Missão II: Domingo

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- Amanhã de manhã iremos na igreja, ta? Vê a roupa pra não se enrolar. 

Foi a primeira coisa que sua mãe disse quando ela passou pela porta e deixou as sacolas na cozinha.

- Sua avó mandou tudo isso? - ela perguntou retoricamente e então se abaixou para fuçar uma das sacolas - Ah, beterraba! Que bom, vou fazer pra você comer hoje. 

- Mel! - seu irmão veio correndo e a abraçou de repente - Amanhã a gente vai na igreja. Eu vou ficar na escolinha e, se der, vou desenhar você ok??

- O que sua avó disse dessa vez, Melanie? Ela mandou algum recado? - sua mãe perguntou se levantando com as beterrabas gigantes nas mãos, o que encantou Samuel e o fez insistir para pegar uma.

- Ela disse que quer que nós almocemos na casa dela amanhã. - ela respondeu cansada - Eu vou tomar um banho, tá?

- Ta, vai lá. Depois a gente conversa.

Ela assentiu e foi para o seu quarto morrendo de vontade de se jogar na cama.

Enquanto fazia suas tarefas rotineiras antes do banho, ela ficou refletindo no dia que havia tido. 

É, parecia que a sua vida também podia sair dos eixos as vezes como qualquer outra. O que suas amigas diriam se soubessem do que aconteceu?

Ela deu um sorriso amargo. Ela não parava de pensar nisso como se tivesse feito algo muito heroico. Algo que requer uma coragem e uma força absurda quando tudo o que fez foi ter entregado um bilhete a um grupo de mães.

Talvez aquela não fosse uma história boa o suficiente para contar a sua terapeuta, afinal. Ela já podia dar adeus a próxima consulta - que seria adiada para daqui a mais de duas semanas.

Lavando os cabelos no chuveiro, ela não pode deixar de pensar que, mesmo que tivesse saído completamente da sua rotina hoje e tudo tivesse ocorrido bem - diferente de quinta-feira -, nada havia mudado. Ela ainda continuava com seus problemas não resolvidos e ainda tinha uma longa lista de coisas para mudar em si mesma. Realmente longa.

Por que a vida era tão complicada?

Quando finalmente terminou o banho, percebeu que já passava das dez da noite, o que a assustou. E apesar de sua mãe ter dito que queria conversar, ela não teve cabeça para ir para a sala de jantar e ser obrigada e ficar respondendo perguntas na frente de alguém que ela desprezava, então ela ignorou tudo e todos e foi para debaixo das cobertas.

A vida seria muito mais fácil se ela pudesse ficar ali para sempre. - E ela sabia que tudo nessa frase gritava covardia, mas não era disso que ela era feita mesmo?

Ela coçou os olhos e pegou o celular, indo direto para o AnnyTalk pois sabia que Alliff havia mandado mensagem.

Todos os dias eles conversavam. Falavam mais sobre coisas aleatórias como qual é o seu filme favorito? e você preferiria morar num lugar quente ou em um que neva bastante?, principalmente porque ela se desviava do assunto sempre que iam seguindo o caminho por onde provavelmente começariam as perguntas como você mora em qual cidade? e podemos nos ver algum dia?.

Certo, depois de dias conversando com ele e percebendo o quão gente boa ele era, ela confessava que vinha sentindo vontade de ver ele pessoalmente.

Mas não. Apenas não. 

Tudo estava perfeito do jeito que estava.

Largando o celular e virando de barriga para cima na cama encarando o teto, ela suspirou derrotada.

Talvez ela estivesse começando a se sentir... Como se dizia mesmo? Apaixonada? 

Patética, não é?

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