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— Vamos, vamos depressa! — apressou, a criança, segurando a minha mão.

— Para onde estamos indo? — questionei, sentindo-me em desassossego.

— Para a cidade das Crianças Perdidas — disse ela. — O lugar em que um riso faz falta e o medo vive sempre à espreita…

Em uma das cidades encantadas de Elérgia, o espaço aparentava estar sufocante e sofrido

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Em uma das cidades encantadas de Elérgia, o espaço aparentava estar sufocante e sofrido. A pequena menina, separada de sua amada protetora, prosseguia em seus prantos e tormentos. Hora ou outra percorria determinada em direção as outras centenas de crianças que estavam felizes, no que poderia se considerar um abrigo. Ela gritava, entre soluços e bramidos, que desejava voltar para casa e os mais velhos se questionam o porquê da criança recém-chegada ainda não ter esquecido daqueles que ficaram para trás.

Analu observava os carrosséis coloridos, a música sempre elevada e as passadas saltitantes dos demais. Ela não conseguia sentir a alegria que reverberava feito um sopro moroso do vento e nem mesmo a residência, que mais parecia um lar encantado, resplandecia aos olhos da menina.

O telhado parecia feito de doces retorcidos e cristalinos, as paredes construídas com pedaços de bolachas cobertas por algo cremoso e comestível. Contudo, compreendia que nada disso poderia ser real, visto que ela mesma acompanhava todos os dias a sua casa feita de madeira e tijolos, cobertas por limo e sujeira. Tão desgastada que poderia romper a qualquer instante. Apesar da pouca idade, a menina já entendia que belo eram os sonhos de uma noite bem dormida e disforme via-se a realidade que sua protetora enfrentava diariamente.

Sofia não aprovava cenas de birra — pensou Analu, enquanto fungava sentindo falta do seu urso de pelúcia. — no entanto, a florzinha sabia que esse era o único modo de voltar para casa. Quanto mais alto gritasse, maior seria a distância que a sua voz alcançaria e, dessa maneira, alguém poderia levá-la de volta para a sua tia.

Muitas crianças, de várias faixas etárias, chegavam todos os dias. Algumas delas não entendiam muita coisa, outras mal começaram a falar, todavia somente Analu sobrecarregava as energias, pondo tudo em risco. As paredes estremeciam por constantes minutos, a energia dos brinquedos falhava em intervalos longos e o ar perdia, durante o dia, o aroma adocicado que atraía os menores e os deixavam encantados. Ninguém, das crianças responsáveis pelo lugar, possuía ideia do que fazer para acalmá-la, além de esperar que tudo tivesse o seu sossego e que no fim de mais um longo dia ela voltasse a dormir.

O tic tac do relógio central alertava para os pequenos raptores que o tempo estava em seu findar e os portões, que os trouxeram uma vez, se preparavam para fechar.

O ciclo se completaria em poucos dias…

— Fique calma, querida, ela já está aqui — asseguravam os mais velhos em uma vã tentativa de consolá-la, já que a menina atrapalhava o constante preparo e adaptação dos recém-chegados.

Uma nova leva de humanos em miniatura atravessaram o portal, sorridentes e encantados com a beleza do lugar que aparentava ser mágico em demasia para ser real. Analu, ao ver o mundo que conhecia através da greta, correu em direção das novas crianças imaginando que, por fim, poderia sair dali e voltar para casa. No entanto, antes de alcançar o pequeno espaço que jazia aberto, a magia os trancafiou mais uma vez sem deixar quaisquer vestígios da sua porta de saída. Os pequenos braços da criança batiam contra uma parede alva e infinita, os fios dourados refletiam sob o brilho tênue dos carrosséis e os olhos já se viam avermelhados e inchados de tanto chorar.

— Sosô, sou eu a Analu. Você pode me ouvir? — indagou, a menina, para o vazio.

Analu secou as lágrimas com o dorso das mãos, fungando mais uma vez antes de sua nova tentativa. Encostou a cabeça contra a parede, na sua esperança infantil de ouvir uma resposta soar além dela.

— Aprendi a lição, tia Sosô, já pode abrir a portinha agora! — continuou. Contudo, por incansáveis minutos, o silêncio foi a sua única resposta.

Analu alteou o pranto, principalmente ao ver todos os pequenos assistindo-a em seu momento de esperança, e imaginou que estavam zombando de seu sofrimento. Então, para surpresa dos demais, as novas crianças tomaram as suas dores e seguiram chorando também. Os soluços se espalharam feito fogo sobre a palha seca e tudo aquilo que jazia aceso na cidade entrou em um intenso curto-circuito. Um acender e apagar de luzes, um surgir de espaços vagos entre as paredes que serviam como portais para os mais experientes.

— Faz alguma coisa, Blênio! — comandou, em desespero, uma das meninas mais velhas.

Ela se via tão próxima de sua partida para uma nova cidade, que ansiava esse momento mais do que qualquer outra coisa e a presença de Analu somente lhe causava problemas que poderiam impedi-la de partir.

O garoto de olhos amedrontados não sabia a quem temer. Voltou o seu olhar para Analu e engoliu em seco, sentindo a angústia de ter sido ele a tentar acalmá-la nos últimos dois dias; o que não fora a melhor das tarefas.

— Zaya, creio que não tem mais jeito… Estamos perdendo muito tempo com ela — confessou Blênio, ainda se sentindo perdido em toda aquela confusão de lágrimas e lamentos.

A mais velha desviou o olhar dos outros para encará-lo e suspirou profundamente imaginando ter que recorrer a sua última alternativa. A garota de fios negros e sorriso cortante segurou um bebê, com pouco mais que um ano, e seguiu em direção a entrada do lar no qual poderia convocar o reforço.

— Temos que chamar o padrinho!

O alerta enviado para Elérgia havia alcançado, finalmente, todas as cidades. A criança, em seu desalento, enfraquecia até mesmo aqueles que prezavam pela segurança de seus moradores e só havia um alguém, naquele lugar, capaz de mudar o declínio de todo o mundo mágico; alguém que poderia trazer o equilíbrio outra vez.

Os escudos mágicos foram se afrouxando, o tempo a alcançando mais depressa e os desafios se abrandando.

Naquele instante, todos os protetores das cidades se encontravam preparados, não mais, para impedi-la de seguir…

Naquele instante, todos os protetores das cidades se encontravam preparados, não mais, para impedi-la de seguir…

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 A cidade das Crianças Perdidas (CONCLUÍDA)Where stories live. Discover now