Acredito em monstros

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Existe algo além das sete partes do mundo.

Na sala, há uma porta grande madeira. Alex sempre a deixa fechada. Passa chave, envolve correntes e as vezes até coloca móveis pesados na frente. Ele nem gosta que eu fique muito tempo na sala e eu sei que é por causa da porta.

Mas eu já vi a porta aberta, quando a Lydia ainda não tinha nascido no meu quarto. Vi Alex saindo por aquela porta e depois, em um momento de desespero, tentei sair também.

Eu era menor do que sou agora. Baixo, mais magro.

Fiquei me comportando durante muito tempo para que Alex deixasse eu ficar nas outras partes do mundo. E ele deixou. Então, quando ele estava na cozinha, distraído, eu me desesperei.

Tinha conseguido pegar escondido a chave que mantinha a porta trancada e a usei para tentar me libertar. Joguei as correntes no chão, puxei a maçaneta e corri.

O sol estava forte, forte demais. Meus pés descalços queimaram e não consegui enxergar direito por causa da luz exagerada. Mas eu queria fugir. Precisava. Não suportava Alex.

Antes de ver a porta aberta, eu acreditava quando Alex dizia que não existia nada além da casa, do mundo. No entanto, depois de ter visto ele saindo, tive a esperança de ter algum outro lugar para ir.

Eu estava errado. Muito errado.

Sou burro!

Alex me alcançou enquanto eu corria e gritava para o vazio, desorientado. Ele me derrubou no chão e caiu sobre mim. O corpo grande esmagou o meu. Suas mãos grandes e cruéis seguraram meu rosto, obrigando que eu olhasse a minha volta.

"Está vendo alguma merda aqui, Stiles?!", foi o que perguntou. Lembro-me de me incomodar com seu linguajar feio e de como fiquei decepcionado ao ver que não tinha nada perto da casa, perto do meu mundo terrível de se morar.

Só tinha pedras, algumas árvores secas, grama, areia. Não tinha outros mundos, outras casas, outras pessoas. Tudo que eu tinha imaginado, sonhado, era de fato, só obra da minha cabeça. Nada daquilo existia.

"Aqui fora tem monstros horríveis que destruíram tudo, Stiles ", explicou o que eu queria nunca ter descoberto. Alex bateu em mim e contou como era perigoso ficar fora da casa.

Ele disse que tinha sido um monstro muito feio e muito grande que fez a cicatriz no rosto dele. Disse que não existia mais nada fora da casa, só pedras, árvores e os monstros destruidores de mundos.

Então aprendi que só o céu não foi destruído, e só no céu ainda existe coisas boas. Tudo terreno fora da casa se resumo a coisas ruins, tão ruins que são piores do que as coisas que eu vivo dentro da casa.

A casa, meu mundo de sete partes, é a única coisa que restou. E o céu. O céu também sobreviveu e foi de lá que Lydia veio, do mundo das nuvens onde habita tudo que é bom.

Todas as pessoas morreram. Só restou eu e Alex. Ele contou que só saia da casa para conseguir comida para mim. Disse que eu era ingrato, burro, que ele me odiava e que eu não conseguia entender que só estava vivo porque ele me protegia.

Depois disso, toda vez que fazia algo errado Alex dizia que ia me expulsar do mundo, que ia me jogar para fora da porta da sala. Eu sempre chorava e implorava para que não fizesse isso.

Não queria ser torturado por monstros. Não queria que o sol queimasse minha pele até os ossos aparecerem. Nem que meus braços e pernas fossem devorados por um animal invisível.

Isso que acontece com quem se perde fora da casa.

Por isso só existe eu e Alex.

Lydia tem sorte por ter nascido no céu. Eu tenho sorte por ela ter vindo do céu.

O Pequeno pedaço do céuWhere stories live. Discover now