CAPÍTULO 26 - ANA

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"Quando você perde algo que não pode substituir

Quando você ama alguém, mas é um desperdício

Poderia ser pior?

As luzes te guiarão para casa

E aquecerão seus ossos

E eu tentarei consertar você."

Fix you - Coldplay



Eu mataria Marina.

Assim que pusesse minhas mãos em seu pescoço, ela estaria morta! Morta! Mortinha da Silva! Eu não sei o que a gente faz para merecer nossos melhores amigos, mas tenho certeza que Deus errou na mão quando foi acrescentar "cupido" na receita dos meus - em Marina, deve ter gastado o pote inteiro de "se meter na vida alheia".

Minhas mãos estão trêmulas e meu coração bate acelerado com a perspectiva do que está acontecendo a minha volta - estou sozinha com Danilo numa casa no meio do nada e não tenho nenhuma saída. Ter ficado num carro trancada com ele já havia sido difícil, não consigo nem imaginar o que essa semana nos reserva. Pela cara de surpresa lendo a carta, ele havia sido enganado tanto quanto eu, e eu sabia que ele nunca me forçaria a ficar com ele dessa forma. Sabia que ele estava tentando o seu melhor para não me machucar ainda mais.

E na verdade, toda a minha família estava certa. Eu sentia falta dele. Mais do que sentia falta de respirar quando estava submersa. Não sei se um dia confiaria nele da mesma forma que confiei um dia, mas queria muito tentar ser sua amiga ou pelo menos conseguir estar em sua presença sem toda a energia passiva agressiva - o elefante gigante parado no meio da sala que todos fingiam não ver. E por isso havia concordado em ficar. Acho que essa decisão era o início oficial de uma vida onde o passado não pese tanto sobre todos os nossos ombros.

Eu sabia que iria amá-lo para sempre. Isso não era nenhuma novidade. Sua presença, seu corpo, sua voz - tudo me atraía como sempre atraiu. Mas amor não é suficiente. Nunca é.

Caminho com minha mochila no ombro pelo corredor estreito do chalé, e percebo que apenas duas portas me encaram no final do corredor, uma dá para um banheiro saído direto da era vitoriana com banheira de cerâmica e azulejos floridos e a outra, é claro, dá para o único quarto da casa fofa que parece ter saído de um quadro do pinterest. Abro a porta e me deparo com a cama gigante, cheia de almofadas, com uma cômoda simples ao lado, com flores bonitas em cima e dois abajures amarelos que só deixam o ambiente ainda mais fresco e aconchegante.

Largo minha mochila no chão e abro rapidamente o bilhete que Nina deixou endereçado a mim, minhas mãos trêmulas dificultando o processo.


"Não me odeie, Aninha! E não me mate também, sou intrometida porque te amo! Tanto que quero que você seja a madrinha da bebê número três!

Tá tudo bem doer, Aninha. Se dói, é porque é real.

Amo você,

Sua Flor."


Meus olhos estão ardendo quando termino de ler, meu coração apertado numa bolinha de medo e insegurança. Medo de ser machucada novamente, medo de perder ainda mais do que consegui reconstruir, medo de não valer a pena. Medo de amá-lo ainda mais mas nunca conseguir perdoá-lo de verdade.

Me assusto com um movimento atrás de mim e pulo ao ver Danilo encostado no batente da porta, os olhos azuis cristalinos no rosto perfeito escrutinando o meu em busca de respostas que ainda não posso dar.

- Você está bem? - Ele pergunta, me escaneando. Sei que está vendo cada uma das emoções que passam pela minha cabeça, ele sempre via. Por isso, sei que não tem sentido mentir.

- Não sei. - Respondo, sentando na cama. - Não tenho a menor ideia. - declaro, esfregando minhas têmporas, tentando encontrar algum alívio para o caos mental que me acompanha diariamente e que havia piorado nos últimos trinta minutos. Escuto os passos de Danilo, e sinto o colchão afundar do meu lado assim que ele senta, o corpo próximo ao meu mas sem invadir meu espaço pessoal. Seu cheiro me invade com mais rapidez do que sua voz chega até meus ouvidos.

- Você merece ser feliz, Ana. - Ele fala, e eu me surpreendo porque esperava qualquer coisa menos isso. Ergo minha cabeça rapidamente e engasgo assim que meus olhos encontram os seus. A vulnerabilidade neles é intensa demais. Eu estava acostumada com a muralha de gelo.

- Não digo comigo, - ele acrescenta rapidamente. - Você merece ser feliz com sua família, com seu emprego, com você mesma. Você merece viver uma vida feliz. Não quero ficar no seu caminho de alcançar isso. - Ele termina, tirando os olhos dos meus. Não sei o que falar porque tudo parece ainda mais confuso agora.

- Eu sei que não. - Digo, sendo sincera. - Desculpe se estou no seu caminho também. - Peço, porque parece certo. Fiz da vida dele um grande inferno nos últimos dois anos também.

- Jamais, Ana. - Danilo fala, a voz agora segura, quase irritada. - Nunca. - Ele garante. - Vou fazer algo para o almoço, tudo bem por você?

- Claro, vou só tomar um banho. - Digo, me levantando também. Ficamos nos encarando por alguns segundos, estranhando essa dinâmica quase normal. Ele concorda com a cabeça, já me dando as costas para sair, mas para assim que o chamo novamente.

- Sim? - Ele pergunta.

- Só tem essa cama. - Eu falo, indicando a monstruosidade branca atrás de mim.

- Seja lá quantos sofás tenham nessa casa, o maior deles é meu. - Ele diz, com um pequeno sorriso. Eu sorrio também, incontrolavelmente. Ele sai do quarto, me deixando sozinha novamente, agora, eu quase posso respirar. 

QUEBRADOS - Irmãos Fiori: Livro II - COMPLETOOnde as histórias ganham vida. Descobre agora