✥ㅡ EPÍLOGO ㅡ✥

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   A escuridão era infinita.

   Eu não sentia minhas pernas. Não sentia meus braços. Todo o meu corpo estava dormente desde que eu me encolhi em uma bola no momento em que fui presa aqui.

   Não abri os olhos. Não queria ver a escuridão. Não queria lembrar do tempo em que Kennai me prendia no armário minúsculo e escuro e me mantinha lá por horas até que todas as lágrimas tinham secado e minha garganta estava arranhada de tanto gritar. A sensação de pavor era a mesma.

   Eu estava contida. E no escuro.

   Eu não me lembrava muito do que aconteceu no convés mais cedo. Mas sabia que tinha me transformado em algo que não era visto há muito tempo, dado o olhar de puro choque no rosto de Dakar e Korian quando me encararam. Eu tinha sentido cada onda de fogo me consumindo, e tinha sorrido como nunca antes quando a sensação gloriosa de ter o meu poder de volta fluindo pelas minhas veias.

   Mas eu não sabia controlá-lo como deveria. Não sabia como mirar o fogo, ou como criar uma onda maior de poder para causar mais danos. E isso me pegou desprevenida, deixando para eles uma ótima oportunidade para me capturar. Oportunidade que eles não perderam. E me aprisionaram.

   Eu não tinha noção de espaço aqui. Era como se meu corpo estivesse flutuando constantemente dentro daquela bolha de escuridão, tão densa que eu não podia ver se tinham paredes. Era infinitamente a mesma sensação de perdição. Até chegar o momento em que eu pensava que via imagens perdidas no escuro quando abria os olhos para espiar.

   Eu via os olhos azuis me encarando de volta. Ou via os de Yura, tão lilases quando uma orquídea, depois que ela os revelou apenas para mim, confirmando sua identidade de bruxa. Via os olhos castanhos de Grant olhando para mim pouco antes de morrer. E até mesmo os de Lena, pretos e grandes, sempre de olho em mim como ela prometera.

   O pânico tomava conta de mim a cada momento do dia. Não sabia onde estávamos, o que estava prestes a acontecer, ou que dia era. Não sentia meus poderes, por mais que não houvessem algemas ao redor dos meus pulsos. Mas com o Círculo nas mãos de Dakar, ele podia me conter e me controlar da forma que desejava. Não sabia exatamente como minha magia se assemelhava à do Círculo para que ele aprisionasse tanto a mim quanto meus poderes ao mesmo tempo.

   Mas não me importava o suficiente para pensar sobre isso. A escuridão caía sobre mim como um cobertor que eu não conseguia tirar. Não era como em meu quarto, onde eu podia encarar a lua da janela bem ao lado da minha cama e sonhar com o homem que sempre tinha a capacidade de me acalmar. Ali, eu não estava dormindo. Não me permitia deslizar para a inconsciência porque não sabia o que podia me atormentar nos sonhos. Afinal, não tinha ninguém para correr.

   Eu sufocava os soluços que lutavam para escapar do meu corpo, principalmente porque me negava a entrar em pânico. Mas era tão difícil suportar a dor quando fechava os olhos e tudo o que eu via era a expressão vazia de Grant me encarando no escuro. Então eu me fechava ainda mais, choramingando para o nada e sussurrando sem parar que isso era real.

   Como Yura suportava isso tudo? Depois que eu a descobri como bruxa, depois que ela me mostrou a verdadeira cor de seus olhos e de onde veio, pude perceber que ali havia mais dor do que eu já tinha imaginado. Eram anos de sofrimento que não se resultavam em apenas Dakar e seus estupros. Ela já sofreu bem mais, e só esse pensamento foi o suficiente para que eu quase caísse de joelhos naquele momento. Mas ela sussurrou em minha mente para que eu fosse forte. Para que mostrasse a esses filhos da puta que eu poderia desafiá-los e vencê-los.

   Mas todo o desafio se foi. As chamas que antes se formaram asas, se desfizeram em cinzas. A luz quente brilhando em meu peito e testa não existia mais e foi substituída pela frieza de sempre.

   Não existia quaisquer esperanças ali para mim.

   Por isso, apenas deitei e fechei os olhos, rezando para o que quer que eles tivessem planejado para mim, acabasse muito rápido.

   Eu não estava tão segura assim que eles pretendiam me subjugar completamente para me destruir pouco a pouco. Certamente que não fariam isso; estavam tramando algo muito mais substancial. Algo que eu não pudesse controlar.

   Mas eu estaria preparada para quando chegasse a hora de atacar. Porque Korian não sabia quem eu era; não sabia a obstinação correndo em minhas veias, mesmo que a força maior anterior tenha evaporado como fumaça. E mesmo que a dor queime em meus músculos, enfraquecendo-os até que não tenho mais forças para segurá-los, continuo com a mente aberta, lutando para não permitir que a sombra deles penetre em minha mente. E assim começo a traçar meu plano.

   Porque eu nunca procuraria uma guerra, mas jamais fui conhecida por abandonar uma luta.

   Então eles deveriam estar preparados. Porque se eu sou mesmo quem eles dizem que eu sou, há muito mais que eu ainda não conheço. Ah, mas estou prestes a conhecer.

   Então eu farei a merda do mundo queimar.

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FIM

A ƑILHA ƊO ƑOƓO - A MALƊIƇ̧ÃO ƊO SOLSƬÍƇIOWhere stories live. Discover now