now