IV CAP

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SAM: horas antes
- General não deveríamos estar aqui, nem sabemos a quem pertence esta plantação, pode muito bem pertencer a um legalista - andava de um lado para o outro no grande salão, rodeado de quadros altos e tapeçarias caras, uma das únicas propriedades em bom estado nesta parte do território, Washington parecia não o ouvir sentado atrás da escrivaninha rodeado de despachos. - podemos estar a pôr em causa esta batalha só pelo simples facto de estarmos aqui acampados. - há dois dias que lhe andava a dizer o mesmo e ele apenas bufava sem se importar em responder. - General, está a ouvir-me?
- Caro coronel Heughan, meu rapaz, já trago a sua voz infiltrada no meu cérebro, isto não tem dono que se saiba foi vendida a um homem comum inglês que nunca aqui colocou os pés você ouviu a criadagem como eu, não se preocupe tanto, vá preparar os homens, falar com eles estamos num impasse, agora é preciso ver o que há de mantimentos, Dunmore está parado a entrada de Williamsburg e não consegue avançar, o povo está do nosso lado, não se preocupe tanto, o pior já passou.
Sam, contrariado mas assim fez, esperava o pai essa tarde com os despachos sobre a rendição de Yorktown, só faltava encarar Dunmore, que pelos vistos nem entraria na cidade, sabia que estas ocupações eram necessárias, não havia outra forma de dar exílio ao exército que acompanhava Washington, este era um homem de verdadeira noção de justiça, quando se prontificou a acompanhá-lo fê-lo de boa fé e consciente de que estava do lado certo da vida, como o seu pai costumava dizer, precisava proteger este homem até de si próprio, quando encontraram estas terras, Washington não se preocupou sequer em saber de quem eram, ou se seria alguma armadilha, a plantação estava realmente escondida apenas na encosta mais abaixo passava o River James que servia de caminho para os barcos que levavam o tabaco para comercializar nas cidades vizinhas, a estrada acabava aqui, e sim, ninguém viria de propósito para uma casa onde se sabia que não havia ninguém, por outro lado, poderia bem ser uma emboscada, o que sabe o gato sabe o rato, há dois dias que não dormia descansado, quando o seu pai chegasse, daria uma ajuda para convencer o General de pelo menos tentar saber a quem pertencia a maldita plantação. Depois das ordens dadas os homens começaram a tratar da horta que havia num dos jardins, os escravos que ainda ali existiam por não terem mais sítio para onde ir tinham plantado cenouras, cebolas, legumes vários, Ele não gostava muito de legumes, era uma moda nova, mas já tinha saboreado as cenouras e se os cavalos gostavam e andavam de pé a ele também não lhe fariam mal. Almoçou com Washington e redigiu uma carta a convocar o general Casimir Pulaski, o polonês, não gostava muito do homem, que olhava para ele como se o quisesse comer, mas o homem tinha uma inegável habilidade em cavalaria e seria necessário para comandar essa parte do exército, dei o ofício a assinar a Washington, que olhou para mim a sorrir
-Sam meu caro, não lhe agrada que Pulaski se mude de armas e bagagens para o nosso lado?
-Hum, General não é que não me agrade, o general polonês é um bom homem, apenas não gosto, aliás dá-me uma sensação esquisita quando me aperta a mão parece que quer ficar com ela para ele.
- ahahahahahahhah, Sam você sabe o que dizem de Pulaski?
-Não. Não sei General o que dizem? É um maldito sodomita ?
-Bem não sei, se se assumir, talvez. Mas acho que não tem essa coragem, mas se o fizer não sei quanto de culpa terá?
-General, por favor, eu não sei se o estou a entender.
-Sam, dizem as más línguas que o nosso General tem... como lhe dizer.. Tem.... - e apontava para os seus genitais, esticando dois dedos - ah, Sam, os dois sexos, sendo o masculino mais desenvolvido, mas que tem alma de donzela, percebe?
-Não. - Sam sentiu pena do homenzinho franzino
-Sim, pelo menos é o que se diz, eu nunca vi. - e endireitou-se na cadeira, passando a mão pelo peito ajeitando o casaco.
- Bem, o homem se assim for é um infeliz, coitado. - Sam com o braço apoiado na poltrona passava a mão pelos longos cabelos e com a outra caída displicentemente sobre o colo passava os dedos pelas calças.
-Pensando se deve dar uma oportunidade ao General Sam? - Washington ria desalmadamente.
-Cristo, por quem me toma senhor? - e levantou-se bruscamente. - pode parar de rir porque nem imaginando tem piada.
Nisto ouviu-se uma carruagem fora da casa, Sam olhou pela janela enquanto perguntava a Washington se tinha encomendado a seu pai que trouxesse mais alguém com ele.
- Não, não pedi mais ninguém, porquê?
-Porque ele está a tirar da carruagem a mulher mais gorda que já vi, espero que não se tenha lembrado de casar numa hora destas e que não me traga uma madrasta para tomar conta, não é hora, mas acho que vou ter de ajudar ou fica já esborrachado antes de me a apresentar. - correu a ajudar o pai, só tinha olhos para aquela senhora que não cabia na porta da carruagem e na frente dos seus olhos só via o pai pregado no chão onde só se veriam os bracinhos e as pernas a dar a dar debaixo de tantas carnes, poderia ser uma cozinheira, com aquele tamanho, seria bom que fosse:
-Pai, finalmente já o esperávamos ontem, quem traz consigo? Não me diga que trouxe a cozinheira atrás?- pegou na senhora ao colo e depositou-a no chão antes de ela cair para cima de seu pai. E disse-lhe : - Madame peço desculpa pela forma como a tirei da carruagem, mas não queria de forma alguma faltar-lhe ao respeito, um seu criado Coronel Sam Heughan.- Ouviu alguém pigarrear por trás dele e voltou-se, não deu conta de que havia uma mulher a mais no chão, só tivera olhos para o eminente acidente, voltou-se e ficou com os pés pregados no chão, de onde tinha saído aquela mulher, linda, toda afogueada, meio suja de pó com riscos na face do suor, mas com os olhos azuis mais bonitos que tinha visto na sua vida, perdeu a fala por momentos, o seu pai disse qualquer coisa, perguntar-lhe-ia depois, o nome dela, sim foi isso o nome dela Andreza, esquisito, Andreza.
-Muito gosto senhorita. Ao seu dispor - e ficamos ali parados peguei-lhe na mão beijei-a ao de leve, cheirei-a profundamente, passei o meu nariz por ela e ela afastou-se claramente, mas os olhos continuaram ali num reconhecimento
- Obrigada coronel. O gosto é todo meu.- disse numa voz delicada mas impressa de tenacidade.
Fomos para dentro onde continuei no meu suave escrutínio, finalmente a dona da casa, afinal uma linda mulher, sem ninguém, sem marido, seria? Sim apenas a senhora gorda que olhou para mim como se brandisse mil vassouras no ar para me afastar da sua pupila. Cristo, eu não precisava de mais batalhas. Mantém-te quieto e sossegado no teu canto faz o teu trabalho deixa o Washington, homem já enamorado por outra, tratar do resto, afinal foi ele que lhe ocupou a casa sem mais.. Ele que resolva. De repente ouviu e sentiu mais do que queria, quando a ouviu dizer: - "Eu é que sou uma humilde criada ao dispor da causa que apregoa e defende, o lado certo da vida", ficou preso ao chão, uma mulher com consciência social, uma mulher bonita como só ela com consciência social, era demais para um só pacote. Olhei de soslaio para o meu pai, que olhou para mim e sorriu percebendo que aquela frase era tantas vezes usada por nós, ouvi-la saída de uma boca tão formosa acendeu em mim luzinhas, tal qual os pirilampos que minavam as florestas da Virgínia. Ouvi e compreendi quando disse que manter aquela casa custava dinheiro, pedindo desculpa por ser prática, e indo de encontro à tudo o que eu pensava dei-lhe razão dizendo-lhe que tinha toda a razão em o ser. Só mostrava que não era nenhuma menina, que sabia o que estava ali em causa. Olhou novamente para mim, aquele reconhecimento estava ali da mesma forma que antes, nunca a tinha visto em toda a minha vida mas parecia que a conhecia de todo o sempre, o meu corpo vibrava a cada nota da sua voz e sorri-lhe recebendo um sorriso de volta.

Andreza
Subi para o quarto, era lindo uma grande cama de dossel, alta e macia um verdadeiro colchão de penas, como o que tinha em casa, não, agora esta era a minha casa, abri as janelas para entrar o fresco da tarde.
- Bem minha querida, vou-lhe preparar um banho quente, para limpar as poeiras da viagem, e depois descanse um pouco, vou ver o que haverá naquela cozinha, talvez peça ajuda a uma das moças, acha que faço mal?
- Não porquê?
--Ah! São negras, e devem ser escravas acha que lhes deva pedir ajuda menina?
-Bem, sim por enquanto, mas seja delicada Imelda, se não quiserem não as force ou pergunte ao General Washington como costumam fazer, eu mesma iria perguntar mas preciso mesmo de um banho e você Imelda deveria ir também lavar-se antes de comer ou tratar de algo. Não preciso da sua ajuda para me banhar. Va lá, já vou ter consigo.
Saiu, daí a uns momentos ouvi baterem na porta e era uma criada branca com uma escrava, que traziam a tina e uns cântaros de água quente, corri para elas para ajudar.
-Menina, por favor deixe que nós tratamos de tudo.
-oh, obrigada. Hoje vou aceitar, estou realmente muito cansada... obrigada. - entreolharam-se estranhando , mas aprontaram o banho sem mais conversa. Após terem saído retirei o resto das minhas roupas e deitei-me nua na tina, a água estava morna, perfeita, lavei os meus cabelos com sabão, cheirava a alfazema dos campos, esfreguei o corpo também, ah já parecia a minha pele, teria de tomar cuidado com o sol, a pele inglesa não gostava de muito sol queimava-me com facilidade, teria de ver do meu chapéu grande de abas largas, seria bom para usar aqui, o que eu iria fazer com os escravos? Não tinha coragem de os mandar embora, se não tinham ido ainda era porque não tinham para onde ir, como seria dar-lhes a liberdade, sabia que o exército inglês tinha alforriado alguns homens mas apenas para servirem no exército, eu queria alforria-los a sério, sabe-los livres, mas como? sempre lhes poderia propor receberem um salário em troca de trabalho afinal, isto era uma plantação de tabaco e rica poderia voltar a fazer o mesmo, ninguém precisava de saber que eu lhes pagava, seriam escravos no papel e enquanto isso ia tentando devolver a liberdade de cada um mas teriam de ficar, recebendo um salário, até à apanha das folhas., depois quem quisesse ficar, poderíamos entrar em acordo, logo se veria. Passei as mãos pelo meu corpo, senti-me macia, de repente uns olhos azuis, um cabelo loiro cheio de tranças, pairava sob mim, deveria ser metade índio, será que a sra Heughan era India, o pai não era, mas ele tinha todos os traços ali naquele rosto cinzelado, muito bonito, aquela boca, a sério, aquilo não era a boca para um homem, mas ficava-lhe bem. As mãos dele eram grandes com dedos compridos, mãos de trabalho, mas que deveriam saber como acariciar uma mulher.. De repente sentei-me como se tivesse sido picada por mil abelhas - Santo deus , Andreza criatura, se o teu pai te ouvisse pensar, perdoa papá, perdoa-me e obrigada por tudo. Puxei pela toalha - Além de que talvez possa existir também uma sra Sam Heughan - Senti um pequeno peso no coração.

Onde Tu Fores... IreiWhere stories live. Discover now