A mulher do pescador

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Há muito tempo atrás, viviam em uma cabana um pescador e sua mulher. Eram bem pobres, mas conseguiam pôr comida na mesa com esforço.

Certo dia, o pescador pescava com sua canoa no mar quando conseguiu fisgar um grande bagre.

"Puxa, esse peixe é dos grandes! Eu e minha mulher vamos comer muito bem no jantar de hoje!" - ele pensou, feliz da vida.

Foi quando o pobre peixe abriu a boca e suplicou:
- Eu imploro, meu senhor! Poupe minha vida! Poupe minha vida! Se tiver piedade de mim, juro que concederei ao senhor um desejo!
- Um desejo, é? - indagou o homem, incrédulo. - Que tipo de desejo?
- Qualquer um que o senhor puder imaginar! - respondeu o bagre, esperançoso. - Acredite, posso ser só um bagre mas tenho poderes!

O pescador matutou por alguns instantes e então se virou ao peixe e disse:
- Está bem. Eu e minha esposa somos bastante pobres, será que pode nos tornar ricos?
- Seu desejo é uma ordem! - exclamou o bagre com um sorriso no rosto.

Curioso, o homem o soltou novamente no mar e voltou para casa.

Sua cabana miserável, porém, não estava mais lá. No lugar, havia um imenso casarão com um belo e florido jardim na frente, onde havia uma fonte de água cristalina.

Maravilhado, ele foi ter com sua mulher, que já o aguardava, com um sorriso no rosto. Ela, porém, não trajava mais os mesmos trapos de sempre, senão um magnífico vestido dourado.

Daquele dia em diante, os dois apenas comeram do bom e do melhor e passavam seus dias descansando em sua imensa varanda e bebendo vinho, pois já não precisavam mais trabalhar sendo tão ricos.

Até o dia em que a mulher o procurou e disse:
- Querido, me diga uma coisa: Lembra- se do dia em que poupou a vida daquele bagre e ele nos tornou ricos como somos hoje?
- Claro que me lembro, querida, por que a pergunta?
- Neste dia, ele o disse que tinha poderes, não disse?
- Disse sim, mas por que está perguntando, querida?
- É que...bem... - ela começou, desajeitada. - E se você pedisse a ele para nos tornar rei e rainha?

O homem, a princípio, não gostou da ideia pois já tinham uma vida bastante confortável e achava desnecessário pedir por mais. Mas a mulher tanto insistiu que ele cedeu e foi até a praia, onde chamou pelo peixe, que não tardou a aparecer.
- Bom dia, meu grande amigo! - saudou-lhe o bagre, simpático. - A que devo o prazer de sua visita?
- Bom... - respondeu o homem, sem saber como explicar. - É que minha esposa gostaria muito que você nos tornasse rei e rainha, da mesma forma como nos tornou ricos.
- Certo, tudo bem. - respondeu o bagre, depois de pensar por alguns instantes. - Você me deixou viver, amigo pescador. Talvez vocês realmente mereçam isso. Seu desejo é uma ordem.

Nisso, o peixe desapareceu novamente no mar.

Curioso e também um pouco empolgado, o homem voltou para casa. Ao chegar lá, não encontrou sua mansão, e sim um enorme palácio rodeado por extensos jardins e uma estradinha de tijolos que guiava à entrada, onde havia uma ponte levadiça que dava acesso ao lugar.

Ao se aproximar, o homem foi recebido com profundas reverências por um grupo de guardas armados que o chamaram de "sua Majestade" e o conduziram até a entrada, como se zelassem pela segurança dele. Ao entrar no saguão do palácio, um lacaio se aproximou com um sorriso no rosto e recolheu seu chapéu e sua capa, ao passo que outro veio lhe entregar um confortável e quente sobretudo de veludo vermelho. O humilde pescador mal podia acreditar no que estava havendo.

Ao perguntar por sua esposa para os guardas, estes o conduziram à um salão espaçoso e enfeitado onde haviam dois tronos acolchoados e adornados de pedras preciosas. Um estava vazio e, no outro, estava sua esposa, que agora usava uma imponente túnica e uma coroa de ouro.

Daquele dia em diante, o casal passou a viver uma vida de luxo que jamais haviam antes imaginado. Recebiam suas refeições na cama, podiam solicitar a qualquer momento por massagens nos pés ou por vinho do melhor tipo. Também podiam determinar novas leis para os habitantes da região, que eles antes chamavam de vizinhos.

Até o dia em que a rainha procurou pelo rei e lhe disse:
- Querido, estive pensando... E se aquele bagre pudesse me transformar em papa?

Ao ouvir aquilo, o homem ficou inconformado com a ganância da esposa e se recusou a ir falar com o peixe, mas ela tanto insistiu e implorou que o marido foi obrigado a fazer sua vontade.

Ao chegar na praia, chamou por seu amigo bagre, que logo apareceu, com uma cara um tanto intrigada:
- Bom dia, amigo pescador! Ou devo dizer... Vossa Majestade! - cumprimentou o peixe. - A que devo o prazer de sua visita?
- Bom dia, amigo bagre. É que minha esposa quer saber se você pode torná-la um papa...
- Mas o quê?! - se surpreendeu o bagre. - Eu os enriqueço, os torno rei e rainha e agora sua mulher ainda quer mais?!
- Bom... - tentou se explicar o homem, envergonhado. - É que ela diz que sempre quis ser alguém importante na Igreja, sabe?
- Vou conceder-lhes esse desejo, mas avise sua mulher que tome muito cuidado, pois quem tudo quer, nada terá!

Nisso, o bagre mergulhou e desapareceu no mar.

O homem se pôs a voltar para casa e qual não foi seu espanto ao se deparar com uma gigantesca catedral cercada por uma multidão imensurável de pessoas que vibravam e gritavam o nome de sua mulher com admiração enquanto rezavam e faziam o sinal da cruz.

Após passar minutos tentando passar pelas centenas de pessoas no caminho, conseguiu chegar aos portões do lugar, que eram vigiados por guardas. Lá no alto, em um balcão externo da catedral, sua esposa trajava um manto dourado e acenava para as pessoas aglomeradas á frente do lugar. Ajoelhados á sua frente, alguns reis e rainhas vindos de outros países beijavam um anel que a papisa usava em seu dedo e murmuravam agradecimentos à ela, sorridentes.

Daquele em dia em diante, a vida do pescador mudou drasticamente, mas não para melhor. Ele agora mal podia ver sua esposa na maior parte do dia, já que ela estava sempre ocupada com sua comunhão e sua reza.

O homem agora dormia em um velho e apertado aposento nos fundos da catedral que lhe fôra reservado apenas por ele ser marido da papisa.

E assim se passaram semanas. A cada dia, o pobre homem se arrependia mais por ter obedecido sua esposa e até sentia rancor contra ela. Isso enquanto multidões inteiras a glorificavam todos os dias.

Passado um tempo, ele ouviu batidas em sua porta. Ao abrir, se deparou com a papisa rodeada de guardas que usavam armaduras e lanças. Com um sorriso falso no rosto, ela se aproximou do marido e lhe pediu algo em voz baixa. Ao ouvir o pedido dela, o homem mal acreditou em seus ouvidos e respondeu:
- O quê?! Você está louca?! Já não basta ter virado papisa! Não posso pedir isso àquele pobre bagre! Ele já fez o bastante por nós!

Furiosa com a negação, a mulher se virou para seus guardas e ordenou que executassem-no ali mesmo. Em pânico, o coitado teve de concordar em fazer o que ela lhe pedira.

Sendo assim, foi até a praia e chamou, receoso, pelo bagre, que logo apareceu, um tanto zangado:
- O que é agora, pescador? - ele indagou.
- Bom, amigo bagre... Desculpe, mas... Minha esposa quer algo mais do senhor...
- E o que há de ser agora?! - indagou o bagre, já perdendo a paciência.
- Ela quer que o senhor a transforme em...Deus.
- Como é?! - questionou o peixe, incrédulo e abismado. - Sua esposa não passa de uma gananciosa sem escrúpulos que não conhece limites! Eu jamais deveria ter ajudado a vocês!

Dito isso, o peixe mergulhou e desapareceu no mar.

Surpreso, o pescador voltou para onde ficava a catedral e, qual não foi sua surpresa, ao se deparar com sua velha e humilde choupana onde vivia junto com a esposa tempos atrás.

Curioso, foi bater à porta e foi atendido pela esposa, que voltara a trajar seus velhos trapos. Com isso, os dois voltaram a viver como pobres e a levarem uma vida dura e esforçada.

Daquele dia em diante, a mulher do pescador passou a ser alguém mais humilde e deixou de ter pensamentos gananciosos e soberbos.

FIM

Contos de FadasWhere stories live. Discover now