Verdade ou Consequência? - Parte Final

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O barulho de vidro se partindo fez com que todos berrassem ao mesmo tempo. Um grito primitivo rasgou minha garganta antes que eu pudesse evitar. Por um segundo, um pânico irracional tomou conta de mim e o desejo de fugir correndo dali fez minhas pernas tremerem. Mauro havia estourado os vidros da janela ao seu lado. Timming perfeito, amigão! Meu coração jovem e saudável quase sofreu uma puta parada cardíaca.

- Não fui eu! Não fui eu! – Gregório gritou, se afastando do fusca e do fantasma. – Juraram que a clínica era segura! Eu não sabia! Eu não tinha ideia do que iam fazer com você! Me desculpe! Me desculpe!

Seus olhos esquadrinhavam a garagem buscando pontos de fuga. Ele sequer se preocupava com os rins desaparecidos ou com os outros fantasmas mascarados ao redor. Nada parecia mais aterrorizante do que aquela visão destripada à sua frente.

Os ruídos metálicos pareciam se multiplicar a cada segundo, dando a impressão de que estávamos presos nas engrenagens de uma máquina tétrica. A sensação era de que iríamos ser esmagados pelas paredes da garagem a qualquer momento. Algumas ferramentas penduradas se balançavam com o vento forte que entrava pela janela quebrada, batendo umas nas outras furiosamente, como se estivéssemos em meio à uma tempestade...

Eu estava paralisada, sem compreender sobre o que diabos Sandra estava falando. Aborto? Clínica ilegal? Quem ela estava interpretando? Onde ela tinha ouvido aquela história? Fosse o que fosse, estava claro que ela acertara em cheio. Gregório tinha, mesmo, alguma culpa no cartório, ou não estaria chorando e se cagando de medo naquele momento. Mas... Assassinato? Um canalha, com certeza,, mas assassino? Eu não podia, realmente, acreditar nisso. Talvez Sandra estivesse indo longe demais naquele drama.

-Desculpar você? – A voz de Sandra ecoou pela garagem silenciosa. O ódio que surgiu repentinamente em sua voz, antes sem emoção, fez tremer seu corpo inteiro.

O ar gelado pareceu esquentar com a sua fúria. Nunca imaginei que ela seria capaz de atuar daquela maneira! Fantástica! Ela pareceu crescer, em toda a sua fúria. O brilho pálido em sua pele era cadavérico, com ossos expostos sob a luz da lua... Mas quase não havia luz naquela garagem. Era como se ela tivesse um brilho próprio, e eu não podia imaginar que tipo de maquiagem era capaz de fazer aquilo.

No momento em que seu punho se ergueu, tremendo de ódio, o vento fez todas as janelas baterem, coordenada e assustadoramente, como estivessem presas à Sandra por fios invisíveis. Não tenho sei de quem foi aquela ideia, mas a execução era impecável. Se eu não reconhecesse minha amiga, estaria com as calças molhadas naquele minuto.

Desculpar você? – Sandra sussurrou com um ódio tão grande que tornou suas palavras mais fortes que um grito.

Um rangido metálico mais alto que todos os outros atraiu nossos olhares para a esquerda, onde o para-choque de um carro balançava perigosamente do alto de um elevador-hidráulico, muito próximo ao lugar onde Gregório vasculhava à procura de uma saída. No que aquele idiota estava mexendo? Aquela coisa podia achatar o crânio dele!

-Eu não tinha a intenção! – Gregório choramingou. –Eu não sabia o que tinha acontecido até ver o jornal! Eu juro! Por favor...

-Você me obrigou a ir lá. Você me abandonou sangrando nosso filho morto! Você é tão culpado quanto eles! – Sandra se moveu em sua direção, com os braços ensanguentados estendidos e um olhar possuído pelo fogo dos sete círculos do inferno. –Agora, você jamais vai nos deixar de novo!

A peça se soltou do carro suspenso, caindo com um baque ensurdecedor a centímetros dos pés de Gregório. Gritando como um desvairado, com o olhar cheio do mais puro terror, ele correu em direção à janela estilhaçada ao lado de Mauro, de onde já se podiam ver os primeiros clarões do dia que dissolviam o escuro da noite em tons azuis e esverdeados.

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