Hora 17

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Me despedi de João leve, senti vontade de chorar de felicidade por estar finalmente livre, mas me segurei, fiquei com Junior arrumando seu quarto esse ano o seu colega de quarto desistiu da faculdade então ele acabou ficando com o quarto todo para ele o que fazia com que ele não se importasse de arrumar, tinha pó em tanta coisa que não sei como suas alergias não atacaram.
Junior fazia o trabalho que Gi havia ajudado a entender.
-Mãe, você ta feliz?
-Como assim filho?
-Ah mãe, feliz com toda essa situação?
-Estou meu amor.
-Você sempre gostou, sempre soube?
-Sim e sim. Falei sentando ao lado dele. -Eu sempre gostei de mulheres, estive com seu pai por medo e comodidade, mas sempre soube que gostava de mulheres.
-E porque agora?
-Porque não agora? Retruquei. -Você já está criado, eu quero poder ser feliz Junior, viver a vida finalmente.
-A Gizelly não teve nada a ver com isso?
Agora sabiamos onde ele estava querendo chegar onde rodeou tanto para finalmente dizer. Respirei fundo, bom uma hora isso teria que ser dito né? Tudo acontecia tão rápido que estava ficando tonta.
-Não e sim, olha Junior não vou negar que Gizelly tem uma grande parte pois ela me ajudou a ver que não tem problema algum eu ser da forma que sou ela me ajudou a me assumir e me aceitar, mas não significa que ela seja o total motivo para isso, eu estou apaixonada por ela e sinto muitissimo se isso te machuca, mas não significa que vou me mudar para a casa dela para casarmos... Não vou deixar de ser amiga do seu pai, só deixei de estar casada com ele.
-Então você está apaixonada por ela?
-Estou.
-Assim tão rápido? Dei ombros, não tinha o que dizer. - Eu estou feliz por você de verdade mãe, mas eu só tenho uma coisa, como você vai dizer pra vovó?
Meu corpo travou, Junior tinha razão como contaria pra mamãe? Ela não gosta, ela é o maior motivo para eu levar anos para pode me aceitar, ela odiava o fato do Otavio ser o padrinho do Junior, "Esse homem não é digno das benção de Deus Rafaella! Como você quer que ele cuide do meu neto? Você sabe que ele vai ir para o inferno e vai levar meu neto com ele" depois desse discurso ela passou quase um ano sem falar comigo, ela passou o primeiro ano da vida de Junior longe só pelo fato do Otavio ser padrinho do Junior imagina quando descobrir sobre a própria filha. Senti um arrepio na espinha, engoli em seco.
-Quando for a hora eu vejo como farei.
-Se o vovô ainda estivesse vivo talvez fosse mais fácil.
-Talvez. Ouvimos uma batida na porta me levantei para atender, parada do outro lado lá estava ela, a causa de todos os meus pensamentos duvidosos. -Oi. Sorri.
-Oi, posso entrar?
-Claro, Junior está te esperando. Dei espaço para que ela pudesse entrar, mas travei, será que beijava? Apertava as mãos? Não fazia nada e simplesmente deixava entrar?
Gi passou por mim sorrindo, acariciou meu braço e adentrou ao quarto. São os minimos detalhes que me fizeram apaixonar, como a forma que seu quadril balança enquanto anda ou seu cabelo voando para todos os cantos, ou como ela mesmo sem perceber, toca o ombro de Junior com tanto carinho.
Me sentei na cama ao lado da de Junior, a desocupada e me peguei prestando atenção na conversa dos dois, em como eles se perderam nos assuntos sobre... sobre algo que eu definitivamente não compreendia, seus sorrisos eram grandes e os dois gesticulavam muito. Gravei em minha mente cada segundo, cada memória, sentindo meu coração arder em paixão, arder em amor pelos dois. Junior entregou o notebook para Gi que leu seu trabalho, vez por outra ela arrumava algo ou apontava para ele o que ele havia errado.
 O celular de João tocou e ele correu para ver, seus olhos brilhavam e seu sorriso era enorme. Desligou o notebook e virou para mim e para Gi. 
-Vocês vão ficar muito bravas se eu disser que tenho um encontro agora?
-Encontro?
-Sim a Julia conseguiu que Clara aceitasse sair comigo.
-Não tem problema filho, vamos indo então Gi? 
-Claro, não quero atrapalhar o encontro e estou um pouoco cansada também.
-Eu também, estou toda dolorida.
 Nos levantamos, Junior mal prestava atenção no que diziamos, depois de nos despedirmos já um pouco depois da porta ele grita.
-Sabe? Vai ser maravilhoso ter a Julia como irmão, seja bem vinda a familia Gi.
 Ali, tive vontade de chorar de novo estava emotiva e ver Gi procurando minha mão e meu filho gostando da pessoa que eu estou... Vou estar? Não sei, só sei que é gratificante para alguém que por anos sofreu com medo do que todos fossem pensar.
 Caminhamos até o carro de mãos dadas e nunca me senti tão feliz e tão livre, também não havia percebido quantas pessoas olham para você pelo simples fato de estarmos de mãos dadas, duas mulheres adultas não deveriam receber tantos olhares tão diferentes como se fossemos monstros, antes de chegarmos ao carro ouvimos duas pessoas gritando uma delas disse "Aqui é um lugar para familias, isso tudo é errado e vocês vão para o inferno" senti todo meu ser se diminuir e querer sumir, mas Gi apenas apertou minha mão com mais força e sorriu aquele sorrisso que fazia todo o resto diminuir, sumir, só restar nós duas e assim tudo ficou melhor. 
 Já na porta do carro Gi abriu a porta para mim e agradeci com beijo inocente em seus lábios um casal que passava ali a menina gritou "Sejam minhas mães" e bateu no namorado "você não abre a porta para mim, vou arrumar uma mulher que é melhor que você" o namorado riu enquanto a pegava no colo.
-É sempre assim? Perguntei sentando quando Gi ligou o carro.
-Assim como?
-Quando duas mulheres saem, sempre vai ter olhares e comentários?
-Depende. Ela deu ombros. -Existem lugares que somos mais "aceitas" que não tem olhares ou comentarios nem mesmo os fofinhos, como bares gays ou... A parada, mas existem lugares em que os olhares são constantes e os comentários horriveis, é só saber filtrar e aprender a não ouvir.
-Você já passou por muita coisa desse tipo?
-Eu fui uma mulher grávida casada com uma mulher vinte anos atrás, eu estava com meus hormonios a flor da pele, tive que ouvir de um amigo do Marcelo que "foi a melhor coisa aquela lá morrer, assim sua filha não vai nascer na perversão", é aquele tipo de coisa que você precisa aprender a lidar, eu tinha acabado de perder minha esposa, ainda não havia visto minha filha por estar na UTI neo natal, claro que chamei a policia e fiz um B.O, mas vinte anos atrás o policial provavelmente concordou com ele...
-Meu Deus Gi.
-Acontece, o que você precisa saber é: A pessoa vale pena? Tem perigo de vida esses olhares? E ser feliz Rafa, ser mulher nesse mundo já é dificil por si só, agora ser mulher lésbica ou bi, ai a dificuldade aumenta, mas não tem nada melhor do que sermos nós mesmas.
-Realmente, hoje eu percebo que não tem nada melhor. Sorri para ela.
 Já estavamos na estrada, ainda não haviamos ligado o som aproveitando a companhia uma da outra, as vezes Gi esticava a mão para tocar na minha outras eu fazia cafuné, eu poderia ter isso para sempre. Eu quero que esse momento não se acabe, quero te-la para sempre, meu coração nunca esteve tão calmo e tão puro como com ela.
-Aliás, tem coisa melhor. Falei sorrindo com malicia na voz.
-O que? Ela perguntou.
-A Gizelly, teu toque. Tua maciez, teu gosto... Gi ficou vermelha, rindo. 
-Você é idiota sabia disso Rafaella?
-Mas estou sendo a sua idiota Gizelly.

 As arvores passavam rápido pela janela, Gi era focada demais ao dirigir, não se distraia facil a mal conversava, dissera que é pelo trauma que lhe custou para voltar a entrar em um carro depois do acidente, mas vez ou outra ela me olhava sorrindo.
-Daria tudo para ouvir seus pensamentos. Falei uma das vezes que ela sorria sem motivo algum.
-Não é nada demais.
-Me diga.
-Tava pensando no que Junior falou. 
-Quando?
-Que ele iria gostar de ter Julia como irmã.
-Eu não esperava isso também. Sorri. -Já pensou nos natais, nós todos ao redor da mesa? Eles voltando para casa e se tratando de fato como irmãos?
-Rafa, sei que é obvio já a resposta, mas ele já sabe?
-Já.
-E seu marido?
-Conversei com João quando saimos do restaurante. Observei os nós dos dedos dela ficarem brancos ao apertar o voltante. -João foi compreensivel de uma forma que não achei que fosse.
-O que você disse para ele?
-Eu falei exatamente como me sentia desde sempre, presa e como agora eu queria ser feliz da forma que eu nunca pude.
-E falou alguma coisa sobre nós?
-Na verdade ele perguntou, eu só disse a verdade.
-Que seria...
-Que sim eu estou apaixonada por você que sim se eu pudesse eu começaria minha vida com você agora, mas que sei que isso pode não acontecer e tudo bem, porque eu vou te esperar Gizelly. Eu vou te esperar até você me querer como eu te quero. Porque por mais que seja tudo novo, eu não me vejo com mais ninguém além de você, que tudo o que eu quero é envelhecer ao seu lado e sinto muito Gi,sinto muito mesmo se você acha tudo rápido demais, mas eu passei a minha vida toda esperando esse momento.
 Gizelly parou o carro no meio da estrada, me assustei com a forma brusca que ela parou.
-Eu tenho que pensar em Ivo, ele não tem um emprego não tem um lugar para morar, Rafaella, minha vida não é um conto de fadas, isso tudo não é um conto de fadas é a vida real.
-Eu sei. Me senti minuscula, só queria descer do carro e correr para o mais longe possivel.
 Ela ligou o carro largando no acostamento e desligando novamente,  não conseguia olhar para ela enquanto saia do carro, não conseguia mais segurar as lágrimas, pela primeira vez eu me entregava, pela primeira vez eu estava indo atrás da minha felicidade, mas não pensei na possibilidade de isso ser a vida real e a felicidade não me querer de volta, limpei as lágrimas e tentei segura-las para que não caissem quando ela abriu a porta e me puxou para fora do carro.
-Você sabe que eu tenho minha vida para arrumar não sabe? Tenho uma casa, um trabalho e um homem me esperando em casa. 
 Assenti enquanto meu coração se apertava.
-Você diz que está apaixonada por mim, você diz tudo o que quer dizer tudo o que sente, diz sobre criarmos uma familia, diz sobre feriados que passaremos juntos e não espera uma resposta minha. Eu não tenho voz nesse relacionamento ficticio Rafaella? 
-Me desculpa. Ela não gritava, ela não era grossa só dizia os fatos, mas os fatos me matavam e as lágrimas já desciam sem se importar com a minha vergonha de estar chorando, Gi limpou minhas lágrimas e me abraçou.
-Rafa, eu tenho que arrumar minha vida, para que você possa entrar nela. Gi sussurrou em meu ouvido. -Eu preciso que você entenda que eu quero deixar tudo arrumado para que você possa ser feliz e eu quero que você seja feliz, mas não quero que seja longe de mim. 
 "Eu quero finais de semana testando receitas, quero ser sua inspiração para novos livros, quero passeios e férias em lugares exóticos quero ver filmes com finais que ninguém entende e quero os feriados reunindo as duas familias. Quero você. Quero nós duas. Quero tudo o que você quer e mais... Entende isso? Mas antes eu preciso arrumar a casa para que você faça morada."
 Senti meus olhos arderem, senti meu coração aquescer e crescer. Ela queria tudo o que eu queria. Ela me queria.
-Me dê esse tempo, nosso plano. Vamos arrumar nossas vidas e se no final de tudo isso, você ainda me quiser, Rafaella eu serei toda sua.
 Assenti, não conseguia dizer nada minhas lágrimas ainda não paravam de cair agora de felicidade, apertei meus braços mais fortes ao seu redor e ela me beijou, senti a promessa em seus lábios, promessa de que ela estaria me esperando e prometi espera-la. 
 Até o final de tudo isso, seremos uma da outra. Para sempre.

One Day. (Girafa)Where stories live. Discover now