▫️▪️CINCO▪️▫️

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Era como correr em direção ao nada e tudo encontrar…

E eu caí em um sono profundo. Tão cheia de certeza, ao mesmo tempo e em igual proporção, em que estava só.

Meus sonhos foram inundados pela memória de algo antigo, tão distante que não poderia tocar ou lembrar quando acordasse e assim foi: um despertar confuso e repleto do que poderia se dizer irreal, mágico, pois o mundo cinza havia ganhado vida. Novas cores, novos aromas e sons. Elérgia parecia pertencer a um conto de fadas… Um conto de fadas em que nada fazia qualquer sentido.

— Criança… Criança, acorde! Eles já estão atrás de você — grita um senhor agitado. Suas mãos me balançam com força e meus olhos demoram a se adaptar para o que encontro ao meu redor.

— Elérgia não vai me impedir de entrar — digo ainda sonolenta. A cabeça do senhor, de fios tão brancos feito a neve, meneia em negativa e sinto-me ser erguida de maneira abrupta que quase, quase, encontro o chão novamente ao estar de pé.

— Não é Elérgia quem quer impedi-la, são os outros! Os que detêm a chave do lugar. Vamos embora, ainda há tempo de fugir! — assegura com pressa.

Passo as minhas mãos sobre o vestido e percebo que ele já se encontra seco e sem qualquer resquício de terra. Ao olhar para a minha pele, reconheço que ganhei um tom mais quente, diferente do constante empalidecido em que me via tempos atrás. O aroma que inalo é tão adocicado que penso enjoar com o tempo e as nuances são tão coloridas que poderiam pertencer a uma filmagem de uma animação infantil. O som constante do lugar é similar ao soar característico dos sinos dos ventos e isso, por incrível que pareça, me conforta nesse momento.

— Onde conseguiu essa presilha de pena? — questiona e encaro os seus olhos amarelos, acredito que essa característica deva ser a principal diferença entre nós “humanos comuns” e eles.

Suas mãos indicam que devemos caminhar e seguir em direção ao sul. Seguro bitty e a bolsa que ainda está em minhas costas, me conduzindo em direção ao desconhecido.

— Quando despertei, senhor, ela era apenas cinzas em meu quarto — respondo com certeza. As mãos do senhor me puxam para segui-lo, visto que, desorientada, já estava me encaminhando para o sentido oposto.

Estamos em um bosque e antes dele me encontrava deitada sobre uma grama macia e acolhedora. A lua cheia, e de resplendor azulado, ilumina boa parte do nosso trajeto, o que facilita o nosso caminhar sobre folhas fofas e que não fazem quaisquer estalos com os nossos passos afoitos.

— Já esperávamos por você, deve ser a mãe da criança que chora… — diz ele e sinto uma sensação confusa ao referir-se a menina dessa maneira e meu pensamento, de imediato, constata que fizeram algo de ruim para com ela. Analu não é uma criança de lágrimas ou de birras sem motivo, por essa razão sei que não choraria sem causa.

— Analu, está chorando? O que fizeram com ela? — pergunto preocupada e alterada, quase segurando o senhor por suas vestes de um tom terroso.

O homem ergue suas mãos de modo aflito, se afastando de mim como se eu fosse um animal feroz. Como se a qualquer instante eu pudesse atacá-lo com garras inexistentes.

— Calma, criança, não fazem nenhum mal aos que trazem. Ela só é incomum, lembrou de você, o que geralmente não acontece com as crianças pequenas. Elas sempre trocam os pais por brinquedos e doces, esquecem deles antes mesmo do portal se fechar por completo — tenta explicar, contudo, não compreendo.

É tudo tão confuso… Me sinto em uma tentativa inútil de decifrar um código secreto no qual nunca estive preparada para fazê-lo.

— Vim buscá-la, quero a minha menina de volta! Preciso chegar até ela e levar todas as crianças comigo — explico rapidamente, entre lufadas de ar úmido, e o homem retorna seu caminho, atravessando por entre árvores contorcidas e as folhas, tão pequenas, que fazem camadas agradáveis de se caminhar sobre o solo.

 A cidade das Crianças Perdidas (CONCLUÍDA)Where stories live. Discover now