04| O que faz ele aqui?

240 16 0
                                    

Estava a conversar com Alana, a minha coordenadora e amiga, que tinha acabado de aterrar em Tóquio para estar presente no lançamento do livro que eu tinha ilustrado.

- Está incrível, Vicky. Tu és uma excelente profissional. O teu trabalho é extraordinário.

Sinto-me corar e ela dá uma gargalhada baixa.

- Eu sempre trabalhei para pequenas editoras. Jamais imaginei que fosse tão longe.

Ela dá um sorriso doce.

- Não sejas tola. Este foi o primeiro trabalho de muitos que serão reconhecidos internacionalmente. – ela afaga o meu braço.

Faço uma careta com o seu exagero. Alana é sempre tão exagerada. Internacionalmente.

- A editora foi comprada ao Peter. – Fico surpreendida com a novidade. Peter era o diretor da Hilarious. Não fazia ideia sequer que a editora estava à venda. – E ninguém conhece o novo diretor. Espero que faças definitivamente parte da nossa equipa a partir de agora. Não tem jeito nenhum só fazeres alguns trabalhos.

- Isso não me incomoda de verdade, Al. – sou sincera. Vou fazendo umas ilustrações aqui e ali. Para livros infantis principalmente e para além disso, eu tenho os meus postais.

- Não interessa. Vou fazer uma forcinha assim que conhecer o diretor para que ele te contratar. Ele vai adorar o teu trabalho e ainda por cima, ele está a expandir a editora.

- A expandir? – franzo o cenho.

- A editora vai passar a ter escritórios nalguns países . – Arregalo os olhos com a novidade. Este novo dono veio para ser o melhor, está-se mesmo a ver.

- Sabes uma coisa, Alana? – olho para ela nos olhos.

- O quê, Vicky? – ela revira os olhos ao saber que vou dizer algo que não vai gostar.

- Não te preocupes com isso. Seja lá quem for o diretor, ele sabe o que está a fazer. Preocupa-te apenas com o que tens fazer. – dou-lhe um sorriso mas ela apenas franze o nariz.

-Vicky?! - ouço o meu nome ser prenunciado pela voz de Thomas.

Viro-me e encontro Thomas vestido com um terno preto à sua medida e uma camisa branca por baixo e o cabelo penteado como deve de ser. Os seus olhos brilham quando ele me faz uma breve revisão de cima a baixo.

- Hey! - aproximo-me dele e beijo a sua bochecha.

- Hey! - ele retribui o meu beijinho na bochecha também.

- Já conheces a Alana? – pergunto a Thomas.

- Não pessoalmente, mas já ouvi falar tanto de si, que julgo que sei mais de si como se realmente a conhecesse. – ele fala para Alana.

Alana não é nada discreta quando olha para Thomas e faz uma apreciação positiva com os seus olhos e a sua expressão muda automaticamente para interessada.

- Espero que lhe tenham falado bem acerca de mim. – ela lança um olhar para mim. Rio levemente.

- Alana, este é o meu melhor amigo, Thomas Rogers. Thomas, esta é a Alana Sutton, a minha coordenadora, mas acima de tudo, uma grande amiga. – olho para ambos mas parece que nenhum deles ouviu o que eu disse. O que raio aconteceu a estes dois?

Começam a chegar muitos convidados e somos encaminhados para uma enorme sala com imensos lugares – era mais um auditório do que propriamente uma sala com assentos. Alana despede-se de Thomas com um sorriso e um "Até já" quase inaudível e puxa-me para a enorme mesa de cedro ao fundo da sala, de frente para os assentos. Estão garrafas de água espalhadas ao longo da mesa em cada lugar com copos de cristal. Cristal? Uau, isto vai ser mesmo importante.

- Eu posso ficar aqui mesmo. – eu digo sentando-me num dos assentos da primeira fila.

- O que é que estás a fazer? – se não estivesse a sala com tantos convidados apostaria que ela estaria a gritar comigo que nem uma louca. Ela puxa-me de onde estou sentada para a mesa.

- Isso pergunto eu! – digo com um ligeiro aborrecimento na voz.

- Vais-te sentar aqui. – ela aponta um lugar à mesa.

Olho para a mesa onde já estão duas pessoas sentadas e faltam apenas outras duas pessoas para ocupar todos os lugares e depois para a enorme sala a encher-se.

- Oh não, não! – digo.

- Oh sim, sim!

- Não consigo fazer isto, Alana.

- Nem penses. Tu consegues e vais fazer isto. O teu trabalho ficou maravilhoso, trabalhaste muito para o resultado – ela aponta para a capa do livro e o escritor sorri-me quando me vê. – Trabalhaste em conjunto com o escritor e vais falar sobre isso, sobre onde e como foste buscar a inspiração para as ilustrações, é só o que tens que fazer Vicky. – ela está séria.

- Não preparei nada. – começo a entrar em pânico.

- Senta-te.

Emburrada faço o que ela manda. Ela dá-me um sorriso e vai-se sentar num lugar da primeira fila, obviamente já destinado para ela. Thomas está um pouco mais atrás.

Abri a garrafa de água e enchi o meu copo para dar um gole. Não que estivesse com sede mas precisava de alguma coisa para fazer, para não entrar em pânico e começar a fugir dali.

A outra pessoa convidada para esta sessão já tinha chegado e sentou-se ao meu lado direito, no final da mesa.

Pergunto-me mentalmente o que estou a fazer ali. Nunca me sentei assim à frente para falar do meu trabalho, ficava sempre só a assistir. Estou capaz de matar Alana. Todos os presentes na mesa falam à vontade sobre o livro. Ainda por cima, sou a única mulher sentada com os outros três homens. Poderia haver mais alguma coisa que me pudesse deixar desconfortável?

Olho para Thomas e Alana à procura de algum conforto e ambos me dão um largo sorriso. Varro os olhos pela sala e os meus olhos param exatamente na pessoa ao lado de Alana.

O tipo inglês de cabelo castanho do parque está aqui e de olhos postos em mim. O que faz ele aqui?

Falei o que tinha a falar mas não consegui tirar o olhar do homem à minha frente que insistia olhar para mim também. Passa as mãos pelos seus cabelos e parecia que os cantos da sua boca formavam um sorriso ao mesmo momento que os seus olhos brilhavam por alguma razão aparentemente desconhecida.

Eu não prestei atenção a mais nada ao que foi dito depois disso. Muitos pensamentos passavam pela minha mente.

Com tanta gente no mundo, encontro o mesmo tipo com quem falei no Yoyogi Park na apresentação deste livro.

- Tu estás bem, Vicky?- Thomas sussurra ao meu ouvido tirando-me dos meus devaneios.

Olho para ele e digo que sim. Quanto tempo estive em devaneios?

Apercebo-me que a sala está a ficar vazia. O tipo está de pé enquanto conversa com outro homem, para ser mais exata, o outro homem é que está a falar para ele, e ele permanece de olhos fixos em mim. Qual é o problema dele? O seu olhar é tão intenso. Tão carregado. Tão misterioso. Tão desconhecido.

Decido ir à procura de uma máquina de café enquanto espero para me despedir de Alana e me poder ir embora. Já estou suficientemente envergonhada por ter falado à frente de tantas pessoas e agora ainda levo alguns elogios e uns parabéns deste e daquele.

- Victoria Renner? – uma voz sexy e rouca ecoa atrás de mim e uma mão toca-me no ombro.

Viro-me e vejo o moreno que conheci no Yoyogi Park com um ar descontraído.

Ele retira a mão do meu ombro e coloca-a no bolso das calças.

- S-Sim? – fico meio atrapalhada na fala. Não estou habituada que me chamem Victoria.

- Admiro bastante o seu trabalho. – ele passa com a mão que tem de fora dos bolsos pelo seu cabelo perfeitamente cortado.

- Obrigada. – respondo dando um gole do meu café.

Amor & ObsessãoWhere stories live. Discover now