Extremidades opostas

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"Levando ele mesmo em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro, para que, mortos para os pecados, pudéssemos viver para a justiça; e pelas suas feridas fostes sarados."

⸺ 1 Pedro 2:24

Lembra do meu combinado de ir até a biblioteca com os outros? Foi adiado para outro dia durante a tarde que por sinal, estava acontecendo agora.

Sohyun avisou para todos os outros alunos que iria rolar uma tarde de jogos na biblioteca. Todos ficaram animados com a ideia pois raramente faziam alguma coisa diferente naquele ambiente, suas rotinas eram sempre as mais monótonas possíveis e tediosas. Era preciso de um pouco de emoção, nem que ela possa ser encontrada com coisas normais lá de fora e em simples apostas.

Confesso que naquele hora estava um pouco receoso pensando se Heeseung viria. Desde o dia anterior quando fui até seu quarto e ele me tratou daquele jeito, estava sem saber o que fazer e com um pouco de medo, talvez.

Medo pelo que Jake me disse no dia anterior. Suas palavras soaram um tanto fortes quando se referiu à palavra "Assasinato" que me deixava meio apreensivo em como aquilo supostamente teria acontecido.

Não conversei com mais ninguém sobre isso além de Jake, nem mesmo para Sohyun, justamente pelo fato de que ela me arrancaria a cabeça. Nos conhecemos a apenas um mês, e eu já a conheço o bastante para saber que não seria algo impossível de acontecer.

Sohyun era uma menina legal, gostava de conversar com ela sobre vários assuntos e podia considerá-la uma pessoa aberta, embora demonstre ter uma autoconfiança inabalável, evita contar muito sobre sua verdadeira origem e causa de sua estabilidade em um lugar como esse. Mas isso era o de menos até então, ela tinha total direito de decidir manter tudo em branco em relação ao seu passado.

O que era compreensível, não a julgo, tão pouco o faria. Às vezes tudo o que mais queremos é mudar o passado, e por isso ser algo impossível de acontecer, optamos por escondê-lo até que magicamente, ele desapareça.

Niki era um garoto meio desprovido de arrependimentos, fazia absolutamente tudo que passava em sua mente e embora esteja aqui, vivia sua adolescência da maneira que podia e eu o admirava por isso. Por se permitir sorrir em um lugar como esse, e a lidar com o preconceito por si só devido a ter se descobrido tão novo quando na verdade, o certo era estar sendo ensinado sobre isso, sobre o preconceito que sofriria, e sobre a alienação religiosa.

Jisung era corajoso, nunca se envolveu em nada que queimasse sua pele mesmo que vivesse de maneira arriscada por ter um propósito diferente ali dentro, e um amor do qual ainda não fora correspondido, embora suas investidas fossem muito bem recebidas. Tinha o sonho de sair dali e viajar pelo mundo, de conhecer novos lugares e estudar arte como dança, teatro e música.

Jake é sábio e cuidadoso, tinha conhecimento de pelo menos metade das coisas que aconteciam ali e muitos mais. Sempre que precisava de algo, procurava meios para resolver qualquer um de seus problemas. Tinha um bom coração, sempre cooperava com os outros e os ajudava caso fosse preciso.

E eu Park Sunghoon, não era nada. Não tinha uma ideia e nem um propósito que gostaria de seguir, vivia pela vontade dos outros e sabia que isso não era certo. Mas não tinha motivos para me revoltar contra isso, já que perdi tudo o que pouco a pouco conquistei, que cá entre nós, era uma miséria que juntei ao longo do tempo.

Mas estava tudo bem, eu acho. Aos poucos estava me acostumando com tudo isso. E talvez, eu pudesse suportar a maioria das coisas ali, porque tinha boas pessoas ao meu lado, e isso era bom.

Quando regressei no ambiente cumprimentei os garotos que já estavam lá, indo me acomodar pelos fundos visto que o lugar estava mais cheio do que o planejado. Aglomerações costumavam me deixar um pouco desconfortável. Quando desviei meu olhar ao redor, afim de enxergar a extensão do lugar tive a visão do garoto motivo de fofocas dos corredores do internato. Ele estava sentado em uma das escadas de madeira conversando com mais duas pessoas. Ele veio.

Fiquei o fitando por um tempo indeterminado e o motivo? Não me pergunte. Só fui perceber que estava o mirando demais quando esse voltou seu olhar em minha direção, me fazendo sentir algo se remexendo dentro de mim de maneira sensível, aquele olhar me dizia coisas que eu não sabia explicar e tão pouco decifrar o que estava me sendo dito.

Quebrei aquele contato tentando ignorar sua presença mas seu olhar continuava queimando sobre meu corpo, que estranhamente começava a esquentar como se estivesse em estado de febre. Fui para os fundos procurar alguma coisa que me distraia como o planejado. Talvez algum livro que me intrigasse, já que não estava muito afim de jogar com os outros.

Logo ele me persegue, aparecendo ao meu lado me fazendo pular de susto.

⸺ Eu não irei mais me meter em sua vida não precisa se preocupar então por favor você pode parar de me... ⸺ Tentei me defender antecipadamente antes de ser cortado, pensei que ele tivesse vindo aqui apenas para me dizer em como fui invasivo naquele dia.

⸺ Não deveria ter me alterado daquele jeito ontem, sinto muito por isso.

O que...?

Um silencioso tomou conta daquele espaço, enquanto me permitia ficar estático com sua fala repentina.

⸺ O que você quis dizer quando disse que eu seria igual os outros?

⸺ Os boatos sobre mim, com certeza já deve ter ouvido sobre... As pessoas gostam de falar o que não sabem. ⸺ Desviou o olhar, suas mãos se encontravam dentro de seu casaco, o que me faz estranhar uma coisa, estava muito calor ali, e ninguém se encontrava com roupas como essa, talvez ele estivesse escondendo seus hematomas.

⸺ Então, elas estão erradas?

Heeseung não respondeu, parecendo incomodado e trincando seu maxilar bem marcado.

Então era verdade.

⸺ Na verdade eu soube, sim. ⸺ Respondi.

Mais uma vez me vi sendo vítima daquele olhar, que agora estavam diferentes do anterior, esse era meio... atento?

⸺ O que está fazendo aqui parado então, não vai se afastar?

Com a coragem que não sabia que existia, dei um passo à frente me aproximando ainda mais de sua estrutura, e fiz a pequena pergunta em um sussurro.

⸺ É verdade o que eles dizem? Porque por algum motivo, eu não consigo acreditar que você seja assim...

⸺ Não sabe o que está fazendo.

⸺ Me conte, então.

⸺ Não posso.

⸺ Tudo bem, as pessoas diriam que eu sou louco se me ouvissem falando isso mas eu acredito em você, Heeseung. ⸺ Terminei antes de voltar para onde todos não ouvindo mais uma palavra vinda de si.

Não me arrependo de ter dito tais coisas, muito pelo contrário. Por algum motivo, não conseguia odiá-lo como os outros. Não sentia que era certo, eu precisava conhecê-lo.

Shim me chamou para jogar e acabei aceitando, me rendendo por fim. Antes, pude perceber Heeseung voltar de onde estávamos, também dessa vez alheio a qualquer coisa em sua volta, saindo da biblioteca em seguida.

Algumas coisas mudariam a partir daquele dia, aquela relação, sentia isso.

To be continued...


A partir de agora a história de Heeseung passará a ser contada de pouco em pouco. Vocês vão começar a entendê-lo melhor!

𝐅𝐀𝐋𝐋𝐈𝐍𝐆 𝐃𝐎𝐖𝐍 | heehoonWhere stories live. Discover now