Contagem Regressiva - 2

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E então aqui estamos nós, sozinhos na cidade que não conhecemos direito e nunca dorme.

No céu, as estrelas brilham com tanta intensidade que não achei que seria possível em um lugar tão iluminado. Mas, na Terra, não há um carro sequer que ouse passar nessa esquina de Palermo Soho. Já é quase meia-noite e eu começo a me sentir ligeiramente frustrada.

— Está com frio? — Petri pergunta, já passando um braço ao redor dos meus ombros.

Mas ele logo se afasta e corre alguns passos na minha frente. Ele então faz sinal para um carro amarelo e preto e o taxi rapidamente para em sua frente.

O motorista, simpático e atento, logo reconhece que não somos argentinos e inicia a conversa perguntando de onde somos.

— Finlândia. — Petri responde.

— Brasil.

— Dios mío! — O motorista solta uma risada alta. — De lugares tão longe! Vocês se conheceram aqui mesmo em Buenos Aires?

— Acabamos de nos conhecer. — Petri sorri triunfante.

É incrível que mesmo sendo de um lugar tão diferente, ele comporte igual a qualquer um dos meus amigos brasileiros.

— O senhor consegue chegar até Porto Madero? — Pergunto, já temendo a resposta.

— O Porto? Está brincando, né menina?

— Não.

E a frustração é evidente em meu rosto. Eu quero tanto ir para o porto para ver a queima de fogos que quase deixo uma lágrima cair.

Conforme as ruas vão avançando até o centro, o motorista vai contando as tantas milongas e casas de shows de tango espalhadas pela cidade. E, como todo bom argentino, é claro que trocou o assunto para o futebol.

Eu odeio futebol. Quer dizer, sou brasileira né? Gosto de futebol só na Copa do Mundo, então apenas deixo que ele conte vantagens e mais vantagens sobre o Maradona e o Boca Juniors, seu time preferido.

Mas era bom demais pra ser verdade e ele logo muda de assunto novamente. A bola da vez me faz querer sumir do taxi, pular pra fora dele em movimento mesmo.

— Você sabe né... — Ele se dirige a mim. — Ele mora lá em cima, é muito frio... E você mora aqui embaixo, no calor... Ele é o gelo e você o fogo... — Então ele se volta para Petri. — E essa noite, meu amigo, você vai se derreter todinho.

Eu quero morrer. Real oficial. Minha vida acabou de acabar.

Petri, ao meu lado, só ri do motorista e da minha cara vermelha igual tomate maduro.

Percebo que o carro para quando o motorista grita para alguém do lado de fora.

— Mocinha! Ainda há ingressos disponíveis? — Ele pergunta. Eu tenho um casal aqui atrás que querem ver a queima de fogos.

— 300 pesos.

— E aí? – O motorista pergunta para nós.

— Topamos.

É Petri quem fala, já sacando a carteira para pagar o taxista e os ingressos.

— Lembre-se, meu amigo! — O motorista grita ao manobrar para ir embora. — Não há nada mais sensual nesse mundo do que uma brasileira sussurrando português no pé do ouvido!

E, se eu não morri antes, é agora que caio dura. Certeza.

Petri está rindo. Não sei se de mim ou o que, mas ele está rindo.


Nossos 12 mesesWhere stories live. Discover now