O Segredo da Anciã

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Madelina adorava contar histórias de fantasia, fábulas e ensinar seus alunos alguma coisa boa da vida, alguma lição para que não tenham que sofrer tanto. E via-os crescer... e recontar suas histórias. Bem como seus filhos... e netos.

Era agora vovó Madelina. Ou só Vó Lina. Ou ainda só Vovó mesmo. Ela gostava disso.

Mesmo quando alguém menosprezava sua história, ela ria. Mostrava as rugas, marcas das lutas e do tempo que sobreviveu nessa Terra, e dizia "Ih, meu fio, tem muito que ver ainda!".

Chegaram os bisnetos e ela lá, forte, com histórias novas. Sempre.

- Vó Lina, de onde a senhora tira tantas histórias?

Hihihihi...

Ai, como ela gostava dessas perguntinhas!

- Eu conto se você me disser de como você escolhe as cores para pintar os seus desenhos.

As crianças têm seu próprio jeito de responder as coisas difíceis, né?

- Ah, vó... eu tiro do coração.

E lá ia vó Lina contar de onde tirava aquelas histórias... que por acaso resultava em uma fábula, onde algum animal aprendia uma boa lição sobre amor ou confiança. Sorrisos. E depois as crianças iam embora.

Madelina era uma mulher inteligentíssima, de um forte coração, mas estava ficando mesmo muito velha. Os 70 chegaram.... depois vieram os 80... "Caramba, o mundo mudou. E meus netos são adultos e os bisnetos já vão pra escola!" E chegaram os 90.... e 90 e tantos.

Ela precisava usar cadeira de rodas, e as histórias pareciam estar encurtando...Os bisnetos estavam meio grandinhos e só queriam saber de smartphones. Bem, talvez aquele povo todo só quisesse saber de ficar grudado naquilo. Estava se sentindo inútil...

Nem almoçavam mais juntos. Nem mais netos nasciam... nem mais bisnetos...

A família queria seu bem estar, mas cada vez mais se afastavam... e saíam, deixando-a em casa, com sua cuidadora de idosos. Mirna, uma senhora de 50 anos. Um amor de pessoa.

Tímida, se sentindo meio cansada, Madelina pensou que talvez Mirna pudesse conversar, além de trocar suas fraldas...

E para sua surpresa, Mirna sorriu e disse "Será um prazer ouvir as histórias de uma bruxona como você!".

Uma... bruxona?

Na mente poderosa de Madelina, bruxas, que faziam parte de seu repertório de fábulas, podiam ser boas e más...

- E que tipo de bruxa acha que sou, Mirna?

Terminando de dobrar os lençóis, ela respondeu rindo.

- Ué, aquelas bruxas que tiram maldição, que ensinam a fazer remédio em casa, que faz coisa boa, Vó Madelina.

Rindo pra si mesma, ela se imaginou com aqueles chapéus pontudos.

- Eu lembro de umas histórias que contei pros meus netos e bisnetos, sabe? Tinha uma bruxinha, numa casinha de sapê, que vivia estudando a lua. Anos e anos de estudo, sem nunca dizer uma palavra... até o dia que a lua mandou-lhe um beijo e pediu poesias. "Não precisa me estudar, pequena, só me amar", a lua disse, sabe? Contava essa histórias para meus alunos, na minha época de professora... E sei que ensinei sobre amor, sobre poesia muito bem... Você gosta dessas histórias, Mirna? Ou disse que ouviria só para me fazer feliz?

Mirna trazia um café com bolachas macias. E quando colocou, gentilmente, a bandeja no colo da velha senhora, deu um sorriso aconchegante como nunca tinha feito antes.

GrimórioOnde as histórias ganham vida. Descobre agora