Capítulo 21

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Comemos em silêncio apenas fazendo comentários sobre a comida, divina, e o vinho. E quando terminamos o garçom voltou, retirando os pratos e servindo o segundo prato de nome complicado que Tânis pedira, que agora eu descobria ser a sobremesa.

Pelo menos era bonita. Depois que o garçom se retirou mais uma vez e fechou a porta provei a sobremesa e quase gemi. Era maravilhosa! Composta de creme de baunilha e sorvete grego, com fios de calda de morango e pequenas folhas de hortelã.

— Seu cotidiano é mais um motivo para me desculpar com você. – Ele interrompeu meus pensamentos agradáveis sobre o doce, para voltar ao assunto – Isso vai mudar agora, Íria. Seu pai ficou ainda horas comigo ontem e me fez ver a atrocidade que cometi com você ao bloquear a contratação de mais profissionais para o instituto. Como lhe disse, ao passo que melhor a conheci, passei a me importar mais do que com sua simples sobrevivência. Bloqueei a contratação, quando notei que você, apenas com dois autônomos diminuiu a taxa de mortalidade feminina daquela província em setenta por cento. Confesso que fiquei com muito medo de contratar novas médicas e você deixar o instituto para se estabelecer em algum lugar próximo ao mar, que eu julgava perigoso.

— Apesar de te odiar quando confessou isso ontem, não errou, se não fosse a falta de médicas, já teria deixado o instituto e estaria aqui em Brice. Rosa... Desculpe, a Dra. Rosana Lins, me ofereceu estágio na universidade como prêmio por minhas altas notas e me convidou a residir com ela pelo restante do curso.

— O que agora posso concordar. – Ele assentiu.

— Podia, porque a oportunidade se perdeu. Obrigada, Tânis! – Tinha que provocar – Vou terminar os últimos quatro meses lá mesmo. Mas contrate novas médicas, porque minha formatura é seu prazo final.

— Virá trabalhar em Brice?

— Não. Vou embora com meu pai.

— Vai viver em uma ilha isolada pelo resto da sua vida? – Ele estava incrédulo.

— Não acho que preciso viver isolada em uma ilha, Tânis. Ao contrário de Antera, posso respirar submersa. Minha biologia é mais parecida com a do meu pai do que poderia acreditar.

— Eu sei que é egoísmo, mas não quero que vá.

— Bem, para que possa voltar e rever você e todos os meus amigos, acho que preciso de um induto diplomático. Visto que ainda existe um velho antagonismo entre seu reino e o do meu pai.

— Não se esqueça que eles, ainda tem tanto antagonismo conosco quanto nós com eles. – Ele ergueu a sobrancelha para mim.

— Você não entendeu, não é? Seu tratado impede que qualquer um da espécie deles pise em terra no seu reino. Meu pai e irmãos têm arriscado há anos apenas por mim, porque sabiam que eu não queria ir sem terminar o que comecei. Se houvesse todo esse antagonismo, eles teriam me tirado daqui aos treze anos, quando reencontrei meu pai. – Suspirei – Não encontro apenas meu pai aqui. Meus irmãos estão sempre na cafeteria da UMR. Eles se parecem com meu pai e só os notei, porque cheguei a confundi-los com meu pai.

— Chegou a falar com eles?

— Sim, só não me contaram que eram meus irmãos. Eles não gostavam da forma como alguns garotos da universidade troçavam de mim, quase bateram em um deles algumas vezes. Agradeci a defesa, mas dispensei. Sei cuidar de mim mesma. Justamente porque respeitaram minha opção que te digo: conheço meus irmãos e pai, Tânis. Eles vão respeitar o que desejar fazer da minha vida.

— Está curiosa sobre a forma como eles vivem?

— Sim, estou. Mesmo que não me encaixe entre eles, gostaria de conhecer sua sociedade, sua cultura, sua filosofia. Logo, descobrir se tenho qualquer outra similaridade com eles além da aparência física. – Vendo seu olhar indeciso, emendei – Sejamos sinceros. No meu lugar também estaria curioso. Também gostaria de ver por si mesmo, não é?

Valquíria MaresOnde histórias criam vida. Descubra agora