No consultório

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 O sol está radiante, e a leve brisa que sopra no parque dá uma sensação gostosa quando ela estica as pernas no assento do banco e joga a cabeça pra trás, Ochako fecha os olhos por um segundo e só pensa em como seria bom tirar um cochilo ali na grama. O processo de dormir é o mesmo tanto nesse mundo quanto no seu e, pelo menos em seus sonhos, ela pode estar onde deveria estar: na U.A., com seus amigos, nada de barrinhas de intimidade, tsunderes, yanderes, nada disso. A essa hora, Ochako estaria saindo da academia com a Mina e conversando sobre o que haverá pro jantar. Se hoje fosse uma terça, o encarregado da cozinha seria o Sato, mas em sua contagem que pode ou não estar certa, hoje é quinta, o responsável seria, então...

O Bakugou sempre foi brutalmente honesto, é como se não houvesse um filtro que o contém. Verdades agressivas, às vezes cruéis, mas sobretudo, verdades. O loiro pode ser de um tudo, menos mentiroso. Covarde também não.

E aqui nesse mundo ele é as duas coisas.

Nem a decepção de ter que lidar com um Deku muito mais frágil do que o verdadeiro, ou a de uma Tsu que não gostava dela a princípio, nada disso doeu tanto quanto a revelação mais recente. Ele a empurrou, e ok, Ochako acredita que o Bakugou poderia estar atordoado ao ter acordado, claro que acredita, ela também acordou completamente perdida, dá pra entender que ele não teria feito de propósito. O problema realmente não é esse.

É ele não ter contado. É ele ter continuado agindo como o dono da razão pra cima dela por tantas vezes, ter testemunhado o quanto alguns momentos foram difíceis, o quão dividida ela sempre ficou entre abrir mão de quem é pra agradar esses personagens e ser fiel a seus princípios, como ela vem lutando pra não se afundar, mas também pra não curtir muito isso tudo ao ponto de parecer que está gostando de estar aqui. Ochako não gosta, o Bakugou também não, claro, mas a forma como ambos lidam com o medo, a frustração e a dor é completamente diferente. E a forma dele lhe machucou, um pouquinho fisicamente, mas muito mais emocionalmente.

Ou seja, ela está experimentando uma sensação que nunca imaginou sentir por alguém como o Bakugou. Eles podem não ser tão próximos, mas Ochako sempre o admirou por sua postura em batalha, nunca deixará de ser grata pela forma respeitosa com a qual a tratou na luta deles, e em alguns momentos em que se via orbitando no grupo mais próximo do loiro, ela chegou a se perguntar como seria ser amiga dele. A garota sempre imaginou que ele é do tipo que faz pequenas gentilezas de maneira extremamente violenta. Dinheiro emprestado? Ele enfiaria um maço de notas no bolso dela e exigiria que ela ficasse quieta sobre quando ou como devolveria. Dúvidas nos estudos? Ele viraria a noite explicando tudo e batendo o livro na mesa em frustração com cada erro. Melhorias em combate? Ele não deixaria a academia com ela até conseguir pelo menos um olho roxo ou qualquer outra prova de que foi acertado, prova do quão bom é em instruir e orientar alguém, qualquer um. Ele põe paixão em tudo que faz e não aceita nada menos que a excelência, mas isso aparentemente é só no mundo deles.

Aqui ele é só um vilão, um vilão que é assim apenas por... por ser. E Ochako está extremamente decepcionada.

— Senpai? — a voz do Deku a traz de volta, e quando olha nesse par de olhos esmeraldinos, ela percebe que já deve fazer um tempinho que ele está tentando chamar a atenção dela.

— Hum?

— Tá... tá tudo bem?

— Ah... tá sim. — ela sorri — Por quê?

— A-ah, por nada...

— É porque parece não estar. — a Tsu o interpela, sentada ao lado do garoto de cabelos verdes e olhando para seus pés na grama, e então ela a olha — Você está estranha.

— Eu não tô sempre "estranha" pra você, Tsu-chan?

— Sim, mas agora é diferente. É um estranho ruim.

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