Stiles não é um dos caras maus

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Lydia Martin

A cena a minha frente foi tão horrível, que eu só pude fechar os olhos. Levei as mãos à cabeça, pressionando contra as orelhas e deixei meu corpo encontrar o chão. Desabei no piso desconhecido, senti as lágrimas descendo sem nenhum tipo de controle.

Tentava não ouvir. Lutava para me concentrar em qualquer outra coisa que não fosse os sons agoniantes de choro e gemidos de dor. Era Stiles que chorava. O garoto esquisito que caiu em cima de mim, me acordando e me fazendo perceber que eu não estava mais em casa.

O dia anterior tinha sido completamente comum. Fui para escola, almocei no restaurante ao lado da minha casa com meu melhor amigo e depois, passei a tarde estudando para uma prova de matemática. Dei boa noite para minha mãe e dormi.

Foi um dia completamente rotineiro até eu ser acordada com Stiles desabando por cima de mim. Eu estava em um quarto desconhecido, com um garoto desconhecido e não fazia ideia de como tinha chegado ali.

Quando o homem com cicatriz no rosto entrou no quarto e me chamou de filha, eu finalmente entendi. Ou pelo menos, entendi uma parte do que estava acontecendo.

Foi ele quem estuprou minha mãe.

Eu já tinha percebido que era praticamente impossível Stiles ter me sequestrado. Não por achar que ele fosse bonzinho, mas por ele parecer incapaz.

Ele era alto, bem alto. E parecia ser mais velho do que eu, porém era magro demais. Quase chegando ao ponto de desnutrição. Não parecia ter capacidade física de machucar alguém e pelas coisas que falava, conclui que só podia ter algum problema mental.

Nenhuma pessoa sã perguntaria se eu nunca tinha visto um homem. Nenhuma pessoa sã perguntaria o que era estupro. Muito menos ficaria me chamando de linda, quando eu tinha acabado de ser sequestrada.

Se eu estivesse certa, se Stiles fosse apenas um garoto louco, eu poderia entender. Porém, toda minha determinação foi embora no momento em que percebi que ele tentava me defender do homem de cicatriz.

No início, achei que Stiles estivesse ajudando o homem que violentou minha mãe. Achei que estivesse ajudando a me conter. Mas depois, a confusão me dominou junto com o horror do que aconteceu.

Stiles me defendeu ao ponto de ser espancado.

Eu não tive tempo de entender o que acontecia. Tentava compreender o motivo para Stiles começar a se desculpar para o homem com cicatriz. Vi tudo com o corpo paralisado, olhos arregalados. Acompanhei o primeiro murro que ele levou no rosto.

A crueldade do homem ao espancar Stiles foi aterrorizante. Por isso acabei desabando no chão de olhos fechados. Eu não aguentava mais ver ou escutar o que acontecia.

Stiles nem tentava se defender. Ele recebia chutes, socos, joelhadas. Era pressionado contra o chão, puxado pelo cabelo e nem tentava lutar. Ele chorava, se encolhia e dizia coisas como "por favor" e "me perdoe".

Era uma cena agoniante de ser ver, humilhante. Eu chorava de medo, horror e chorava por ele. Pelo garoto que eu nem conhecia, porém, era machucado por minha causa.

Apesar de estar apavorada com a situação em que me encontrava, enquanto Stiles apanhava, eu só me sentia arrependida. Arrependida por ter tentado atacar o homem de cicatriz e ter provocado aquilo. Eu não conhecia Stiles, no entanto, ele não parecia ser um dos caras maus, não podia ser. E ele estava apanhando por minha culpa.

Não sei por quanto tempo aquilo durou. Só sei que eu mal abria os olhos e espremia as mãos contra as orelhas, mas ainda assim, ouvia os gemidos de Stiles. Ouvia os estalos de seu corpo que entrava em agonia no chão.

Em algum momento, o homem com cicatriz parou. Eu não escutei mais nenhum som e por isso, tive coragem de abrir os olhos. Vi Stiles encolhido no chão, sangrando.

O homem olhou para mim. Ele sorriu com deboche e apontou um dedo na direção do corpo caído. Devolvi o olhar, tentando mostrar uma coragem que eu não tinha dentro de mim. Não queria ceder, não queria demonstrar meu pavor.

— Acho que você já percebeu que ele nunca vai conseguir proteger ninguém! — Ele parou de falar. Olhou para Stiles e.... cuspiu! Cuspiu em cima do garoto louco que apanhou. — Só falta entender que tem que me respeitar se quiser continuar viva.

Pensei em muitas formas de responder, de o afrontar. Porém, meus olhos focaram no corpo caído de Stiles e eu temi por sua vida, mesmo sem o conhecer. Tive medo de que se eu falasse algo ruim para o homem de cicatriz, ele voltasse a bater no garoto.

Stiles não parecia ser capaz de aguentar mais algum soco.

Acho que o homem disse outra coisa, mas não tive certeza. Só prestei atenção quando vi a porta do pequeno quarto sendo fechada. O homem com cicatriz saiu e eu fiquei, mais uma vez, sozinha com o Stiles.

— Stiles? — Testei chamá-lo pelo nome e esperei alguma reação vindo dele, entretanto, nada aconteceu.

Permaneci de joelhos e rastejei até ele. Com desconfiança, coloquei as mãos sobre a cabeça coberta por uma cabeleira negra e virei o rosto do garoto para cima, tentando enxergá-lo.

Ele tinha desmaiado. Sua pele antes pálida, estava coberta de vermelhidão e marcas roxas. Seu lábio inferior sangrava e o olho esquerdo começava a inchar.

— Você precisa ficar bem. — Murmurei com insegurança e passei as mãos sobre o rosto suado do garoto. — Precisa me dizer que lugar é esse...

Xinguei-me internamente pela minha fala egoísta e logo em seguida, espremi os lábios um no outro. Eu não podia querer o bem de Stiles só para saber o que tinha acontecido comigo e descobrir qual era o nome do homem de cicatriz.

Eu tinha que cuidar de Stiles porque se ele não tivesse me defendido, eu que teria sido espancada.

— Eu vou fazer você ficar bem. — Não tinha certeza daquilo, porém disse na esperança de que se Stiles escutasse, fosse se tranquilizar.

Decidi que enquanto não descobrisse se Stiles era apenas louco, ou vítima de tudo aquilo, eu não ia voltar a atacá-lo. Antes, eu precisava descobrir quem ele era.

Foi bom poder me concentrar em Stiles, nas feridas dele. Só assim, pude parar de pensar sobre o fato de ter sido sequestrada. Permiti que todos os meus pensamentos focassem em algo que tinha solução, como tentar levantar o garoto e colocá-lo na cama.

Para um adolescente desnutrido, Stiles era muito pesado. Eu mal consegui sustentar seu peso e quase o derrubei três vezes no chão. Porém, depois de cinco tentativas, finalmente o coloquei em cima da pequena cama de solteiro.

A partir daí, foi mais fácil. Descobri que no pequeno quarto tinha um banheiro ainda menor. Rasguei um pedaço do meu vestido, molhei o tecido e usei para limpar os resquícios de sangue que cobriam o corpo de Stiles.

Lutei para deixá-lo limpo, livre do suor e do sangue. Ajeitei um travesseiro debaixo da sua cabeça, rezando para que ele estivesse respirando bem. Vi os hematomas surgindo aos poucos, colorindo toda a sua pele exposta. Esperei.

Esperei tanto que ele acordasse, que senti minhas pálpebras pesarem e lutarem contra minha força de vontade. Por fim, o sono venceu. A inconsciência me dominou pelo que me pareceu longos segundos e então, finalmente ouvi um resmungo alto o suficiente para me acordar.

Assim que voltei a abrir os olhos, vi o rosto de Stiles voltado a minha direção. Seu olho esquerdo estava tão inchado que não abria, mas o direito estava levemente arregalado. Seus lábios estavam deformados por um corte que tinha voltado a sangrar.

— Céu?

Não era a primeira vez que ele me chamava daquele jeito, mas foi a primeira vez que atendi ao chamado, aceitando o apelido que me parecia completamente ilógico.

Levantei do chão, andei até ele e me agachei perto da cama. O meu movimento pareceu... assustar Stiles. Ele se encolheu na cama e fez uma careta de dor. Eu podia jurar que ele estava com medo de mim.

— Você está bem? — Foi a primeira coisa que pensei em perguntar.

O Pequeno pedaço do céuOpowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz