Sacrifícios.

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Capítulo 18: Percy.

Preparativos para a sexagésima quarta edição dos Jogos Vorazes, dias atuais.

Enchi o copo de água, voltando a repousar a jarra de vidro sobre o balcão antes de dar um gole. Gelada. Desceu rasgando a garganta, como uma bebida alcoólica teria feito.

Apoiei as palmas no balcão e tombei a cabeça para trás, encarando um bichinho que andava no teto. Um inseto pequeno que a lâmpada iluminava, que por algum motivo me remeteu minha casa no Distrito. Eu frequentemente via insetos na cozinha de lá.

Quando voltei a abaixar o olhar para beber outro gole d'água, quase me assustei com a figura parada na porta. Annabeth Chase parecia um fantasma, enrolada em um roupão de seda branco e os braços apertados contra o corpo. Seus cabelos estavam presos e os olhos pareciam cansados, mas mesmo assim me observaram atentamente.

—Você nunca fica vestido? —quebra o silêncio, caminhando para dentro da cozinha e dando a volta no balcão até parar do meu lado.

—Só vim beber um pouco de água. —me defendo, vendo-a me dar as costas para pegar um copo no armário. —Aparentemente, o mesmo que você.

Annabeth não fala nada de imediato. Estica o braço por sobre o meu para pegar a jarra e usá-la para encher o copo.

—Tive um pesadelo. —confessou, o tom meio baixo. —Não que isso seja algo incomum mas... —parou por um segundo, talvez repensando suas palavras seguintes. —Deixa pra lá.

Ela bebe metade do líquido no copo de uma única vez e a encaro com curiosidade. Nos beijamos e foi ótimo, mas Annabeth não parece dar a mínima para isso desde que saímos do terraço. Ela tem sido arrogante como quando nos conhecemos, qualquer progresso na nossa relação tendo sido completamente deletado.

—Você não precisa deixar pra lá. —tomei coragem para falar. Annabeth apertou os lábios, deixando o copo novamente sobre o balcão. —Qualquer segredo que me contar vai morrer comigo na arena. —acrescentei quando insistiu em não me olhar.

Suspirou, tamborilando os dedos na superfície de pedra antes de finalmente se virar para mim.

—Foi mais uma memória. E foi tão... real. — explicou, ainda na mesma voz baixa. —Parecia que eu estava ali, vivendo aquilo de novo.

—Uma memória dos seus Jogos? —sei que foi uma pergunta idiota, mas ela assentiu.

—Do Banho de Sangue. A primeira pessoa que matei. —voltou a desviar o olhar. —Sabe, treinei para os Jogos minha vida toda, mas nunca... bem, soube do que eu realmente era capaz. Até aquele dia.

Não pude evitar imaginar Annabeth na arena, e foi a primeira vez que fiz isso. Não assisti os Jogos dela, nem os de Luke, Reyna Ramírez ou Grover Underwood. Não faço a menor ideia de como foram as mortes ou as condições em que tiveram de sobreviver, então foi difícil. Sei que ela gosta de facas. E socos e ameaças. Mas realmente matar? Não consigo imaginar como faria.

Annabeth percebe meu silêncio. Bebe o resto do líquido no copo e se vira para colocá-lo na pia, ligando a torneira. Fico de costas para o balcão, me encostando nele e cruzando os braços. Estou sem camiseta, nunca durmo de camiseta e ela estar aqui agora é uma surpresa. Não foi proposital como no terraço.

—Vinte e duas facadas. —quebrou um longo silêncio ao qual a água pingando no fundo da pia se sobressaía. —Ela já estava morta na segunda, mas não parei. Foi como se algo tivesse desligado dentro de mim. Só queria puni-la pelo que fez com Connor.

Voltou a desligar a torneira, se virando de frente para mim. Novamente visualizei o cansaço em seus olhos, juntamente com as olheiras fundas.

Vinte e duas facadas. Vinte e duas facadas, com a garota já morta.

Sacrifice Games - (percabeth)Where stories live. Discover now