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Se eu não tivesse nada para te dar além de amor,
Diga-me, isso seria suficiente?
(Locked Away - Rock City)
Peter

Na segunda semana naquele inferno, depois de ter passado uma mais noite na solitária por discutir com uns caras, barganho com Deus se o motivo de eu estar aqui, em um lugar onde sou julgado pelo meu sotaque e, por vezes, assediado por isso, é ter chamado a Heaven de Inferno por tanto tempo. Minha meia-irmã boa era uma das poucas pessoas que me passavam alguma paz, principalmente quando ela não estava gritando e chorando. E me dando sustos com o coração louco. Preocupado com a saúde dela, é a única pessoa para quem penso em ligar quando meu bom comportamento me dá direito a uma ligação curta. Consigo mentir dizendo que está tudo bem, mesmo ainda precisando do Terry como escudo, e o telefone emite um som que sinaliza o fim do tempo.

Pelo menos ela sabe que estou vivo. Conversando com o Terry descubro que ele tem uma filha advogada, a melhor do país nas palavras dele.

— Se é a melhor do país, o que você ainda está fazendo aqui?

— Garoto, eu nunca vou te contar o que fiz para estar aqui, mas é ruim o suficiente para ela ter se inspirado no meu caso para se tornar advogada. E não foi pensando em me defender. Apesar de me odiar, é a única que me visita, mesmo que seja só para olhar para a minha cara e ficar feliz por eu estar preso. Nunca sei o que a Julia pensa porque ela não fala comigo nunca.

— Se eu quiser sair daqui, então, ela pode me defender? — é um jeito muito bom de me livrar do Reagan.

— Só se você for honesto sobre a defesa que precisa. É mais um motivo para eu continuar aqui, ela não sabe de tudo que fiz e não pretendo contar. Era só uma criança e é assim que continuo enxergando ela.

Machuca ouvir isso. Penso na Gwen imediatamente. Ele vê a dor no meu rosto.

— Você quer sair, não é?

— Também tenho uma filha. Ela é a criança mais desobediente que já vi, depois do primo dela. A mãe dela é péssima para cuidar de si mesma, imagine de uma criança. Achei que ela melhoraria depois de ver que estou aqui por ela também, mas não. Tudo continua do mesmo jeito. Entrei aqui para melhorar a vida da minha filha, mas agora que sei que nada mudou, penso se valeu a pena mesmo.

No final de semana, o Marcus me visitou. Foi horrível ver o cara que me educou devastado por saber onde cheguei. Contei a verdade para ele, e ele disse que já sabia. Então me disse que o diretor da escola em que formei no meio do ano falou que viu a Vivian com a Gwen em um lugar suspeito, e quando perguntou se não era a minha filha, ela enfiou a menina no carro e saiu ziguezagueando.

E eu achava que a Anne era o caso perdido.

— Vou ligar para a Julia, então. Ela vai ser legal com você, desde que não diga o meu nome. Não diga.

Ele aproveita que pode fazer várias ligações para ligar para a tal filha. Ficar sozinho na cela sem o Terry é enfrentar os comentários dos outros.

— Mesmo que você seja inocente, se sente inocente nascendo onde nasceu? Se acha merecedor mesmo de ter algum direito? Não acha que precisa encontrar um lugar fora e livrar o país de ter você aqui? — um pergunta curioso, murmurando algo que soa reacionário depois, e todos se calam esperando uma resposta.

— A definição de inocência não é não ter contribuído para um crime? Como vou ter contribuído para isto? Pareço ter noventa anos? Minha nacionalidade não deve ser representada por alguém que todo o meu povo se sente enojado de lembrar. Sinto muito por quem da sua família foi ferido e te fez nutrir essa raiva, mas eu, ou qualquer pessoa que não esteve envolvida naquilo não temos culpa.

Ninguém diz nada. Nem mesmo o implicante.

— Sei que ninguém pode pedir desculpas o suficiente por aquilo, então não vou tentar. Mas atualmente, é errado de muitas maneiras acusar alguém só por ter nascido em algum lugar. Estamos vivendo uma crise humanitária lá fora, e muito disso é fruto do preconceito pela nacionalidade, coisa que não vou dizer que entendo como é, que posso entender a dor deles porque é muito pior do que isso, mas sei que começa assim.

"Pessoas que não querem outras pessoas por perto só por terem nascido em um lugar diferente, ou por serem diferentes de alguma forma, porque acham que assim o mundo melhorará. Segregando, vivendo cada um no seu círculo curto de vivência. Mas freund, tenho certeza que você já encontrou alguém de fora do país, não importa de onde, que fez algo que te ajudou de alguma forma. Segregar não é só separar, é desligar todo um povo de quem eles são – e não, meu povo não é mau – e achar que está tudo bem. Quando você corta uma árvore da raiz, ela sofre, não é?"

O Terry volta, encontrando todo mundo quieto.

— Tudo bem, garoto, que tipo de milagre você fez para obter todos em silêncio? Não, não importa. Parabéns. Faça de novo depois, por favor. Minha filha está vindo falar com você nos próximos dias. E isso foi tudo que ouvi dela, "estou indo falar com ele". Mais palavras que o normal, obrigado por isso. Você pode ligar para ela amanhã cedo.

Sem saber como agradecer ao Terry por aquilo, só aceno. Ele acena de volta.

— Não cometa o erro de fazer sua filha te odiar. Uma vez que o ódio entra, sair é muito complicado.

Sei disso, Terry.

— Você é um homem bom, mesmo que não acredite nisso.

— Garoto, eu sou um homem mau, ainda que seja difícil para você acreditar nisto. Lembre-se que você sabe meu nome e só. Escute o que digo e pare de achar que isso faz de mim alguém decente, eu só li demais nos dez anos que estou aqui. Inteligência é uma coisa que pode ser usada para dois extremos.

— E por que é inteligente me tirar daqui?

— Porque você manterá quem precisa aqui dentro, e fará a diferença lá fora. O seu potencial é tão grande que sai da sua linha de visão. Duas semanas foram suficientes para que eu soubesse que o seu trabalho é muito melhor que qualquer um aqui jamais fará. Imagine o que pode fazer com o resto da vida?

Liguei para a filha dele na manhã seguinte.

Provocando Amor - Série Endzone - Livro 4Onde as histórias ganham vida. Descobre agora