Capítulo 29

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Ele não conseguia entender a própria atitude para estar aceitando prestar-se aquele papel. Deveria era ir embora e não estar ali perdendo seu tempo em ouvir as lamentações de uma adolescente com problemas de autoestima. Deveria é se levantar daquele banco de praça dando uma desculpa qualquer e ir embora. Não tinha qualquer obrigação em amparar e muito menos aconselhar, então por que continuava ali, sentado ao lado dela, que continuava chorando e enxugando as lágrimas que teimavam em cair de seus olhos?

Poderia ter se levantado depois daquele tombo vergonhoso que ela o fizera sofrer, mas quando tencionou se levantar dando –lhe uma bronca, percebeu não apenas a garota aos prantos dizendo que era mesmo uma estúpida, mas também as pessoas que estavam nas proximidades (como o funcionário que limpava a mesa na entrada do bistrô, a idosa na calçada prestes a atravessar a rua, os treinadores que caminhavam por ali e a mulher com olhar inquisidor e celular na mão prestes a registrar qualquer coisa). Se simplesmente desse as costas e ignorasse a garota no chão, sem dúvidas uma ou algumas pessoas ali iriam abordá-lo e fazer algum estardalhaço. E o que Basho sempre queria tentar evitar, era de atrair o mínimo de atenção possível, principalmente de pessoas aleatórias.
De modo que conteve um suspiro de tédio e se ajoelhou ao lado da garota que continuava chorando, cabisbaixa.

— Ei, o que você tem? – sussurrou, mas não obteve resposta. - Vamos, me diga.
Crystal continuava chorando e isso fez Basho segurar o queixo da garota, erguendo o rosto dela para que o olhasse.
— Recomponha-se. – ordenou. – Não pode ficar chorando como uma derrotada no meio da calçada!

Crystal estremeceu e conteve um soluçar. Embora a voz de Basho fosse baixa e calma, havia uma suavidade forçada nela e isso lhe pareceu intimidador. Limpou as lágrimas e o nariz desajeitadamente com a manga da jaqueta e percebeu que pessoas desconhecidas estavam observando.
E que péssimo julgamento deveriam estar tendo sobre ela! Exatamente como Morty, Agatha, Gary e até mesmo Alice deveriam estar fazendo. E não poderia culpá-los, pois realmente estava parecendo a autêntica imagem da derrota.

Notou que Basho já estava de pé e lhe estendia a mão e ela achou prudente aceitar, se colocando também de pé. Percebeu que ele a olhava e baixou o rosto, envergonhada.
— E-eu... – tentou dizer, mesmo não sabendo o que falar. – Eu sinto...
— Vamos sair daqui. Já chamou atenção demais.

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E agora estava ali, sentado, esperando a garota parar de chorar enquanto inutilmente enxugava as lágrimas e o nariz com um lenço. Basho conteve uma careta de desagrado. E agora por ter sido educado, tinha de ouvir as lamúrias da garota. Mas ficar naquele silêncio era irritante.
— O que aconteceu para estar assim?
Aquela pergunta fez o coração de Crystal acelerar. Tudo agora voltava á sua mente, desde as provocações da mestra Agatha, o olhar intrigado de Alice e seus amigos no momento que havia desistido da batalha e fugido do ginásio e a própria sensação de fracasso que lhe dominava. E além disso, havia ainda os fracassos e dores do passado, que acreditava que não mais lhe afetavam com a intensidade de antes mas que afetavam, sim. Era mesmo uma tola para acreditar que tinha superado o que quer que fosse.

— É tanta coisa... – murmurou. – Que eu nem sei mais por onde começar.
Basho cruzou os braços, olhando para o movimento dos comércios do outro lado da rua.
— Pode começar pelo motivo que a fez correr pelas ruas aos prantos feito uma destrambelhada.
Crystal passou a mão pelo rosto. Era tão ruim ter que pensar naquilo...mas sentia que, se não o fizesse, ia sufocar.

— Eu...você lembra...quando nos conhecemos e me perguntou se eu era treinadora que pretendia desafiar o líder do ginásio daqui...
— Sim. "Eu não esqueço as coisas." - Deixe-me adivinhar...você perdeu a batalha.
— A-antes fosse... – Crystal torceu o lenço em suas mãos com força. – Eu...no momento de começar a batalha eu...fugi.

A Lenda de CristalOnde histórias criam vida. Descubra agora