Novembro de Novo - 4

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E então fevereiro chegou.

Muita coisa havia acontecido:

Faculdade havia começado com toda a intensidade possível. Guilherme realmente raspou a cabeça. Eu já estava iniciando as pesquisas sobre meu intercambio. Guilherme havia começado a namorar. Eu havia conhecido algumas pessoas novas e ido a algumas festas e, durante todo o mês, eu não troquei uma palavra com Guilherme.

Por algum motivo eu havia achado que nossa tradição havia sido esquecida.

Confesso que, após eu ver o status de namoro de Guilherme no perfil que ele mantinha na internet, eu mesmo havia me obrigado a esquecer nossa tradição.

Eu não estava chocada por ele ter começado a namorar, isso já havia acontecido algumas vezes no colégio. As garotas eram sempre muito bonitas, mas nunca permaneciam.

- Eu acho que ela é da faculdade dele – disse a Cris um final de semana antes da ultima semana do mês.

Olhei a foto que ela me mostrava na tela do computador.

Guilherme estava abraçado a uma garota de cabelos loiros e olhos verdes cheios de rímel. Deviam estar em uma festa ou algo assim.

- Bonita – comentei com sinceridade, balançando a cabeça afirmativamente.

Eu não sabia exatamente o que estava sentindo. Não era ciúmes, disso eu tinha certeza, mas eu também não estava feliz.

Desconforto. Era isso. Eu sentia um desconforto que eu não sabia muito bem de onde vinha.

- E aí? Tudo certo pra vocês se verem esse mês? – Cris perguntou, agora fuçando o perfil da namorada de Guilherme.

- Não sei – respondi, me afastando. Eu não sabia mesmo.

- Eu continuo achando estranha toda essa história de vocês se encontrarem uma vez por mês... – ela riu, ainda distraída na tela do computador – Não faz sentido, vocês nem eram amigos.

- Não faz mesmo – concordei. Deitei na cama e bocejei – Mas sei lá... Não precisa fazer sentido, precisa?

- Sei lá... – ela se voltou para mim, que fitava o teto, pensativa – Você gosta dele ou coisa do tipo?

A pergunta ressoou em meu cérebro e houve uma batida mais forte em meu peito, mas eu ri, incrédula.

Gostar do Guilherme? Jamais!

- Com certeza – respondi com sarcasmo, me voltando para ela, que havia girado a cadeira para ouvir minha resposta – Estou até sofrendo, não vê?!

Cris fez uma careta e revirou os olhos.

- Cuidado, Mari. Você é difícil, eu sei... E talvez seja tão difícil, que engana a si mesma com medo de realmente sentir algo.

- Não pira, Cris... – falei num suspiro de preguiça.

Gostar do Guilherme?

Balancei a cabeça negativamente.

Besteira!




28.02.2013

Para Guilherme estava tudo certo desde o dia que nos vimos em janeiro. Ele não teve dúvidas de que viria para nosso encontro mensal, mas ficou surpreso ao perceber que eu tinha.

Era quinta-feira. Eu decidi faltar aula e ele saiu no segundo período da sua aula para poder viajar.

Nós não havíamos pensado nesses por menores da nossa tradição e foi decidido que se dia 30 fosse dia de semana e não tivesse nada urgente para fazermos na faculdade, faltaríamos.

Havíamos nos falado um dia antes. Ele ligou, confirmou que viria. Disse que chegaria ainda durante o dia e passaria um pouco da tarde com a galera antes de me encontrar.

- Nos vemos no Pub do Brownie as 19hrs – eu falei, me despedindo. Ele concordou.

Quando o vi, sentado na mesma mesa que sentamos no mês anterior, senti um certo alívio. Ele não havia mudado.

Me recebeu com um sorriso tão grande que me senti sorrir tanto quanto ele. Iniciamos nossa conversa já falando sobre o namoro.

- Você está apaixonado? – perguntei?

- Acho que sim – ele soltou um meio sorriso que não me convenceu.

- Não é só transa então? – caçoei e ele riu apenas, jogando a cabeça para trás.

Aliás, ele careca não era tão mal assim.

E a noite passou entre muita conversa, dois brownies, risos, refrigerante, discussões sobre assuntos polemicamente inúteis e batata frita.

Eu me sentia leve. Perceber que nada havia mudado entre nós depois do início do namoro do Guilherme, por algum motivo, me deixava leve e mais relaxada.

Dessa vez, ele foi ele quem falou mais. Parecia empolgado a um extremo que eu ainda não conhecia. Gesticulava, falava da faculdade, das pessoas que conheceu, do trote, de como raspou a cabeça.

- Ficou bom – falei simplesmente, quando ele contou toda a história do corte do cabelo.

Guilherme sorriu, me fitando e passou a mão pela cabeça.

- Gostou mesmo?

Eu ri e levei um pedaço de brownie a boca.

- Não vou repetir, moço...

E, por mais estranho que pudesse parecer, a maior novidade do mês, foi a menos falada: o namoro. O assunto não foi evitado, mas só não surgiu mais na conversa, como se não fosse interessante o suficiente para estar em pauta.

- Ah! Tenho uma coisa pra você! – Guilherme falou de repente, no meio de um assunto aleatório, muito empolgado. Enfiou a mão no bolso de trás da calça, ainda olhando para mim, e tirou de lá um livro pequeno – Pra você!

Demorei alguns segundos para entender o que era o livro que ele me estendia e quando entendi, ri alto, agradavelmente surpresa. Era um guia de bolso de espanhol e catalão.

Segurei o guia e o folheei. Eu não conseguia segurar o sorriso bobo em meu rosto. Eu me sentia levemente eufórica por dentro e um tanto radiante por fora.

- Teve uma feira de livros semana passada na faculdade e tinha esses guias de bolso de várias línguas – ele foi falando, me observando analisar o presente que ele havia me dado – Estava barato pra caramba e quando vi, lembrei de você! Aí comprei.

Voltei a olhar para Guilherme, sem saber muito bem o que falar.

Eu estava imensamente agradecida. Não por causa do presente, mas sim porque ele, sem saber, foi o primeiro a realmente levar a sério minha vontade de fazer intercambio.

- Cara... – falei num suspiro de riso e voltei a rir rapidamente, sem palavras.

Então nos fitamos. Lá estava aquele olhar brilhante e aquele sorriso displicente com um pingo de prepotência. Ele sabia o que tinha feito e gostava de ver o efeito disso em mim.

Balancei a cabeça devagar, segurando um sorriso nos lábios, mas que não se escondia nos olhos.

- Obrigada – agradeci devagar e baixo.

- De nada, chica. – falou com um sotaque engraçado.

- Hmmm... Mas que espanhol fluente! – brinquei, divertida.

- Pero que si, pero que no – ele deu de ombros e riu.

A noite continuou no mesmo humor e, quando terminou, já estávamos esperando pelo próximo mês, que chegou sem que eu tivesse tempo de entender algumas coisas que me atormentavam. 

Nossos 12 mesesWhere stories live. Discover now