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Há 3 anos Marcela não tinha nenhum conhecimento da existência do povo de Nascár. Naquela época era apenas uma cativante adolescente de 15 anos. Tinha 1,52 e um corpo franzino, seus cabelos lisos roçavam-lhe os ombros, e eram tão pretos que faziam um contraste perfeito com sua pele clara. Seus olhos eram cor de mel e o sorriso era desses que encantavam a todos. Embora fosse muito bonita, nunca se importou com a aparência. Fazia o estilo "menina moleca". Adorava andar descalça, com os cabelos soltos e definitivamente não ligava para roupas ou maquiagem. Marcela era como um "bicho solto", desses que gostam de brincar rolando na terra. Por conta disso, sempre sentiu uma forte identificação com os animais. Era apaixonada por eles, mas até aquela idade, jamais havia tido um animal de estimação.

Foi criada pelo avô, Pedro Mansur. Levavam uma vida nômade, dificilmente passavam mais de dois anos no mesmo país. Desta forma, viveu em diferentes partes do mundo e aprendeu diversas línguas. Aos 15 anos de idade, Marcela já falava português, inglês, espanhol, francês, e alemão. Mas a impossibilidade de estabelecer raízes em qualquer lugar que fosse a incomodava. Sempre que chegava a hora de se mudar, perguntava ao avô o motivo. -Um dia você vai entender. - Era a única coisa que ele respondia.

No auge de seus 65 anos, Pedro Mansur continuava sendo um homem forte e destemido. Tinha cabelos brancos e compridos, que ele prendia como um rabo de cavalo, e uma barba branca muito bem aparada, que lhe conferia um charme todo especial. Era do tipo que não falava muito mas sabia se impor em qualquer situação. Mas apesar do seu jeitão fechado, Marcela nunca deixou de se sentir amada e protegida pelo avô. Era também um homem de sangue frio, que sabia se livrar com inteligência de qualquer situação de perigo. Por isso não deixava de ser irônico que alguém assim tenha encontrado a morte ao dormir, picado por uma cobra.

Viviam na Austrália quando uma Taipan-do-interior, a serpente mais venenosa do mundo, se alojou em baixo da cama de Pedro, e o picou na calada da noite. Marcela ainda pôde ouvir o som do abajur se estilhaçando no chão enquanto seu avô se desesperava por não conseguir respirar. Foi só o tempo de correr até o quarto de Pedro e ver a cobra no chão e seu avô agonizando sobre a cama.

-Nunca deixe que destruam quem você é de verdade. - foram suas últimas palavras antes de sucumbir ao sono eterno.

Mas quem ela era, Marcela ainda não sabia. Seu avô se foi sem nunca ter lhe dito nada sobre suas raízes. Não foram poucas as vezes em que Marcela perguntou de onde ela veio e quem eram os seus pais. Informações que seu avô simplesmente se negava a conceder. Misterioso como ele só, respondia apenas que no dia que ela descobrisse, sua vida mudaria para sempre. E de fato, ele estava certo.

Até que na manhã do dia seguinte, enquanto jogava terra sobre o corpo do avô, em uma cova que ela mesma havia cavado instantes antes no quintal de casa, percebeu que estava sendo observada por um vulto.

-Quem está aí? - perguntou a menina com a pá levantada ao ar, como se empunhasse uma espada. Então o vulto saiu de trás da árvore de onde se escondia e Marcela pôde ver o homem alto, forte, moreno, de voz grave e imponente que a vigiava em silêncio. Aparentava ter por volta de 40 anos de idade, os cabelos eram negros e curtos e o olhar tinha a firmeza de quem não dependia das palavras para impor autoridade.

-Abaixa essa pá, menina. Você não pode fazer nada contra mim. - disse o homem, com tranquilidade.

-Eu posso acertar essa pá na sua cabeça se você não me disser agora o que está fazendo aqui.

-Tem razão. Você pode. E se fizer isso, eu não vou resistir. Mas você vai ficar sem as respostas que sempre te foram negadas. Quem você é? Não é isso que você sempre quis saber? Você carrega um legado, menina. Seu destino foi traçado desde o dia em que nasceu. E sua missão é gloriosa. Muito maior do que você possa imaginar.

Os Sentinelas do LeãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora