dez.

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A rádio fantasma de Seven Heavens está tocando uma música nova. 

 As coisas estão mudando tão rápido desde que os Rowan se instalaram novamente na cidade, que quase não me surpreendo com aquilo. Eu sinto como se estivesse no meio de uma corredeira, anestesiada pela percepção de que nossas vidas não são mais as mesmas, sendo levada pelas águas coléricas a quedas contínuas. Ouvir Lil Nas X cantando Old Town Road numa rádio que limitava sua playlist às mesmas 42 músicas há mais de vinte anos é só mais um despenhadeiro pelo percurso.

Desisto da rádio. A música não é ruim, pelo contrário. Mas sou adversa às mudanças bruscas. Preciso de um tempo para me acostumar. E não vou conseguir isso no vestiário da St. Vincentti.

― Devíamos insistir no projeto do time de torcida para os Ice Cage. ― Coloco o meu celular na prateleira do meu armário. Meus fones estão mudos, mas começo a repensar sobre dar uma chance para a rádio fantasma novamente quando ouço a voz de Marie Belcher falando sobre líderes de torcida. ― Deus, odeio ser obrigada a fazer educação física nesse projeto de espaço poliesportivo!

Meus olhos correm por cima do ombro rapidamente para onde o som da voz de Marie vem. Eu sei que ela está com Georgia Dayrell antes que o rosto sorridente e marcante da minha ex-amiga de infância entre em minha visão. Quando o nosso grupo se desfez, Marie Belcher foi a primeira amiga de Georgia. E agora elas são como a unha e a carne. 

― Ah, não, Marie! ― A mão de Georgia puxa os próprios cabelos molhados e escuros para frente, escovando-os freneticamente. ― Já tentamos isso e não deu certo. O diretor nos proibiu!

Quando elas riem, volto meus olhos para o fundo carmim e vazio do meu armário. Claro que o diretor Jaymes Hurdle proibiria um time de líderes de torcida no gelo que não sabiam patinar e usavam o tempo em que deveriam estar treinando para se insinuarem para os jogadores. Não consigo entender até hoje como elas aguentavam o frio da arena de gelo com aquelas roupas pequenas.

É esse pensamento que leva de volta ao dia em que estive presa com Seth, congelando. Desde que ele me culpou pela morte de Pet Rowan não nos falamos mais, nem mesmo para nos atacar. Não porque acho que Seth se arrependeu. Mas porque ele e Carson parecem estar planejando algo. Seth está no comitê de formatura, para o meu mais puro azar, e Carson está tentando uma vaga no time de hóquei. E ambos querem se intrometer uma parte importante de St. Vicentti: o grêmio estudantil.

― Onde está Mischa? ― Bailey pergunta.

Se Marie e Georgia são a unha e a carne, Mischa é o esmalte descascado delas. 

― Com certeza escalando algum outro jogador. ― Quando Georgia diz isso, minhas sobrancelhas se unem. Elas sabem que estou ali, mas acham que estou ouvindo música no fone. As gargalhadas se espalham. ― Aquela garota deveria se chamar Lagartixa. Mischa, a lagartixa. Está sempre com suas ventosas presas em um local alto. No caso, a boca de algum Ice Cage.

Abro a boca para me virar e defender Mischa, mas desisto. Ela tem se dedicado à Georgia há tanto tempo que acho que merece descobrir por outra pessoa o que elas falam quando Mischa não está presente. Talvez ela já saiba, mas aceite isso. Algumas garotas simplesmente não dão a mínima para o quanto as outras podem ser más entre elas. Apenas fingem estar tudo bem para fazer parte do time.

O que me preocupa é que Cherie Murphy acredita na bondade de Georgia Dayrell. Soco o armário e suspiro. Não é alto o suficiente para encobrir as risadas das três meninas, sentadas na pia do vestiário enroladas na toalha. Eu queria que Cherie estivesse ali para poder ouvir o que Georgia está dizendo. Ela nunca mais ousaria dizer para mim que aquela garota é legal.

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