Captulo 46

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—– Tudo bem, eles já foram embora.

Senti uma mão repousar no meu cabelo enquanto eu me espremia em um um canto sentindo um misto de sentimentos, e por um instante eu me senti segura, era um toque familiar, era uma voz familiar.

Quando levantei os olhos, me surpreendi ao ver que eu não estava errada.

Era ele.

—– Peter? —  Suspirei quase sem voz,  tentando esconder minha semi nudez aparente e ao mesmo tempo tremendo de frio.

—– Ana? — Ele falou confuso e surpreso ao mesmo tempo.

Ele jogou a barra de ferro que usou para ameaçar os bandidos no chão, em seguida tirou o casaco e jogou por cima de mim, cobrindo-me.

—– Pronto, isso vai ajudar a espantar o frio por enquanto  — Ele assegurou com uma voz suave e um sorriso doce acalentando o meu coração agitado, ignorando o fato de eu estar na rua naquela hora, e seminua.


—– Nossa que coincidência te encontrar, e infelizmente nessa situação tão terrível, eu sinto muito  —  Ele disse ofegante, enquanto me acompanhou rapidamente até o carro com receio de que aqueles homens pudessem voltar.


Não consegui falar mais nada, eu estava em estado de choque, paralisada. Minhas pernas estavam bambas e doloridas, e eu mal conseguia ficar em pé.

Então, vendo o meu estado, ele me pegou no colo e me carregou às pressas até onde havia estacionado o carro.

Ele apertou o meu cinto de segurança, depois deu a volta do outro lado do carro e entrou, saindo assim daquela rua escura e perigosa.

O frio passou, assim como o medo. Eu estava longe do perigo e apesar das memórias horríveis continuarem na minha cabeça, eu me  sentia segura ao lado do Peter, e mesmo não conhecendo ele muito bem, eu sabia que ele jamais faria algo do tipo comigo, porque ele era bom, de fato se não fosse ele ali, eu nem sei o teria sido de mim.

—– Onde está morando? —  Ele perguntou, mas com olhos na direção.

—– Na minha casa, mas...

Fiquei com receio de contar para ele o que havia acontecido, na verdade eu tinha vergonha. Afinal eu derrubei minha mãe no chão por causa de uma chave.

Sem contar o peso que sinto na consciência por ter o deixado.

Ele foi tão legal comigo, e a minha forma de agradecimento foi simplesmente fugir. Então decidi permanecer calada.

—– Ana, tudo bem, pode confiar em mim — Ele disse notando a minha aflição, olhei para suas mãos e notei que elas estavam entrelaçadas com as minhas.

E as lágrimas logo vieram aos meus olhos.

Ele só pode ser um anjo perdido na terra, não é possível alguém ser tão generoso, mesmo eu tendo sido tão ingrata.

—– Eu... briguei com a minha mãe...

Desviei o olhar, aflita, e senti uma profunda angústia ao me lembrar da imagem da minha mãe caída no chão, me olhando como se eu fosse uma dissimulada, com medo de mim.

—– Eu estraguei tudo, eu sempre estrago — Olhei para ele com olhos cheios de lágrimas — Tudo isso que aconteceu foi culpa minha, eu não deveria ter entrado naquele beco...

—– Shh! não diga isso, você não tem culpa de nada tá, aqueles caras que são uns covardes...

—–Eu sei mas...

—– Sem mas, Ana, a gente conversa sobre isso depois, agora eu vou te levar pra casa e cuidar desses machucados, não é bom que sua mãe te veja assim, e nem saiba do que aconteceu por enquanto.


Balancei a cabeça concordando, completamente abalada.

...

Esse episódio terrível foi a gota d'água pra mim, eu me recuso viver assim, dessa vez é pra valer, eu estava prestes a passar pela pior experiência que um ser humano poderia passar na vida, e tudo isso por causa desse maldito vício, chega, eu não quero mais viver assim, eu preciso parar de me auto destruir e começar a buscar recursos para melhorar de vida, mudar antes que seja tarde demais.

Estou cansada de machucar as pessoas que eu amo.

Às vezes é preciso levar uma dura da vida pra cair na real.

Peter, comovido com o meu estado, parou o carro e  me abraçou forte afim de me consolar, mas eu estava muito apavorada e em pânico, com a cabeça a mil por hora, com as imagens daquela cena chocante da qual presenciei.

Sentindo um misto de raiva e nojo se revirar em meu ser, uma sensação que não desejo nem pro meu pior inimigo.

Só conseguia chorar e tremer, eu realmente nunca imaginei que passaria por algo assim, eu nunca estive tão longe de mim, e tão perto da morte.

Perdi totalmente o controle da minha vida, como se eu estivesse sentada em uma cadeira assistindo ela passar.

É muito boa a sensação que o vício te causa, ele te embriaga de uma forma, que você fica anestesiada de suas emoções, esquece das dores por um momento e da frustração de ser quem é, de fazer o que faz, porque você não sente nada além de prazer e até um estranho controle sobre tudo, mas o pior disso e que isso acontece, enquanto minuciosamente ele vai destruindo quem você já foi um dia, quem você será no futuro, ele te mantém em um estado de euforia por um tempo, enquanto o seu tempo na realidade está se esgotando, você vai perdendo a sanidade aos poucos, e quando se dá conta, você se tornou o vício, você deixa de viver para só existir.


Então foi nesse surto de consciência, que eu abri os olhos, respirei fundo e olhei no fundo dos olhos verdes de Peter que estavam marejados e ressentidos, e disse com toda certeza:

—– Eu preciso de ajuda, da sua ajuda.

Ele assentiu emocionado quase que rindo de alegria, em seguida me puxou para um abraço reconfortante.

DesilusãoWhere stories live. Discover now