Anjo caído

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Momentos depois de entrar em seu quarto, bateu a porta com força fazendo um estrondo soar por todo o cômodo. Quem estivesse passando por aquele andar ouviria o barulho repentino. Bagunçava todas suas coisas como um furacão, antes de procurar a pequena caixinha que deveria estar ali, mas porque não estava? Droga, onde será que a colocou?

Sentiu-se aliviado quando finalmente a achou, estava de baixo de sua cama. Não sabia como ela tinha parado naquele canto mas não se importava. Tomou uma, duas pílulas de uma só vez, deixando a caixa vazia, se certificaria de conseguir mais depois. Sua cabeça doía e tudo girava, não aguentava mais lidar com aquela pressão que vinha de si mesmo. Se sentia culpado e injustiçado, as sombras do passado faziam questão de virem a tona cada vez mais.

Ele jamais se esqueceria daquela noite.

"Estava chovendo quando tudo aconteceu, odiava chuvas. Os trovões o assustavam naquela época mesmo que não admitisse, aquilo era coisa de gente fraca e não gostava de se sentir assim. O barulho do assoalho velho sendo pisado o dava agonia, alguém tinha entrado ali e estava se aproximando, mas quem? não havia ninguém ali, pelo menos a alguns minutos atrás.

Se escondeu dentro do escritório que seu pai costumava usar, se encolhendo em um canto afastado, pensando no que havia feito. Não foi sua culpa, foi? não tinha feito nada de errado ou tinha? Eles vieram para cima primeiro. Fechou os olhos desejando que tudo aquilo fosse um pesadelo, enquanto escutava os passos ficando cada vez mais altos a cada momento. Por fim, a porta se abre..."

Aos poucos seus pensamentos foram sendo colocados em ordem, o calmante estava fazendo seu efeito e isso era ótimo. E No meio daquele caos que estava sua mente, algo a mais o atormentava, aquela garoto... Porque ele diria aquilo? Para ter aquele pensamento tão diferente de todos os outros deveria ser, no mínimo, louco.

"Eu acredito em você."

Acreditar... Em sua visão aquilo soava irônico. Nem Heeseung acreditava nele mesmo, quem dirá um novato que mal o conhecia e chegara há apenas dois meses.

Ninguém nunca o mostrou essa confiança por si antes, exceto por Jay. O garoto foi o primeiro e único a tentar lhe acolher de verdade como um amigo. Embora muitas vezes, tenha desconfiado do outro. Nunca baixava sua guarda, até para pessoas próximas.

E isso não era sua culpa, não era como se sentisse bem fazendo isso. Apenas tinha dificuldades para identificar segundas intenções, durante toda sua havia sido vítima de pessoas que prometeram o ajudar, que o fariam superar todas aquelas coisas.

Foi traído uma, duas, incontáveis vezes. Isso porquê decidiu confiar nas pessoas, as mesmas que não hesitaram em apontar o dedo e dizer que sim, ele estava louco, que tinha perdido a cabeça, que estava doente.

E pra piorar ainda tinha eles. Os guardas pareciam ter um certo tipo de prazer em o torturar, mais ainda que os outros alunos que também quebravam algumas regras. Justamente por ser considerado gayzinho, era isso que diziam mesmo depois de deixar esclarecido que não tinha problemas com qualquer sexo, seja femino, masculino ou qualquer outro. O ponto era que ele não ligava para isso, não mesmo, mas odiava ter que aturar aquilo. Principalmente, do abuso que sofria deles, abusos que não só envolviam tortura mas que também diziam palavras sujas para si, dizendo que se ele oferecesse seu corpo não o tortuariam mais. Heeseung apenas ria da cara deles e os provocava, dizendo que preferia passar o resto de sua vida apodrecendo naquele inferno do que se entregar a qualquer um deles, e isso os enfurecia.

Perdeu as contas de quanto tempo estava nessa. Fazia anos, desde a sua chegada. Cresceu dentro daquele ambiente sem ter a mínima ideia de como estava lá fora, visto que era proibido qualquer contato sem as permissões de seus responsáveis.

E não tinha ninguém.

Já pensou em fugir mas não tinha como, os portões eram extremamente seguros e tinha seguranças e câmeras de segurança. Era um verdadeiro inferno e presidiário, não exagerou em momento algum.

Talvez tivesse aceitado o seu destino, não acreditava nessas coisas, tão pouco. Mas sabia que daquela vez, não existiria escapatória.

Sunghoon estava na sala de aula, quando ouviu cochichos vindo da parte de trás, a princípio não deu muita importância para isso. Mas quando tocaram o seu nome, foi impossível não parar o que estava fazendo no momento, apenas para ouvir o que diziam.

⸺ Ele gosta de homens, é uma pena isso ⸺ disse de maneira decepcionada ⸺ Espero que Deus tenha piedade dele.

⸺ Piedade? ⸺ Riu em um volume alto, reconheceu ser um tom de ironia. ⸺ Pessoas assim não merecem o perdão de Deus, muito pelo contrário...

⸺ Ele será castigado, quando descobrirem estar se envolvendo com alguém. Eles virão e será castigado.

Foi impossível não se sentir desconfortável com aqueles comentários, se perguntava o que tinha feito de errado para aquelas pessoas, ninguém ali sabia de sua vida e era no mínimo, muito desconfortável ouvir boatos daquele jeito.

Não, Sunghoon não tinha vergonha de quem era. Apenas não conseguia aceitar muito bem, estava em seu processo. Esse que era tão lendo, ainda sentia dúvidas sobre o que sentia e a ideia da decepção, fazia questão de se fazer presente em sua mente tão frágil.

Era fraco, sabia disso. Conseguia dar conta de algumas coisas aqui e ali mas era fraco. Não tinha muita ideia de como se defender quando era preciso ou de se impor em algo que fosse preciso, era fraco.

⸺ Vocês deveriam aprender a cuidar de suas vidas e deixar as dos outros em paz! ⸺ Jisung interrompeu a fofoca dos outros alunos, que o olharam indignados mas finalmente, se calando.

⸺ Obrigado... ⸺ Agradeceu.

⸺ Não ligue para essas pessoas, elas não tem o direito de julgar ninguém, afinal estão aqui por isso.

O moreno assentiu em confirmação, antes de reparar no curativo feito na mão do mais velho.

⸺ Onde se machucou?

Jisung o encarou, percebendo que ele estava encarando sua mão enfaixada.

⸺ Não foi nada, bati em algumas pessoas.

Arregalou os olhos.

⸺ O que aconteceu?

⸺ Estavam mexendo com alguém que gosto, e eu prometi que o protegeria.

⸺ Deveria tomar cuidado, e se alguém visse?

⸺ Relaxa, ninguém nos viu.

Pensou em perguntar quem era o motivo principal daquela briga, mas deixou essa dúvida para mais tarde, finalmente se permitindo voltar a prestar atenção na aula. Infelizmente, tinha perdido boa parte da explicação. E mais uma vez, não demorou muito para se sentir incomodado com as vozes atrás de si, que voltaram a falar.

⸺ Eu ouvi falar que ele estava andando com Heeseung.

⸺ Talvez ele seja mais uma das presas dele, uma pena... Todo ano é uma diferente. ⸺ E essa foi a última coisa que disseram, antes do sinal soar em seus ouvidos.

Sunghoon agradeceu por aquilo. O que eles quiseram dizer com "Presa"? Não tinham absolutamente nada e nem faziam ideia de como souberam sobre daquilo.

Por fim, decidiu esquecer e deixar essa assunto de lado. Ao menos, por enquanto.

To be continued...


O próximo deu até um calor aqui.

𝐅𝐀𝐋𝐋𝐈𝐍𝐆 𝐃𝐎𝐖𝐍 | heehoonWhere stories live. Discover now