Epílogo

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Era verão. Os raios de sol invadiam o domo brilhante no qual se encontravam. O vidro resistente não era forte o bastante para contê-los. As duas meninas estavam lá, mas sem saber por que estavam. Seus pais não falavam muito, principalmente a respeito do que ocorria ali. Mas Aurora era curiosa e pretendia descobrir.

— Eu não acho que seja uma boa ideia espionar — dizia Flora, pretendendo manter sua moral intacta.

— É claro que é, eu que tive essa ideia. Fica quieta e não me atrapalha, já que não vai me ajudar.

Elas se encontravam ao fundo, perto da entrada do domo no qual o Conselho Ligheat se reunia. Seus pais estavam no lado oposto, onde parecia estar ocorrendo uma reunião. Aurora pretendia se esconder atrás de algum banco próximo a eles e escutar o que diziam, mas quando deu o primeiro passo, os adultos cessaram a reunião e começaram a caminhar na direção delas. A garota era conhecida por seu pensamento rápido, então tratou logo de disfarçar. Mesmo assim, não se deu por vencida, precisava obter respostas de algum jeito.

— Vão me contar por que estamos aqui? — questionou aos pais quando se aproximaram.

— No momento certo — respondeu o pai.

— Ah, por favor! Eu não sou mais um bebê — retrucou ela.

— Tudo bem, em casa conversamos.

Aurora aceitou. Flora encarou os próprios pais, se perguntando se também obteria respostas deles, mas não tinha coragem de perguntar.

— Ela é muito afiada para uma garota de 12 anos, vai se sair muito bem no Conselho — disse um homem que também estava presente na reunião.

Aquilo serviu para atiçar ainda mais a curiosidade das duas meninas, que pela insistência acabaram obtendo respostas ao chegarem em suas respectivas casas. Ambas seriam treinadas para adquirirem um cargo futuramente no Grande Conselho Ligheat, aquele que regia todas as decisões do Mundo Ligheat. De vida, de morte, de guerra e de paz.

Aurora ficou contente com a notícia, ainda mais quando sua família se mudou para a Base Veranil, em um lugar onde o sol é ainda mais luminoso do que em qualquer outro lugar no mundo. Flora, por outro lado, não gostou de ter seu futuro decidido por outras pessoas. Seu maior medo era se sentir presa, como um passarinho em uma gaiola. A natureza deve ser livre, ela também queria ser. Mas a primaveril não pôde negar que também amou a mudança. A Base Primaveril era o lugar mais lindo e colorido que ela já havia visto na vida.

***

Após quatro anos morando no centro da existência, Aurora se sentia cada vez mais radiante e pronta para assumir seu lugar no Conselho. Além disso, também alimentava esperanças de se tornar a Governante Suprema do Verão, o cargo mais alto existente na hierarquia veranil. O ocupante do cargo poderia ser visto como a mistura de um presidente e um monarca, pois apesar de não ser um governo absolutista, o respeito que se devia ao governante supremo se assemelhava ao respeito que se devia a um rei ou rainha. Ela até mesmo já fazia planos de governo. Suas principais regras eram: "nunca devo me igualar a um governante Dawcold" e "nunca devo colocar o poder acima do bem do meu povo". Desde cedo, sua popularidade já era grande, então sua confiança também era.

Flora, por sua vez, percebia a cada dia o quanto sempre esteve certa. Aquela não era a vida que queria. Não queria se integrar ao Conselho, muito menos disputar o cargo de Governante Suprema da Primavera. Ela não queria a política, queria uma casa no campo, entre as flores e as borboletas, algo que só existia em seus sonhos. Ela era o tipo de pessoa que se lamentava o tempo todo, até que um dia algo a fez parar. Todos ao redor perceberam, mas não conseguiram prever o que estava por vir.

***

Mais dois anos se passaram e um massacre aconteceu, levando embora grande parte do Conselho que vigorava na época. Por consequência disso, uma nova leva de conselheiros se uniu aos antigos que restaram e duas novas governantes foram eleitas. Flora foi eleita Governante Suprema Primaveril, mas não discursou em sua posse, não conseguiu encontrar palavras que a fizessem sentir menos miserável por tudo o que ocorrera e por onde estava naquele momento. Do mesmo modo, Aurora foi eleita Governante Suprema Veranil, mas, diferente da amiga, decidiu discursar. Suas palavras ficaram marcadas naqueles que ouviram. Na história e no Statera.

— Povo Ligheat. Passamos por muito nas últimas semanas, mas isso foi apenas uma consequência do que já vem ocorrendo há anos, há séculos. Os responsáveis por isso vêm cavando um buraco no solo em que pisamos há muito tempo. E eu, como Governante Suprema, não permitirei que isso ocorra novamente. Não podemos deixar que os Dawcold vençam, não podemos deixar que eles invadam nossa casa, nosso templo e nos matem, não podemos confiar em nenhum deles, não podemos ser fracos. — Ao dizer essas palavras, ela desviou o olhar para Flora, que estava ao seu lado, depois retornou a falar, tendo a atenção de todos para si, o que lhe deu ainda mais forças para terminar seu discurso. — O Statera diz que enfrentaremos uma guerra. Ela virá até nós ou nós iremos até ela. E quando esse dia chegar, vamos lutar para vencer! — Quando pronunciou a última palavra e ergueu seu braço direito com o punho cerrado, recebeu inúmeros aplausos e urros em concordância, o que significava que não estava sozinha. Seu governo seria longo e a luz prevaleceria sobre as trevas. Tudo o que ela tocasse estaria livre do frio, senão não faria sentido ela ocupar aquela poltrona, na qual se sentou quando o primeiro raio de sol do verão a alcançou.

Primavera | As 4 Estações [Livro I]Onde histórias criam vida. Descubra agora