Capítulo 48

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Um ano depois...

Faz um ano que não sei mais o que é beber, meses que não sinto mais o desespero para sentir o líquido amargo do prazer instantâneo escorrer pelos meus lábios, causando a doce sensação de controle e de bem estar, uma ilusão que só era válida na minha cabeça.

No começo foi um pouco difícil, já que eu costumava beber sempre para fugir dos meus problemas emocionais, por isso encará-los de frente e sóbria era extremamente desconfortante.

Precisei ser submetida a um tratamento mais severo, que consistia em ficar internada seis meses em uma clínica de reabilitação, supervisionada por psicólogos e psiquiatras.

Ou seja, eu estava mentalmente vulnerável, e só parar de beber não era o suficiente.

Mas com muito esforço e força de vontade eu consegui me livrar definitivamente do vício, e não tem mais nenhuma gota de álcool no meu sangue.

Eu sei que muitos não acreditam que a mudança por meio de tratamento é possível, mas acontece que para essa mudança de fato acontecer, você precisa acreditar e se permitir, aceitando tudo que você será submetido.

E somente assim você verá resultado.

E hoje completamente curada, eu me sinto muito feliz, não há palavras que descrevam o tamanho da felicidade que eu sinto em meu coração. O alívio de não ter mais que sofrer, encontrei meios saudáveis que me ajudam a lidar melhor com a dor.

Quando eu me olho no espelho, vejo outra pessoa, completamente restaurada, mais bonita, confiante, não há mais hematomas pelo meu corpo e nem na minha alma, estou livre de qualquer ressentimento ou mágoa.

Nunca pensei que esse dia chegaria, eu não tinha nenhuma perspectiva de futuro e sinceramente eu me vi no hospital entre a vida e a morte, lutando contra as doenças que o consumo de álcool causou em meu corpo, eu me via refém desse vício pra sempre, mas tudo muda quando você reconhece que precisa de ajuda, e o mais importante, quando você aceita essa ajuda.

Afinal não dá pra ajudar quem não quer ser ajudado.

.......

Minha mãe fez um jantar para comemorar essa conquista, e também convidou o Peter, sim, o Peter, e eu ficaria feliz em dizer que estamos namorando, mas não estamos, até porque ele ao contrário de mim ainda está lutando para se amar e deixar de se sentir culpado o tempo todo.

Algumas pessoas levam mais tempo que outras.

Mas querendo ou não, ele faz parte dessa mudança também, nada disso seria possível sem a ajuda dele.

Então deixá-lo de fora dessa conquista pareceu injustiça.


Como eu havia dito, a gente se reencontrou durante o tratamento, e todo esse tempo, ele se mostrou uma ser pessoa incrível, paciente, ele viu o meu pior lado e mesmo assim não desistiu de mim, muito pelo contrário, ele insistiu bastante, foram dias e mais dias de negação, dos quais eu recusava a me tratar, esquecer o passado, mas ele esteve comigo até o fim, acalmou as minhas dores e lutou comigo essa batalha de intoxicação, de derrubar barreiras, de me aceitar, e por fim, de me perdoar e perdoar os outros.

E apesar dele não estar pronto, confesso que estou começando sentir por ele algo mais do que admiração, mas ainda é cedo pra dizer que é amor.

Eu nunca pensei que voltaria a sentir isso por alguém de novo, o amor era um sentimento muito distante pra mim, assim como confiar, mas Peter me fez acreditar que sim, que é possível.

Nem todo mundo vai partir o seu coração, as vezes as pessoas só precisam de um voto de confiança e de uma oportunidade, é bom sentir outra vez a felicidade transbordar dentro de mim, e não tem sensação melhor que essa, ter controle e saber pra qual direção ir.

Qual caminho seguir.

Sem mais insegurança, medo ou rancor, me sinto livre.

Recuperei a minha auto estima, meu cabelo se encheu de brilho e está cumprido como antes, minha pele está perfeita e até ganhei alguns quilinhos a mais.

Enfim, até o sol está brilhando do meu lado hoje.

Por que quando você está bem consigo mesma, tudo parece contribuir ao seu favor.

Depois de me despedi oficialmente do meu pai, ele nunca mais apareceu pra mim, sinto que fechei esse ciclo doloroso na minha vida, sinto que ele está em paz comigo, e espero que ele possa enfim descansar, eu nunca vou conseguir explicar o quão surreal foi conversar com ele, sentir sua presença fúnebre, nem sei se isso de fato aconteceu ou foi apenas fruto da minha imaginação.

Mas posso adiantar que foi uma experiência maravilhosa, que eu nunca vou esquecer. Ele sempre vai está no meu coração, eternizado na minha memória, eu nunca vou me esquecer do quanto ele foi especial nesse meu processo.

As coisas melhoraram bastante, eu entrei pra faculdade, arrumei um emprego como garçonete para poder arcar com os gastos, e o Peter até se ofereceu pra ajudar, mas eu recusei, eu quero agora andar com os meus próprios passos, pois agora sinto que agora posso fazer qualquer coisa.

Me sinto corajosa.

Mas foi em uma dessas manhãs ensolaradas quando eu me preparava feliz, para sair com Peter para um piquenique que íamos fazer ao ar livre, que eu abri a porta, e o sorriso simplesmente sumiu do meu rosto.

-- E aí, Kate.

DesilusãoWhere stories live. Discover now