Hora 13

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 Senti a cama afundar um pouco e ela pegar em minha mão, mas estava tão cansada e tão inerte que não tinha forças para abrir os olhos, o perfume da pele dela me enebriava e me fazia sentir um campo de margaridas, não faço ideia de qual seja o perfume de uma margarida, mas Gi me fazia sentir como se eu estivesse correndo um enorme campo de margaridas amarelas. Também me fazia sentir uma adolescente, me fazia sentir tudo o que eu queria sentir a vida toda e nunca havia tido. 
 Senti como se ela tivesse vindo ao mundo para ser minha alma-gemêa e não me importava mais que isso significa ser com alguém que havia acabado de conhecer, mas é o que sempre ouvi "não é o tempo que você conhece a pessoa e sim a intensidade do sentimento" e eu não conseguia parar de sentir meu peito apertado e ao mesmo tempo querendo pular para fora e ficar pertinho do dela. 
 Suas mãos acariciaram meu cabelo e eu senti meu corpo se arrepiar, o estomago se retorcer sua voz não passava de um sussurro quando ela disse bem perto de meu ouvido achando que eu não estaria ouvindo.
-Eu estou perdidamente apaixonada por você e não si lidar com nada disso. Por favor, esteja por mim também. 
 
Meu coração deu um pulo e parou. Saltou em meu peito e eu não sabia se estava morrendo, a dor era muito parecida. Talvez eu ainda estivesse sonhando. Talvez...
 Tudo ficou muito silêncioso, abri os olhos e ela sorria enquanto dormia, mas ao mesmo tempo parecia séria demais. Beijei o topo de sua cabeça, ainda era muita coisa para assimilar, então me levantei e fui para o banho, sempre que precisava pensar corria para debaixo do chuveiro e hoje mais do que nunca precisava pensar. Um longo e quente banho seria o que me salvaria. 
  Me enrolei na toalha jogada no chão, sabia que era besteira me enrolar na toalha depois de adormecer nua, depois de tudo o que fizemos...  liguei o chuveiro e deixei todos meus musculos relaxarem pela primeira vez nas ultimas 24 horas, pensei em toda a noite anterior, desde o desafio, os beijos de Flávia e Cristina, não tivemos muito tempo para conversar mas eram lindas as duas o contraste da pele preta com o cabelo de núvem branco de Flávia era a coisa mais linda não conseguia dizer não para as duas mesmo que não quisesse beijar nenhuma outra boca além da Gi, mas ela estava certa. 
 Eu precisava viver, precisava experimentar e ter a certeza. 
 E eu tive. 
 Agora eu tenho certeza total.
 Desliguei o chuveiro e então percebi em meu dedo aquele pequeno anel que não estava ali antes de eu dormir, era um aro fino de arame com um coração no meio. Era simples e ao mesmo tempo era uma joia rara. Gizelly havia feito. Havia feito para mim. Colocando na mão oposta a minha aliança de casamento.  Coloquei minha roupa e peguei meu celular calcei o chinelo disponivel no quarto e sai fechando a porta com cuidado para que ela não acordasse. 
 Respirei fundo e me não precisei me perguntar se era isso mesmo que eu queria, estava decidida. Estava apaixonada por Gizelly e aparentemente ela por mim e era só o que eu precisava.
 Procurei o número em minha agenda e quando apertei o botão de ligar, tocou algumas vezes e uma voz feminina atendeu.
-Consultorio Doutor Otávio Fernandes, Doroteia falando em que posso ajudar? Que tipo de nome é Doroteia?
-Por favor eu gostaria de falar com Ótavio.
-Quem gostaria? 
-Rafaella Kalimann, cliente e amiga por favor, diga a ele que é importante. 
-Um segundo. Ela disse ficando mudo logo em seguida. 
 Ótavio era um grande amigo o conheci alguns anos depois do meu casamento, quando engravidei ele ajudou bastante enquanto João estava fora, ele é padrinho de meu filho e sei que só ele poderia me ajudar agora.
-O senhor Ótavio irá atende-la agora. 
-Obrigada Doroteia.
 -Rafaella meu amor. Sua voz era como a realidade me chamando depois de um longo sonho. -Aconteceu alguma coisa?
-Na verdade sim. 
-O Junior está bem? Você?
-Sim estamos todos bem, desculpa. Não é nada grave.
-Que susto mulher, o que me diz de tão importante?
-Eu vou precisar da sua ajuda com algo muito importante.
 Ele ficou em silêncio esperando que eu falasse e eu fiquei em silêncio esperando pensar uma forma mais delicada de dizer.
-Preciso que você faça os papeis do meu divórcio. 
-Divórcio? Ouvi o rangido da sua cadeira enquanto ele se mexia, provavelmente indo para frente. 
-Sim.
-Rafaella? O que está acontecendo?
-O que não está acontecendo Ótavio? Eu meio que cansei de toda a minha vida, de ser uma farsa de não ser livre e não poder ser feliz. Ótavio, eu finalmente me descobri e me aceitei.
-Rafa, me explica direito que eu estou perdido, dois dias atrás você falou que estava indo ver o Junior e agora acordou querendo o divórcio? Que história é essa de se desobrir e aceitar?
-Eu conheci alguém. Falei sem pensar. -Ela é incrivel e me mostrou o que eu sempre tive medo de ver e como é normal tudo isso. Não que eu achasse anormal antes, mas para mim era... Eu não poderia ser assim...
 Ele continuou quieto então respirei fundo e comecei do inicio, a carona; a chuva até o beijo o sexo. 
-Ela me fez perceber que eu não sou feliz no meu casamento e que a culpa é minha e quanto mais tempo eu adiar mais infeliz eu serei e farei João também, não quero faze-lo de ótario  e antes que pergunte não estou fazendo isso apenas para ficar com ela e sim porque é algo que eu preciso fazer.
-Tudo bem, vou preparar os papeis agora mesmo, mas posso te falar só uma coisa?
-Pode. Senti minha espinha gelar com medo do que ele poderia dizer.
-Eu estou muito feliz por você, durante anos eu te observei se torturando e tentando fazer dar certo um relacionamento que claramente não iria dar certo. Achei que você não iria se aceitar e que jamais poderia ver como é ser realmente feliz, e não vejo a hora de te mostrar como é a vida do outro lado do arco-iris. Bem vinda ao vale.
-Você sabia?
-Eu soube no primeiro dia que te vi. Ele riu. -Não sei como o João não viu até hoje, você quer que eu mande os papeis hoje já de surpresa ou espero você chegar em casa e conversar com ele? 
-Eu gostaria de conversar com ele antes. 
-Tudo bem, me avise quando puder entregar.
-Obrigada meu amigo. 
-Espero que você consiga ser feliz, feliz de verdade. Ouvi seu sorriso do outro lado. -Preciso ir, tenho uma reunião agora. 
 Nos despedimos e desliguei.
 Era oficial. Estou me desprendendo de uma vida fingida e libertando João.
 Observei o corredor vazio e vermelho com as portas brancas, ouvi um barulho do lado de dentro levantei as pressas e entrei, Gi estava sentada na cama com o roupão caido em seu ombro deixando seu seio a mostra, achei que fosse impossivel mas ela era ainda mais linda quando acordava com os olhos pequenos quase fechados. Meu coração pulou me impulsionando para frente, sentei na sua frente beijando-lhe os lábios com um enorme sorriso.
-Onde você foi? Ela perguntou sonolenta.
-Precisei fazer um telefonema. 
-Está tudo bem?
-Agora melhor do que nunca. Sorri para ela.
 Olhei no relógio já era um bom horario para sairmos e podermos ficar com as crianças bastante tempo, Gi concordou, pediu para que eu fosse pegando nossas coisas enquanto ela tomava uma ducha tive vontade de me juntar a ela no banho, mas tinhamos coisas para fazer. Desci na recepção e paguei todas as coisas que haviamos pedido já que Gi havia pago o quarto, subi e ela estava colocando os sapatos o cabelo estava preso em um rabo de cavalo. Senti uma pontada no estomago lembrando da noite anterior quando ela prendeu o cabelo antes de descer em mim.
 Afastei esses pensamentos. Rafaella, temos um longo caminho até a faculdade, controle-se.


-Tudo pronto? Perguntei olhando ao redor o braço no banco do passageiro enquanto dava ré para sair do estacionamento.
-Vou avisar as crianças que estamos saindo daqui.  
-Tudo bem talvez em uma hora e meia cheguemos lá. Falei seguindo o caminho.
 Gi mandava mensagens atrás de mensagens em silêncio, senti uma pequena tensão começando a crescer ali e não queria que isso acontecesse, olhei ao redor, já haviamos andado quase meia hora quando percebi uma clareira com um pequeno lago no meio do nada, na beira do lago tinha uma plantação de flores silvestres lilás e branca, dei a seta mudando de faixa mesmo que não houvesse ninguém na estrada. 
-Sabe o que eu sempre quis fazer? Minha voz pareceu pega-la desprevinida.
-O que?
-Nadar pelada em um lago.
-Ta ai uma coisa que eu também queria fazer.
-Então faremos. 
-Um dia quem sabe? Ela riu.
-Não um dia... Agora.
 Cortei para o outro lado e joguei o carro para dentro da clareira estacionando meio escondido no meio das árvores, desci e abri a porta para ela que ficou perplexa. 
-Vamos, vai ser divertido. Falei correndo para a parte mais escondida.
-Aqui Rafa?
 Sua voz vinha de tras de mim enquanto eu já tirava a roupa.
-Não vai me dizer que depois de tudo o que você me fez fazer e de me falar para viver você vai amarelar?
-Não é só que...
-Sem desculpas. Eu te desafio a entrar comigo, a água deve estar boa.
 Gi olhou para os lados e tirou o vestido, por mais que eu conseguisse ver o começo da clareira da estrada, ela era afastada e tinha um ponto que não dava para ver nada, entrei na água tentando não demonstrar quão fria estava, todo meu corpo se arrepiou, Gi entrou na água reclamando que eu havia enganado-a, ela jogou água em mim me fazendo arrepiar ainda mais, aos poucos fui me acostumando e água foi ficando gostosa, o lago era pequeno e tinha uma parte com algumas pedras que eram perfeitos para sentar-mos com as pernas esticadas, Gi sentou em meu colo beijando meu pescoço, orelhas e lábios. Em toda minha vida, João nunca me beijou da forma como Gi beijava.
 Ela estava certa ao dizer que mulher era mais delicada mesmo com todo o desejo que ela transparecia em seus beijos não era bruta como quando joão vinha com desejo depois de beber alguma coisa. Ela era doce com um toque de rebeldia.  Como um arco-iris no meio da ventania.
 Abracei suas costas fazendo circulos com o dedão
-Eu preciso te confessar uma coisa. Ela não disse nada, mas senti seus musculos tensionarem. -Eu liguei para o meu advogado e pedi o divórcio.
-Você tem certeza disso?
-Tenho, estou apenas nos enganando eu o amo, mas eu realmente acho que sou lésbica.
-É?
-Sim, eu senti muito mais com você do que com ele a vida toda, eu senti muito mais com Flávia e Cristina do que com ele e elas não significaram absolutamente nada.
 Gizelly fechou a cara.
-Você poderia não falar delas o tempo todo né?
-O tempo todo? É a primeira vez que eu falei delas e caso você não lembre, foi você quem mandou eu beija-las.
-Eu sei, não posso me arrepender?
-Está?
-Me arrependi na mesma hora que elas surgiram.
-E porque deixou?
-Não quero te controlar, mas vê-las em cima de você como abutres me deixou nervosa.
-Nervosa... Ou com ciumes? Sorri tentando faze-la falar.
-Os dois, satisfeita? Eu senti ciumes de você Rafaella.
-Eu sei. Sorri beijando seus lábios.
-Eu posso confessar mais uma coisa? Gi assentiu. -Não quero que você volte para o Ivo também. 
-Rafa eu...
-Eu sei que não é assim tão facil, mas eu sei que você também sentiu Gi, eu sei que você também esta apaixonada por mim. 
-Também? Seus olhos brilharam.
-Gizelly, eu estou apaixonada por você desde que te vi pela primeira vez saindo da corte, estou apaixonada desde que você entrou no meu carro. Estou apaixonada desde antes de te encontrar, você é o que faltava na minha vida.
-Eu... 
-Não, me escute... Falei interrompendo-a. -Eu sei que você tem uma vida longe daqui e não estou te pedindo para escolher, mas por favor, eu estou apaixonada, não me apaixonando, estou apaixonada e sei que você também, meu casamento já acabou e eu vou te esperar. Gizelly eu vou esperar até você se decidir. 
 Respirei fundo sentindo as lágrimas querendo descer.
-Se você se sentir assim daqui um ano exatamente, me encontre aqui, não aqui aqui na clareira, mas no hotel. 
 Gizelly pensou antes de assentir.
-Dia quinze de Junho, daqui um ano. Ela falou. -Se você se sentir assim ainda, nos veremos lá.
-Eu vou me sentir, e vou ouvir você me dizer o quanto está apaixonada por mim.
-Desde o primeiro dia que te vi. Ela sorriu, beijando meus lábios com mais delicadeza possivel.


One Day. (Girafa)Donde viven las historias. Descúbrelo ahora