1.2 Heloísa

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— Puta que pariu, homem. O que você está fazendo aí?

— Te esperando. — Ele se levantou e enquanto meus olhos se ajustavam ao escuro do quarto, pude ver que ainda usava a roupa social, sem o paletó e sem os sapatos, mas a calça e camisa cinza-escura de botões estava bem ali.

Totó, seu irmão, era um homem loiro e Eduardo também era, mas seu cabelo era um loiro escuro e alguns fios grisalhos apareciam aqui e ali. Agora, não conseguia ver um pela falta de luminosidade, mas normalmente se sobressaiam.

Também diferente de seu irmão, que quase nunca deixava sua barba crescer, o primogênito tinha barba. Às vezes, ele a deixava rente; outras, um pouco maior. Eu não sabia porque a gente se via muito, não nos víamos muito, porque ele viajava pelo país e para fora também, sabia porque acompanhava as mudanças de foto de perfil dele. Era uma atitude infantil e meio ridícula? Talvez, mas eu gostava de ver a cara do idiota. Me julguem.

— Por quê? — questionei estreitando meus olhos e sentindo um peso surreal em todo o meu corpo, não aguentava mais ficar em pé naqueles saltos.

O vestido era confortável, mas eu preferia tirá-lo e relaxar na banheira da suíte. No entanto, aqui estava eu, esperando o Lobo Mau me responder de uma vez.

E por que ele demorava tanto para falar?

Arregaçando as mangas de sua camisa, finalmente me respondeu:

— Porque estamos casados.

Eu ri. Talvez tenha exagerado, talvez tenha gargalhado. Não me responsabilizava quando ele dizia algo tão engraçado.

— Você me mandou fazer o que eu quisesse!

— Não achei que o que você quisesse era ficar até às cinco da manhã na rua.

Dei um passo à frente e ele deu outro, mas ainda havia muito espaço entre nós dois. Queria dizer que ainda não era cinco, ainda faltava alguns minutos, longos minutos e que não estava tão tarde assim, mas pontuei o que também interessava:

— E por que você se importa, afinal? — Voltei a ajustar o nó em meu vestido e cruzei meus braços.

Dos três Tourinho, Eduardo era o único que eu não conseguia criar nenhum vínculo. Conhecia até seus poucos tios e primos e tinha alguma relação com todos, menos com ele. O homem era uma maldita pedra, por isso não me surpreendi quando ele assumiu o papel do irmão. Eduardo era racional demais para se importar, racional demais para ligar com quem quer que ele estivesse se cansado. Era apenas um papel. Não significava nada.

E isso, de certa forma, me machucava. Ao menos, a relação que eu teria com Totó seria de respeito, havia amor, mesmo que não carnal. No entanto, com Eduardo, não havia nada...

Com meus braços cruzados, encarei quando ele fez o mesmo movimento. Sua camisa social estava marcada em seu corpo e alguns botões estavam abertos, me deixando ver o princípio de pelos claros, finos.

Quando levantei meu olhar, vi que ele fazia o mesmo, me secando, porém, seus olhos estavam entre meus braços e seios e não precisei me olhar para saber que eles estavam marcados pelo tecido do vestido.

— Minha cara é aqui em cima — disse.

Devagar, Eduardo levantou seu olhar e havia tudo, menos desejo em seus olhos. Ele me olhava com... repulsa? Era isso, um misto de repulsa e talvez raiva, chateação, falta de vontade, tédio. O homem me olhava com tédio como se eu fosse uma coadjuvante desnecessária em seu livro.

Sem responder a minha afronta, deu outro passo a frente e quando achei que pararia de andar porque estava se aproximando demais, continuou. Eu normalmente não me sentia intimidada por nenhum homem. Na verdade, nunca me senti intimidada até este ponto.

Quando todo o corpo dele estava perto e seus braços descruzaram, roçando nos meus pelo movimento, Eduardo abaixou a sua cabeça, me olhando de cima, ainda como se eu fosse esse ser desprezível que não era digno de sua atenção, porém, mesmo com seu olhar de babaca completo, havia alguma outra coisa por ali que eu não conseguia identificar com clareza.

Com dois dedos, ele colocou uma mecha de meu cabelo atrás de minha orelha e, porra, não queria, mas quando seus dedos passaram por minha pele, todo aquele caminho arrepiou e eu senti a minha garganta travar, seca.

Engolir com certa dificuldade quando ele segurou meu queixo e levantou meu rosto, se explicando:

— Para todos os efeitos, como já disse, estamos casados.

— E? — Achei minha voz.

— E precisamos que outras pessoas acreditem nisso. — A forma como ele falava, devagar, paciente, mas que eu sabia que não era nada paciente de verdade, tanto me fazia ter vontade de rir quanto de bater nele.

Rir, porque era realmente engraçado como ele se esforçava para não pirar comigo de uma vez e a vontade de bater era intrínseca e surgia em quase todas as vezes que eu interagia com Eduardo. Hoje, a vontade de bater se dava principalmente pelo seu cheiro. Como era possível que depois de tantas horas, uma viagem de jatinho, após uma madrugada inteira, ele ainda cheirava bem? Não era apenas colônia, que ele pôde ter reaplicado. Meu Deus do Céu, o cheiro natural dele era bom.

A minha parte mais carnal, mais sexual, queria sentir o gosto do suor dele. Me perguntava quando ele ficava por cima, se ele suava muito, se seu suor escorria do rosto ao pescoço e que gosto tinha. Ele mordia os lábios quando fodia ou entreabria a boca a cada estocada?

Era interessante analisar como cada homem agia tão diferente no sexo. Era previsível e "esperado" que uma mulher gemesse, mas que o homem não. Porém, eu adorava as mãos grandes que pegavam no pescoço com firmeza e o gemido soprado, sem controle, no ouvido.

— Heloísa? — Soltou meu queixo e sua voz soou baixa, como se tivesse dificuldade de dizer meu nome ao mesmo tempo que parecia sempre tão entediado por interagir comigo.

Umedeci meus lábios e dei um passo atrás. Eduardo era mesmo uma delícia, mas meu corpo bêbado e minha mente carente, não me levariam a nenhum lugar que prestasse.

Às cinco da manhã, ninguém tomava uma atitude coerente.

E eu não queria me arrepender de nada. Se fosse para foder com aquele homem, eu queria estar cem por cento descansada e preparada para aguentar cada estocada e pedir por mais. Agora? Agora eu pedia por tirar meus sapatos e roupa, banho, banheira e cama. Exatamente nessa ordem.

Pisquei, voltando ao mundo real, me afastando um pouco das ideias de homens suados e que fodiam bem.

Dei de ombros.

— Podemos publicar na internet — respondi, finalmente. — Você tem alguma rede social? Tiramos algumas fotos e eu marco o seu perfil.

— Isso é o bastante?

— Acredite, muitas pessoas vivem disso, de mostrar e nada daquilo ser real. Prefere fotos ou andar como casalzinho por aí?

Colocou suas mãos nos bolsos e fechou seus olhos. A resposta era clara: ele não queria nada, ao menos nada comigo.

Era difícil saber que aquele seria, na pior ou melhor das hipóteses, o meu marido. E meu marido me desprezava tanto... Enquanto eu, meu Deus, eu queria dar tudo de mim.


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